em Evangelho do dia

Agosto de 2014

 

01.08.14 – Mt 13,54-58

54E foi para a sua terra. Ali ensinava na sinagoga, de modo que eles, admirados, diziam: Donde a Este tal sabedoria e tais milagres? – 55Não é Ele o filho do carpinteiro? Não se chama Sua Mãe Maria, e Seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas? 56E as Suas irmãs não vivem todas entre nós? Donde Lhe vieram, pois, todas estas coisas?

57E escandalizavam-se d’Ele. Jesus, porém, disse-lhes: O profeta não é desconsiderado senão na sua terra e entre os seus. 58E não fez ali muitos milagres, por causa da sua incre­dulidade.

Comentário

53-58. A estranheza das gentes de Nazaré em parte talvez se explique pela dificuldade que o homem experimenta em reconhecer o extraordinário e o sobrenatural naqueles com quem conviveu familiarmente. Daí o provérbio «ninguém é profeta na sua terra». À estranheza juntava-se, nos vizinhos de Nazaré, a inveja: Donde lhe vem esta sabedoria? Quem é este mais que nós? Eles não conheciam o mistério da conceição sobrenatural de Jesus. A estranheza e a inveja levam-nos a escandalizar-se, a desprezá-Lo e a não crer n’Ele: « veio para o que era Seu, e os Seus não O acolheram» (Ioh 1,11).

«Filho do carpinteiro»: É o único lugar do Evangelho onde aparece a profissão de São José — em Mc 6,3, carpinteiro é aplicado ao próprio Jesus —. Provavelmente era o carpin­teiro que na aldeia de Nazaré realizava muito diversos tipos de ofícios manuais: tanto forjava ferro como construía móveis ou alfaias agrícolas.

Sobre a explicação de «irmãos de Jesus» veja-se a nota a Mt 12,46-47.

 

02.08.14 – Mt 14,1-12

Naquele tempo, o tetrarca Herodes ouviu falar de Jesus 2e disse para os seus cortesãos: É João Baptista. É Ele que ressuscitou dos mortos, e é por isso que as forças milagrosas operam n’Ele. 3De facto, Herodes prendera a João, pusera-o a ferros e lançara-o numa prisão, por causa de Hero­díade, mulher de Filipe, seu irmão. 4Porque João lhe dizia: « Não te é lícito tê-la». 5Quisera matá-lo, mas temia o povo, que o tinha por profeta.

6Veio, entretanto, o aniversário de Herodes, e a filha de Herodíade dançou em público e agradou a Herodes 7tanto que lhe prometeu, com juramento, dar-lhe o que pedisse. 8Ela, instigada pela mãe: Dá-me, disse, aqui, num prato, a cabeça de João Baptista. 9Entris­teceu-se o rei; porém, por causa do jura­mento e dos convivas, deu ordem para que lhe fosse entregue 10e mandou decapitar João no cárcere. 11A sua cabeça foi trazida num prato e dada à jovem que a levou à mãe. 12Os discípulos foram buscar o corpo e sepul­taram-no. Depois vieram dar a notícia a Jesus.

 

Comentário

1. Herodes o tetrarca, denominado «Antipas» (vid. a nota a Mt 2, 1) é o mesmo que mais tarde aparece na Paixão (cfr Lc 23, 7ss.). Era filho de Herodes o Grande. Antipas governava a região da Galileia e Pereia em nome do imperador romano; estava casado, segundo atesta o historiador Flávio Josefo (Antiquitates iud., XVIII, 5,4), com uma filha de um rei da Arábia. Apesar deste matrimônio, convivia em concubinato com Herodíade, mulher de seu irmão. São João Baptista e o próprio Jesus Cristo repreenderam muitas vezes os costumes imorais do tetrarca, cujas relações ilícitas estavam expressamente proibidas na Lei (Lev 18,16; 20,21 )e eram escândalo notório para o povo.

3-12. Em fins do século I Flávio Josefo dá também testemunho destes acontecimentos. Por ele sabemos outros pormenores mais, como o lugar — a fortaleza de Maqueronte — em que esteve encarcerado o Baptista, fortaleza que domina a ribeira oriental do Mar Morto e onde foi o banquete; e o nome, Salomé, da filha de Herodíade.

9. Importantes códices gregos e latinos trazem: «Entris­teceu-se o rei; mas pelo juramento e pelos comensais ordenou que lhe fosse dada ». Santo Agostinho comenta assim: « No meio dos excessos e da sensualidade dos convidados, fazem-se temerariamente juramentos, que depois se cumprem de forma ímpia» (Sermo 10). Com efeito, é pecado contra o segundo Mandamento da Lei de Deus fazer um juramento faltando à justiça, como neste caso; tal juramento não obriga. Mais ainda, se se cumpre, como fez Herodes, comete-se um novo pecado. Também nos ensina o Catecismo que se peca contra este preceito se o juramento se faz contra a verdade, ou sem necessidade (cfr Catecismo Romano, III, 3, 24). Cfr a nota a Mt 5, 33-37.

 

03.08.14 – Mt 14,13-21

13Jesus, ao ouvir isto, retirou-Se dali numa Multiplicação barca, a sós, para um lugar deserto. O povo, porem, soube-o e das cidades foi, por terra, em Seu seguimento. 14Ao desembarcar, viu uma grande multidão: condoeu-Se dela e curou-lhe os enfermos. 15Sobre a tarde, vieram ter com Ele os discípulos e disseram-Lhe: Este lugar é deserto, e a hora já passou. Despede, pois, as turbas para que vão às aldeias comprar comestíveis. 16Mas Jesus disse-lhes: Não precisam de ir, dai-lhes vós mesmos de comer. 17Tornaram-Lhe eles: Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes. 18Disse Ele: Trazei-Mos cá. 19E deu ordem para que a multidão se sentasse sobre a relva. Depois tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao céu e pronunciou a fórmula da bênção, partiu os pães e deu-os aos discípulos, e os discípulos às turbas. 20Comeram todos, até se saciarem; e dos pedaços que sobejaram, levantaram doze cestos cheios. 2lOra, os que comeram eram uns cinco mil homens, afora mulheres e crianças.

Comentário

14-21. Devia ser em plena Primavera porque a erva estava verde (Mc 6,40; Ioh 6,10). Os pães no próximo Oriente costumam ter a forma de tortas delgadas, que se partem facilmente com as mãos e se distribuem aos comensais. Uma e outra coisa costumava fazê-las o pai de família ou o que presidia à mesa. O Senhor segue aqui este mesmo costume. O milagre deste relato consiste em que os pedaços de pão se multiplicam nas mãos de Jesus. Logo, os discípulos distribuiam-nos à multidão.

Outra vez mais sobressai a maneira de actuar do Senhor: busca a livre cooperação do homem; no momento de fazer o milagre quer que os discípulos levem os pães e os peixes, e ofereçam a sua própria actividade.

04.08.14 – Mt 14,13-21

13Jesus, ao ouvir isto, retirou-Se dali numa Multiplicação barca, a sós, para um lugar deserto. O povo, porem, soube-o e das cidades foi, por terra, em Seu seguimento. 14Ao desembarcar, viu uma grande multidão: condoeu-Se dela e curou-lhe os enfermos. 15Sobre a tarde, vieram ter com Ele os discípulos e disseram-Lhe: Este lugar é deserto, e a hora já passou. Despede, pois, as turbas para que vão às aldeias comprar comestíveis. 16Mas Jesus disse-lhes: Não precisam de ir, dai-lhes vós mesmos de comer. 17Tornaram-Lhe eles: Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes. 18Disse Ele: Trazei-Mos cá. 19E deu ordem para que a multidão se sentasse sobre a relva. Depois tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao céu e pronunciou a fórmula da bênção, partiu os pães e deu-os aos discípulos, e os discípulos às turbas. 20Comeram todos, até se saciarem; e dos pedaços que sobejaram, levantaram doze cestos cheios. 2lOra, os que comeram eram uns cinco mil homens, afora mulheres e crianças.

Comentário

14-21. Devia ser em plena Primavera porque a erva estava verde (Mc 6,40; Ioh 6,10). Os pães no próximo Oriente costumam ter a forma de tortas delgadas, que se partem facilmente com as mãos e se distribuem aos comensais. Uma e outra coisa costumava fazê-las o pai de família ou o que presidia à mesa. O Senhor segue aqui este mesmo costume. O milagre deste relato consiste em que os pedaços de pão se multiplicam nas mãos de Jesus. Logo, os discípulos distribuiam-nos à multidão.

Outra vez mais sobressai a maneira de actuar do Senhor: busca a livre cooperação do homem; no momento de fazer o milagre quer que os discípulos levem os pães e os peixes, e ofereçam a sua própria actividade.

05.08.14 – Mt 14,22-36

22E Ele obrigou logo os discípulos a embarcar e a ir adiante para a outra margem, enquanto despedia as turbas. 23Despedidas as turbas, subiu sozinho ao monte, a orar. Ao cair da noite, estava ali sozinho. 24Entretanto, á barca afastara-se já muitos estádios da terra, açoitada pelas ondas, porque o vento era contrário. 25Na quarta vigília da noite, veio Jesus ter com eles, caminhando sobre o mar. 26Os discípulos, vendo-O a caminhar sobre o mar, assustaram-se e dis­seram: É um fantasma! E gritaram de terror. 27Mas logo Jesus lhes falou, dizendo: Tende confiança! Sou Eu, não temais. 28Tornou-Lhe Pedro: Senhor, se és Tu, manda-me ir ter contigo, por cima das águas. 29Vem! disse Ele. Saltou Pedro da barca e começou a andar por cima das águas, dirigindo-se para Jesus. 30Vendo, porém, um vento forte, ame­drontou-se; e, começando a afundar-se, gritou: Senhor, acode-me! 31E Jesus, imediatamente, estendendo-lhe a mão, segurou-o e disse-lhe: Homem de pouca fé, porque duvidaste? 32Apenas subiram para a barca, cessou o vento. 33E os que estavam na barca adora­ram-No, exclamando: És verdadeiramente o Filho de Deus.

Comentário

22-23. O dia tinha sido intenso, como outros tantos de Jesus. Depois de ter leito muitas curas (14, 14), tem lugar u impressionante milagre da multiplicação dos pães e dos peixes, que é figura antecipada da Santíssima Eucaristia. Aquela multidão que O tinha seguido encontrava-se faminta de pão, de palavra e de consolação. Jesus «condoeu-Se dela» (14,14), curou os seus doentes e reconfortou a todos com a Sua palavra e com o pão. Isto não era senão uma antecipação da contínua acção amorosa de Jesus, ao longo dos séculos, com todos nós, necessitados e reconfortados com a Sua palavra e o alimento do Seu próprio Corpo. Tinham sido, pois, muitas as coisas daquele dia e muito intensa a emoção da alma de Jesus, que conhecia a acção vivificante que tinha de exercer o Santíssimo Sacramento na vida dos cristãos: Sacramento que é um mistério de vida, de fé e de amor. Por tudo isso podemos razoavelmente pensar que Jesus sentia necessidade de ter umas horas de recolhimento íntimo para talar com o Pai. A oração a sós de Jesus, entre a actividade de um trabalho e outro, ensina-nos a necessidade deste recolhimento da alma cristã, que acorre a falar com seu Pai Deus, entre os afazeres quotidianos da vida. Sobre a freqüente oração pessoal de Jesus, vejam-se, entre outros: Mc 1,35;6,47; Lc 5,16; 6,12.Cfr notas a Mt 6, 5-6 e Mt 7, 7-11.

24-33. O impressionante episódio de Jesus a caminhar sobre as águas deve ter feito pensar muito os Apóstolos, e ter ficado gravado vivissimamente entre as suas recordações da vida com o Mestre. Não só São Mateus, mas também São Marcos (6, 45-52), que o deve ter ouvido de São Pedro, e São João (6, 14-21) incluem-no nos seus respectivos Evangelhos.

As tempestades no lago de Genesaré são frequentes e redemoinham as águas, constituindo um grave perigo para as embarcações pesqueiras. Desde o alto do monte, Jesus em oração não esquece os Seus discípulos. Vê-os a esforçar-se na luta com o vento que lhes era contrário e com as ondas. E terminada a oração aproxima-Se deles para os ajudar.

O episódio ilumina a vida cristã. Também a Igreja, como a barca dos Apóstolos, se vê combatida. Jesus, que vela por ela, açode a salvá-la, não sem antes tê-la deixado lutar para fortalecer a tempera dos seus filhos. E anima-os: «Tende con­fiança! Sou Eu, não temais» (14,27). E vêm as provas de fé e de fidelidade: a luta do cristão por manter-se firme, e o grito de súplica do que vê que as suas próprias forças fraquejam: «Senhor, salva-me!» (14, 30); palavras de Pedro que volta a repetir toda a alma que acorre a Jesus como ao seu verdadeiro Salvador. Depois, o Senhor salva-nos. E, no fim, brota a confissão da fé, que então como agora deve proclamar: «És verdadeiramente o Filho de Deus» (14,33).

29-31. São João Crisóstomo (Hom. sobre S. Mateus, 50) comenta que neste episódio Jesus ensinou a Pedro a conhecer, por experiência própria, que toda a sua fortaleza lhe vinha do Senhor, enquanto de si mesmo só podia esperar fraqueza e miséria. Por outro lado, o Crisóstomo chega a dizer que «quando falta a nossa cooperação cessa também a ajuda de Deus». Daí a repreensão «homem de pouca fé» (14,31). Por isso quando Pedro começou a temer e a duvidar, começou também a afundar-se até que, de novo, cheio de fé, gritou: «Senhor, salva-me!».

Se como Pedro fraquejamos nalgum momento, esforcemo-nos também como ele na nossa fé e gritemos a Jesus para que venha salvar-nos.

34-36. Com a fé com que aqueles homens da ribeira do lago de Genesaré se aproximavam de Jesus, deve aproximar-se todo o cristão da Humanidade adorável do Salvador. Cristo, Deus e Homem, é acessível para nós no Sacramento da Eucaristia.

«Quando te aproximes do Sacrário, pensa que Ele… há vinte séculos que te espera» (Caminho, n.° 537).

 

06.08.14 – Mt 17,1-9

Seis dias depois, tomou Jesus a Pedro, a Tiago e a João, irmão deste, levou-os sós a um monte alto 2e transfigurou-Se diante deles. O Seu rosto brilhou como o Sol, e os vestidos tornaram-se brancos como a luz. 3Senão quando, apareceram-lhes Moisés e Elias a conversar com Ele. 4E Pedro, tomando a palavra, disse a Jesus: Senhor, é bom estarmos nós aqui. Se queres, faço aqui três tendas: uma para Ti, outra para Moisés e outra para Elias. 5Falava ainda, quando uma nuvem luminosa os envolveu, e uma voz, saída da nuvem, disse: Este é o Meu Filho amado, no qual pus as Minhas complacências. Ouvi-O!

6Os discípulos, ao ouvirem a voz, caíram de rosto por terra e ficaram transidos de medo. 7Mas Jesus aproximou-Se e, tocando-os, disse: Erguei-vos e não temais. 8E eles, levantando os olhos, não viram ninguém, senão a Jesus só. 9Ao descerem do monte, ordenou-lhes Jesus: Não conteis a ninguém esta visão, até que o Filho do homem ressus­cite dos mortos.

Comentário

1-13. Sabendo o escândalo que a Sua morte havia de produzir nos Seus discípulos, Jesus previne-os e con­forta-os na sua fé. Não se contentou com anunciar-lhes que havia de morrer e ressuscitar ao terceiro dia, mas quis que dois dos três que seriam colunas da Igreja (cfr Gal 2,9) vissem no acontecimento da Sua Transfiguração um fulgor da glória e da majestade que no Céu tem a Sua Humanidade santíssima. O testemunho do Pai (v. 5), expressado com as mesmas palavras que no dia do Baptismo (cfr Mt 3,17), revela aos três Apóstolos que Jesus Cristo é o Filho de Deus, o Filho muito amado, o próprio Deus. Às palavras já ditas no Baptismo, acrescenta: «Ouvi-O», como para indicar que Jesus é também o profeta supremo anunciado por Moisés (cfr Dt 18,15-18).

3. Moisés e Elias são os dois representantes máximos do Antigo Testamento: da Lei e dos Profetas. A posição central de Cristo indica a sua preeminência sobre eles e a do Novo Testamento sobre o Antigo.

Esta cintilação fulgurante da glória divina bastou para transportar os Apóstolos a uma imensa felicidade, que em Pedro produz um desejo irreprimível de alongar aquela situação.

5. Em Cristo Deus fala a todos os homens; a Sua voz ressoa através dos tempos por meio da Igreja: «A Igreja não cessa de ouvir as Suas palavras, volta a lê-las continuamente, reconstrói com a máxima devoção todo o pormenor particular da Sua vida. Estas palavras são ouvidas também pelos não cristãos. A vida de Cristo fala ao mesmo tempo a tantos homens que não estão ainda em condições de repetir com Pedro: ‘Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo’ (Mt 16,16). Ele, Filho de Deus vivo, fala aos homens também como homem: é a Sua própria vida a que fala, a Sua humanidade, a sua fidelidade à verdade, o Seu amor que abarca a todos. Fala, além disso, a Sua morte na cruz, isto é, a insondável profundidade do Seu sofrimento e do Seu abandono. A Igreja não cessa jamais de reviver a Sua morte na cruz e a Sua Ressurreição, que constituem o conteúdo da vida quotidiana da Igreja (..). A Igreja vive o Seu mistério, alcança-o sem nunca se cansar e busca continuamente os caminhos para aproximar este mistério do Seu Mestre e Senhor do gênero humano: dos povos, das nações, das gerações que se vão sucedendo, de todo o homem em particular» (Redemptor hóminis, n. 7).

07.08.14 – Mt 16,13-23

13Em seguida, foi Jesus para os lados de Cesareia de Filipe e perguntou aos discípulos: Quem dizem os homens que é o Filho do homem? 14Responderam-Lhe: Uns, João Baptista: outros, Elias; outros, Jeremias ou algum dos profetas. 15Disse-lhes Jesus: E quem dizeis vós que Eu sou? 16Respondeu Simão Pedro, dizendo: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo. 17E Jesus, respondendo-lhe, disse: Bem-aventurado és tu, Simão, Barjona, porque não foi a carne e o sangue que to revelaram, mas Meu Pai que,está nos Céus. 18E Eu digo-te a ti que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a Minha Igreja, e as portas do Inferno não prevalecerão contra ela. 19Dar-te-ei as chaves do Reino dos Céus, e tudo o que ligares na terra, será ligado nos Céus; e tudo o que desligares na terra, será desligado nos Céus. 20Então intimou aos discípulos que não dissessem a ninguém que Ele era o Cristo.

21Desde então começou Jesus a declarar aos discípulos que tinha de ir a Jerusalém e padecer muito da parte dos Anciãos, dos Príncipes dos sacerdotes e dos Escribas, e ser morto e, ao terceiro dia, ressuscitar. 22Pelo que Pedro, chamando-O à parte, come­çou a estranhar-Lho, dizendo: Deus Te livre de tal, Senhor! Isso não Te acontecerá! 23Voltou-Se Ele e disse a Pedro: Tira-te da minha frente, satanás, tu és para Mim um escândalo, pois não aprecias as coisas de Deus, mas somente as dos homens.

Comentário

13-20. Neste passo promete-se a São Pedro o Primado sobre toda a Igreja. Primado que Jesus lhe conferirá, depois da Sua Ressurreição, segundo nos relata o Evangelho de São João (cfr Ioh 21, 15-18). Os poderes supremos são dados a Pedro para bem da Igreja. Como esta há-de durar até ao fim dos tempos, esses poderes transmitir-se-ão àqueles que sucedam a Pedro ao longo da história. O Romano Pontífice é em concreto o sucessor de São Pedro.

A doutrina sobre o Primado de Pedro e dos seus sucessores foi definida como dogma de fé pelo Magistério solene da Igreja no Concilio Vaticano I, nos seguintes termos: «Ensinamos, pois, e declaramos que, segundo os testemunhos do Evangelho, o primado de jurisdição sobre a Igreja universal de Deus foi prometido e conferido, imediata e directamente, ao bem-aventurado Pedro por Cristo Nosso Senhor. Porque só a Simão — a quem já antes tinha dito: ‘Tu chamar-te-ás Cefas’ (Ioh l, 42) —, depois de pronunciar a sua confissão: ‘Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo’, se dirigiu o Senhor com estas solenes palavras: ‘Bem-aventurado és, Simão filho de João, porque não foi a carne nem o sangue que te revelaram isso, mas Meu Pai que está nos Céus. E Eu digo-te, que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a Minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Dar-te-ei as chaves do Reino dos Céus; e tudo o que ligares na terra ficará ligado nos Céus, e tudo o que desligares na terra, ficará desligado nos Céus’ (Mt 16, 16 ss.). E só a Simão Pedro conferiu Jesus, depois da Sua Ressurreição, a jurisdição de pastor e chefe supremo de todo o Seu rebanho, dizendo: ‘Apascenta os Meus cordeiros. Apascenta as Minhas ovelhas’ (Ioh 21, 15 ss.)… (Canon). Se alguém disser que o bem-aventurado Pedro Apóstolo não foi constituído por Cristo Senhor príncipe de todos os Apóstolos e cabeça visível de toda a Igreja militante, ou que recebeu directa e imediatamente do próprio Jesus Cristo Senhor Nosso somente o primado de honra, mas não de verdadeira e própria jurisdição, seja anátema».

Ora bem, «o que Cristo Senhor, príncipe dos pastores e grão pastor das ovelhas, instituiu no bem-aventurado Após­tolo Pedro para perpétua salvação e bem perene da Igreja, é mister que dure perpetuamente por obra do mesmo Senhor na Igreja que, fundada sobre a pedra, tem de permanecer firme até à consumação dos séculos. ‘Para ninguém, na verdade, é duvidoso, antes, pára todos os séculos é notório, que o santo e beatíssimo Pedro, príncipe e cabeça dos Apóstolos, coluna da fé e fundamento da Igreja Católica, recebeu as chaves do Reino das mãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, Salvador e Redentor do gênero humano; e até ao tempo presente e sempre continua a viver, preside e exerce o juízo nos seus sucessores’ (cfr Concilio de Efeso), os bispos da santa Sé Romana, por ele fundada e pelo seu sangue consa­grada. Donde se segue que seja quem for o que sucede a Pedro nesta cátedra, esse, segundo a instituição do próprio Cristo, obtém o Primado de Pedro sobre a Igreja universal…

«Por esta causa, foi sempre necessário que a esta Igreja Romana, ‘pela sua mais poderosa principalidade, se unisse toda a Igreja, isto é, quantos fiéis há, de onde quer que sejam’…

«(Canon.) Se alguém disser que não é de instituição do próprio Cristo, isto é, de direito divino, que o bem-aven­turado Pedro tenha perpétuos sucessores no primado sobre a Igreja universal; ou que o Romano Pontífice não é sucessor do bem-aventurado Pedro no mesmo primado, seja anátema.

«… Julgamos que é absolutamente necessário afirmar solenemente a prerrogativa que o Unigênito Filho de Deus se dignou juntar com o supremo dever pastoral.

«Assim, pois, Nós, seguindo a tradição recolhida fielmente desde o princípio da fé cristã, para glória de Deus Salvador. Nosso, para exaltação da fé católica e salvação dos povos cristãos, com aprovação do sagrado concilio, ensinamos e definimos ser dogma divinamente revelado: Que o Romano Pontífice, quando fala ex cathedra — isto é, quando cumprindo o seu cargo de pastor e doutor de todos os cristãos, define pela sua suprema autoridade apostólica que uma doutrina sobre a fé e costumes deve ser definida pela Igreja universal —, pela assistência divina que lhe foi prometida na pessoa do bem-aventurado Pedro, goza daquela infalibilidade de que o Redentor divino quis que estivesse prevista a Sua Igreja na definição da doutrina sobre a fé e os costumes; e, por isso, que as definições do Romano Pontífice são irreformáveis por si mesmas e não pelo consentimento da Igreja.

«(Canon.) E se alguém tivesse a ousadia, o que Deus não permita, de contradizer essa definição nossa, seja anátema» (Pastor aeternus, caps l, 2 e 4).

23. Jesus opõe-Se com energia aos protestos bem intencio­nados de São Pedro. O Senhor dá-nos a entender assim a importância capital que tem para a salvação o aceitar a cruz (cfr lCor l, 23-25). Pouco antes (Mt 16, 17) Jesus tinha elogiado Pedro: «Bem-aventurado és Simão»; agora repreende-o: «Afasta-te de Mim, Satanás!»; ali tinha falado Pedro movido pelo Espírito Santo, aqui pelo seu próprio espírito de que não se tinha despojado totalmente.

08.08.14 – Mt 16,24-28

24Jesus disse então aos discípulos: Se alguém quer vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. 25Porque, quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por minha causa, encontrá-la-á. 26Pois, de que servirá ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua alma? Ou que dará o homem em resgate da sua alma? 27Porque o Filho do homem há-de vir na glória de Seu Pai, com os Seus Anjos, e então remunerará a cada um segundo as suas obras. 28Em verdade vos digo: há alguns aqui que não experimen­tarão a morte, antes de verem o Filho do homem no Seu Reino.

Comentário

24. «O amor de Deus que ‘foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado’ (Rom 5, 5), torna os leigos capazes de exprimir em verdade, na própria vida, o espírito das Bem-aventuranças. Seguindo a Cristo pobre, nem se deixam abater com a falta dos bens temporais nem se exaltam com a sua abundância; imitando a Cristo humilde, não são cobiçosos da glória vã (cfr Gal 5, 26), mas procuram mais agradar a Deus que aos homens, sempre dispostos a deixar tudo por Cristo (cfr Lc 14, 25) e a sofrer perseguição pela justiça (cfr t5,10), lembrados da palavra do Senhor: ‘se alguém quiser seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me’ (Mt 16, 24)» (Apostolicam actuositatem, n. 4).

25. O cristão não pode passar por alto estas palavras de Jesus Cristo. Deve arriscar-se, jogar a vida presente em troca de conseguir a eterna. « Que pouco é uma vida para oferecê-la a Deus!…» (Caminho, n.°420).

A exigência do Senhor inclui renunciar à própria vontade para a identificar com a de Deus, não aconteça que, como comenta São João da Cruz, tenhamos a sorte de muitos «que queriam que Deus quisesse o que eles querem, e entristecem-se de querer o que Deus quer, e têm repugnância em acomodar a sua vontade à de Deus. Disto vem que muitas vezes, no que não acham a sua vontade e gosto, pensam não ser da vontade de Deus e, pelo contrário, quando se satisfazem, crêem que Deus Se satisfaz, medindo também a Deus por si, e não a si mesmos por Deus» (Noite Escura, liv. I, cap. 7, n.° 3).

26-27. As palavras de Cristo são de uma clareza meridiana: situam cada homem, individualmente, diante do Juízo Final. A salvação tem, pois, um caracter radicalmente pessoal: «remunerará a cada um segundo as suas obras» (v. 27).

O fim do homem não é ganhar os bens temporais deste mundo, que são apenas meios ou instrumentos; o fim último do homem é o próprio Deus, que é possuído como antecipação aqui na terra pela graça, e plenamente e para sempre na Glória. Jesus indica qual é o caminho para conseguir esse fim: negar-se a si mesmo (isto é, tudo o que é comodidade, egoísmo, apego aos bens temporais) e levar a cruz. Porque nenhum bem terreno, que é caduco, é comparável à salvação eterna da alma. Como explica com precisão teológica São Tomás, «o menor bem da graça é superior a todo o bem do universo» (Suma Teológica, I-II, q.113, a. 9).

28. Ao dizer isto, Jesus não se refere à Sua última vinda de que fala no versículo anterior, mas está a referir-Se a outros factos que aconteceriam antes e que constituiriam um sinal da Sua glorificação depois da morte. Assim, a vinda de que fala aqui o Senhor pode referir-se em primeiro lugar à Sua Ressurreição e aparições. Também poderia estar rela­cionada com a Transfiguração, que mostra já a glória de Cristo. Finalmente, essa vinda de Cristo no Seu Reino poderia ver-se manifestada na destruição de Jerusalém, em que é significado o fim do antigo povo de Israel como realização do Reino de Deus e a sua substituição pela Igreja, novo Reino.

09.08.14 – Mt 17,14-20

14Ao chegarem junto do povo, acercou-se Cura d’Ele um homem, que, lançando-se de joelhos diante d’Ele, 15disse: Senhor, tem com­paixão de meu filho, que é lunático e está muito mal; pois muitas vezes se atira ao fogo e outras à água.16Apresentei-o aos Teus discí­pulos, e não puderam curá-lo. 17Respondeu-lhe Jesus: Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei convosco! Até quando vos hei-de suportar? Trazei-Mo cá. 18E Jesus imperou ao Demônio, que saiu dele; e, desde aquele momento, ficou o pequeno curado. 19Então chegaram-se os discípulos a Jesus, em particular, e disseram-Lhe: Porque é que nós não o pudemos expulsar? 20E Ele disse-lhes: Por causa da vossa pouca fé. Em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: «mu­da-te daqui para ali», e ele mudar-se-á e nada vos será impossível.

 

Comentário

14-21. No episódio da cura deste rapaz manifesta-se, por um lado, a omnipotência de Jesus Cristo, e, por outro, o poder da oração feita com fé. O cristão, em virtude da união profunda com Cristo, pela fé participa, de alguma maneira, da própria Omnipotência de Deus, até ao ponto de Jesus chegar a dizer noutra ocasião: «Quem acredita em Mim fará também as obras que Eu faço e fá-las-á maiores do que estas, porque Eu vou para o Pai» (Ioh14,12).

O Senhor diz aos Apóstolos que se tivessem fé realizariam prodígios, mudariam as montanhas do seu lugar. Ao falar de «mudar de lugar as montanhas» provavelmente empregava uma maneira de dizer já proverbial. Deus concederia sem dúvida ao crente mudar de lugar uma montanha se tal facto fosse necessário para a Sua glória e para a edificação do próximo; mas entretanto, a palavra de Cristo cumpre-se todos os dias num sentido muito superior. Alguns Padres da Igreja (São Jerônimo, Santo Agostinho) indicaram que se cumpre o facto de « mudar de lugar uma montanha », sempre que alguém por virtude divina chega onde as forças humanas não chegam. Tal sucede, de modo claro, na obra da nossa santificação pessoal, que o Paráclito vai realizando na alma quando somos dóceis e recebemos com espírito de fé e de amor a graça que nos é dada nos sacramentos: estes podem ser aproveitados em maior ou menor grau segundo as disposições com que são recebidos, isto é, na medida da nossa fé e do nosso amor. É um facto muito mais sublime que o de mudar de lugar montanhas e que se opera cada dia em tantas almas santas, ainda que passe inadvertido à maioria.

De facto, os Apóstolos e muitos santos ao longo dos séculos fizeram milagres admiráveis na ordem física; mas os milagres maiores e mais importantes foram, são e serão os das almas que, tendo estado sumidas na morte do pecado e da ignorância, renascem e crescem na nova vida dos filhos de Deus.

20. A força da comparação, aqui como na parábola de Mt 13, 31-32, estriba-se em que a semente de mostarda é um grãozinho sumamente pequeno e, não obstante, produz uma grande planta que chega a atingir mais de três metros de altura. Assim, o acto mais pequeno de fé verdadeira pode produzir efeitos surpreendentes.

 

10.08.14 – Mt 14,22-33

22E Ele obrigou logo os discípulos a embarcar e a ir adiante para a outra margem, enquanto despedia as turbas. 23Despedidas as turbas, subiu sozinho ao monte, a orar. Ao cair da noite, estava ali sozinho. 24Entretanto, á barca afastara-se já muitos estádios da terra, açoitada pelas ondas, porque o vento era contrário. 25Na quarta vigília da noite, veio Jesus ter com eles, caminhando sobre o mar. 26Os discípulos, vendo-O a caminhar sobre o mar, assustaram-se e dis­seram: É um fantasma! E gritaram de terror. 27Mas logo Jesus lhes falou, dizendo: Tende confiança! Sou Eu, não temais. 28Tornou-Lhe Pedro: Senhor, se és Tu, manda-me ir ter contigo, por cima das águas. 29Vem! disse Ele. Saltou Pedro da barca e começou a andar por cima das águas, dirigindo-se para Jesus. 30Vendo, porém, um vento forte, ame­drontou-se; e, começando a afundar-se, gritou: Senhor, acode-me! 31E Jesus, imediatamente, estendendo-lhe a mão, segurou-o e disse-lhe: Homem de pouca fé, porque duvidaste? 32Apenas subiram para a barca, cessou o vento. 33E os que estavam na barca adora­ram-No, exclamando: És verdadeiramente o Filho de Deus.

Comentário

22-23. O dia tinha sido intenso, como outros tantos de Jesus. Depois de ter leito muitas curas (14, 14), tem lugar u impressionante milagre da multiplicação dos pães e dos peixes, que é figura antecipada da Santíssima Eucaristia. Aquela multidão que O tinha seguido encontrava-se faminta de pão, de palavra e de consolação. Jesus «condoeu-Se dela» (14,14), curou os seus doentes e reconfortou a todos com a Sua palavra e com o pão. Isto não era senão uma antecipação da contínua acção amorosa de Jesus, ao longo dos séculos, com todos nós, necessitados e reconfortados com a Sua palavra e o alimento do Seu próprio Corpo. Tinham sido, pois, muitas as coisas daquele dia e muito intensa a emoção da alma de Jesus, que conhecia a acção vivificante que tinha de exercer o Santíssimo Sacramento na vida dos cristãos: Sacramento que é um mistério de vida, de fé e de amor. Por tudo isso podemos razoavelmente pensar que Jesus sentia necessidade de ter umas horas de recolhimento íntimo para talar com o Pai. A oração a sós de Jesus, entre a actividade de um trabalho e outro, ensina-nos a necessidade deste recolhimento da alma cristã, que acorre a falar com seu Pai Deus, entre os afazeres quotidianos da vida. Sobre a freqüente oração pessoal de Jesus, vejam-se, entre outros: Mc 1,35;6,47; Lc 5,16; 6,12.Cfr notas a Mt 6, 5-6 e Mt 7, 7-11.

24-33. O impressionante episódio de Jesus a caminhar sobre as águas deve ter feito pensar muito os Apóstolos, e ter ficado gravado vivissimamente entre as suas recordações da vida com o Mestre. Não só São Mateus, mas também São Marcos (6, 45-52), que o deve ter ouvido de São Pedro, e São João (6, 14-21) incluem-no nos seus respectivos Evangelhos.

As tempestades no lago de Genesaré são frequentes e redemoinham as águas, constituindo um grave perigo para as embarcações pesqueiras. Desde o alto do monte, Jesus em oração não esquece os Seus discípulos. Vê-os a esforçar-se na luta com o vento que lhes era contrário e com as ondas. E terminada a oração aproxima-Se deles para os ajudar.

O episódio ilumina a vida cristã. Também a Igreja, como a barca dos Apóstolos, se vê combatida. Jesus, que vela por ela, açode a salvá-la, não sem antes tê-la deixado lutar para fortalecer a tempera dos seus filhos. E anima-os: «Tende con­fiança! Sou Eu, não temais» (14,27). E vêm as provas de fé e de fidelidade: a luta do cristão por manter-se firme, e o grito de súplica do que vê que as suas próprias forças fraquejam: «Senhor, salva-me!» (14, 30); palavras de Pedro que volta a repetir toda a alma que acorre a Jesus como ao seu verdadeiro Salvador. Depois, o Senhor salva-nos. E, no fim, brota a confissão da fé, que então como agora deve proclamar: «És verdadeiramente o Filho de Deus» (14,33).

29-31. São João Crisóstomo (Hom. sobre S. Mateus, 50) comenta que neste episódio Jesus ensinou a Pedro a conhecer, por experiência própria, que toda a sua fortaleza lhe vinha do Senhor, enquanto de si mesmo só podia esperar fraqueza e miséria. Por outro lado, o Crisóstomo chega a dizer que «quando falta a nossa cooperação cessa também a ajuda de Deus». Daí a repreensão «homem de pouca fé» (14,31). Por isso quando Pedro começou a temer e a duvidar, começou também a afundar-se até que, de novo, cheio de fé, gritou: «Senhor, salva-me!».

Se como Pedro fraquejamos nalgum momento, esforcemo-nos também como ele na nossa fé e gritemos a Jesus para que venha salvar-nos.

11.08.14 – Mt 17,22-27

22Andando eles ainda na Galileia, disse-lhes Jesus: O Filho do homem há-de ser entregue nas mãos dos homens, 23que O hão-de matar; mas ao terceiro dia ressuscitará. Eles ficaram tristes em extremo.

24Entrados em Cafarnaum, aproximaram-se de Pedro os cobradores da didracma e disseram-lhe: O vosso Mestre não paga a didracma? 25Sim! — disse ele. Entrando depois na casa, antecipou-Se Jesus, pergun­tando: Que te parece, Simão? De quem recebem impostos ou tributo os reis da terra, dos seus filhos, ou dos estranhos? 26Respondendo ele: dos estranhos, disse-lhe Jesus: Logo, os filhos estão isentos. 27Contudo, para os não escandalizarmos, vai ao mar, lança o anzol, e o primeiro peixe que subir, toma-o, abre-lhe a boca e encontrarás um estáter. Tira-o e dá-lho a eles por Mim e por ti.

Comentário

24-27. «Didracma»: Moeda equivalente ao tributo que deviam pagar anualmente todos os Judeus ao Templo de Jerusalém. Correspondia mais ou menos ao jornal de um operário. O «estáter» de que falará o Senhor um pouco mais adiante (v. 27) era uma moeda grega equivalente a dois didracmas.

Jesus Cristo ensinava os Seus discípulos mediante coisas grandes e pequenas. A Pedro, que devia ser rocha sobre a qual ia fundar a Sua Igreja (Mt 16, 18-19), depois de o preparar com o magnífico episódio da Transfiguração (Mt 17, 1-8), faz-lhe ver agora a Sua divindade mediante um milagre de aparência intranscendente. Além disso, deve notar-se a pedagogia de Jesus: depois do segundo anúncio da Sua Paixão, os Seus discípulos tinham ficado tristes (Mt 17, 22-23); agora levanta o ânimo de Pedro com este milagre de características tão íntimas.

26. Vemos aqui a exactidão com que o Senhor quis cumprir os deveres de cidadão. Tenha-se em conta que, embora o imposto da didracma fosse de índole religiosa, contudo, pela constituição teocrática de Israel naquele tempo, o pagamento deste tributo implicava também uma obrigação de ordem cívica.

12.08.14 – Mt 18,1-5.10.12-14

Naquela mesma hora, chegaram-se os discípulos a Jesus e disseram-Lhe: Quem é, pois, o maior no Reino dos Céus? 2Chamou Ele um menino, pô-lo no meio deles 3e disse: Em verdade vos digo que, se não voltardes a ser, como meninos, não entrareis no Reino dos Céus. 4Todo aquele, pois, que se fizer pequeno como este menino, esse é o maior no Reino dos Céus. 5E quem receber um menino como este em Meu nome, é a Mim que recebe.

10Vede lá não desprezeis um só destes : pequeninos, pois Eu vos digo que os seus Anjos, nos Céus, estão incessantemente a contemplar a face de Meu Pai que está nos Céus.

12Que vos parece? Se alguém tiver cem ovelhas e alguma delas se desgarrar, não deixará, porventura, as noventa e nove pelos montes, para ir em busca da que se des­garrou? 13E se logra encontrá-la, em verdade vos digo que se alegra mais por via dela, do que pelas noventa e nove que se não desgar­raram. 14Assim, a vontade de vosso Pai que está nos Céus é que se não perca nem um só destes pequeninos.

Comentário

1-35. O conjunto dos ensinamentos de Jesus Cristo que se conservam no cap. 18 de São Mateus, tem sido chamado com freqüência Discurso eclesiástico, pois constitui uma espécie de corpo de ordenamentos e advertências que têm em vista o bom andamento da vida posterior da Igreja.

O primeiro passo (Mt 18, l-5) vai dirigido aos reitores, isto é, à futura hierarquia da Igreja, com o fim de os instruir e prevenir contra as inclinações naturais do orgulho humano e da ambição pelos cargos de governo, pondo como base a humildade. Seguem-se uns versículos (6-10) em que Jesus encarece a solicitude paternal com que os pastores da Igreja devem cuidar dos pequenos. Este termo abarca todos aqueles que, por qualquer causa (novos na fé, pouco instruídos, pouca idade, etc.), necessitam de ser especialmente ajudados. O divino Mestre detém-se a prevenir contra os prejuízos do escândalo: a caridade fraterna dos cristãos, e de modo particular dos pastores, exige de todos, e especialmente destes últimos, evitar tudo aquilo — mesmo o que de si pudesse ser correcto — que possa constituir um perigo para a salvação espiritual dos mais débeis ou pequenos: Deus tem particular providência deles e castigará aqueles que lhes causem dano.

Não menor atenção presta o Senhor também àqueles que se achem em situação espiritual difícil. É preciso então irem busca da ovelha perdida, inclusive heroicamente (vv. 12-14). Se a Igreja em geral, e cada cristão em particular, deve ter ânsia de estender o Evangelho, com mais razão ainda deve esforçar-se para que todos aqueles homens que já abraçaram a fé não se separem dela.

Relevante importância doutrinai tem o passo seguinte (vv. 15-18) sobre a correcção fraterna: a propósito dela, Jesus Cristo emprega o termo igreja como um organismo social, uma comunidade concreta, visível e compacta, em estreita dependência d’Ele e dos Seus Doze Apóstolos, que possuirão, eles e os seus sucessores, o omnímodo «poder das chaves», poder espiritual que será apoiado pelo próprio Deus. Entre esses poderes está o de perdoar ou reter os pecados, o de receber ou excomungar da Igreja, etc. Admirável poder divino, dado por Jesus à hierarquia da Igreja, guardado pelo próprio Deus com uma providência singular, mediante a presença para sempre de Jesus na Sua Igreja e a assistência do Espírito Santo ao seu Magistério hierárquico.

Segue-se ainda um passo (vv. 19-20) em que Jesus prome­te a Sua presença quando vários fiéis se reúnam para orar. A isso une-se a doutrina da necessidade da oração (v. 20) e do perdão das ofensas entre «os irmãos» (vv. 21-22), perdão que não tem limites. Termina o capítulo com a parábola do devedor cruel (vv. 23-35), em que o Senhor exemplifica a doutrina sobre o perdão.

Todo este capítulo 18, o Discurso eclesiástico, contempla, pois, a vida futura da Igreja no seu estádio terrestre, e formula as regras práticas de comportamento dos cristãos, de certo modo, como um complemento da carta magna do novo Reino trazido por Cristo, contida no Sermão da Monta­nha (caps. 5-7).

1-6. É claro que os discípulos ainda abrigavam ambi­ções terrenas ao pedir o primeiro lugar para quando Cristo instaure na terra o Seu Reino (cfr Act l ,6). Para corrigir o seu orgulho, o Senhor coloca diante deles um menino, exigindo-lhes que se querem entrar no Reino dos Céus, sejam por vontade o que as crianças são por idade. As crianças caracterizam-se pela sua incapacidade de ódio, e vê-se nelas uma total inocência no que diz respeito aos vícios, e principalmente ao orgulho, que é o maior de todos. São simples e abandonam-se confiadamente.

A humildade é um dos pilares mestres da vida cristã: «Se me perguntais — dizia Santo Agostinho — que é o mais essencial na religião e na disciplina de Jesus Cristo, responder-vos-ei: o primeiro a humildade, o segundo a humildade e o terceiro a humildade» (Epístola 118).

3-4. Aplicando estas palavras às virtudes de Nossa Senhora, Frei Luís de Granada sublinha que a humildade é mais excelente que a virgindade: «Se não podes imitar a virgindade da humilde, imita a humildade da virgem. Lou­vável é a virgindade, mas mais necessária é a humildade. Aquela nos aconselham, a esta nos obrigam; àquela nos convidam, a esta nos forçam (…). De maneira que aquela é galardoada como sacrifício voluntário, esta pedida como sacrifício obrigatório. Finalmente, podes salvar-te sem vir­gindade, mas não sem humildade» (Suma da vida cristã, livro 3, parte 2, cap. 10).

5. Acolher um menino em nome de Jesus é acolher o próprio Jesus. Porque as crianças são reflexo da inocência, da simplicidade, da pureza, da ternura do Senhor; «para uma alma enamorada, as crianças e os doentes são Ele» (Caminho, n.°419).

10. Dar escândalo aos pequenos é coisa grave: Jesus adverte-o com energia. Pois estes pequenos têm os seus anjos que os guardam e defendem, e que acusarão diante de Deus aqueles que os tenham induzido ao pecado.

No contexto fala-se dos anjos da guarda dos pequenos, visto que é a estes que se está a referir o passo. Mas todos os homens, grandes ou pequenos, têm o seu anjo da guarda. «A Providência de Deus deu aos anjos a missão de guardar a linhagem humana, e de socorrer cada homem (…). O Nosso Pai deu-nos, a cada um de nós, anjos para que sejamos fortalecidos com o seu poder e auxílio» (Catecismo Romano, IV, 9,4).

Esta doutrina deve levar-nos a uma intimidade confiante com o nosso anjo da guarda. «Tem confiança com o teu Anjo da Guarda. — Trata-o como amigo íntimo — é-o efectivamente — e ele saberá prestar-te mil e um serviços nos assuntos correntes de cada dia» (Caminho, n.° 562).

11-14. A parábola põe em relevo a solicitude amorosa do Senhor pelos pecadores. E manifesta de modo humano a alegria de Deus ao recuperar um filho querido que se tinha extraviado.

Diante do panorama de tantas almas que vivem afastadas de Deus, o Santo Padre comenta: «Infelizmente assistimos com angústia à corrupção moral que devasta a humanidade, desprezando especialmente os pequenos, de quem fala Jesus. (Que devemos fazer? Imitar o Bom Pastor e afanar-nos sem trégua pela salvação das almas. Sem esquecer a caridade material e a justiça social, devemos estar convencidos dê que a caridade mais sublime é a espiritual, ou seja, o interesse pela salvação das almas. E as almas salvam-se com a oração e o sacrifício. Esta é a missão da Igreja!» (João Paulo II, Homília às Clarissas de Albano, 14-VIII-1979).

Muitos manuscritos acrescentam, tomando-o segundo parece de Lc 19, 10,o v. 11: «Pois o Filho do Homem veio para salvar o que estava perdido».

13.08.14 – Mt 18,15-20

15Se teu irmão cometer alguma falta contra ti, vai erepreende-o, a sós, entre ti e ele. Se te ouvir, terás ganho o teu irmão. 16Mas se não te ouvir, toma contigo mais um ou dois, para que toda a questão se ajuste sob a palavra de duas ou três testemunhas. 17Se, porém, os não ouvir, diz à Igreja. E se nem sequer ouvir a Igreja, seja para ti como o gentio e o publicano. 18Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na Terra, será ligado no Céu; e tudo o que desligardes na Terra, será des­ligado no Céu.

19Outra vez vos digo em verdade que, se dois de vós sobre a Terra concordarem em pedir alguma coisa, ser-lhes-á concedido por Meu Pai que está nos Céus. 20Porque, onde estão dois reunidos em Meu nome, aí estou Eu no meio deles.

Comentário

15-17. O Senhor faz-nos aqui urna chamada a cooperar com Ele na santificação dos outros através da correcção fraterna, entre outros possíveis meios. Às fortes palavras com que o Senhor condenava o escândalo, seguem-se agora estas outras, não menos fortes, contra o pecado da negligência (cfr Hom. sobre S. Mateus, 61).

Existe obrigação de corrigir. O Senhor indica três graus de correcção: 1) a sós, 2) diante de uma ou duas testemu­nhas, e 3) diante da Igreja. A primeira refere-se aos escânda­los e pecados secretos ou particulares. Deve fazer-se a sós, com o fim de não proclamar sem necessidade o que é privado; também para não ferir o corrigido e facilitar a sua rectificação. Se esta correcção não desse o resultado que se busca, e a causa fosse grave, há-de recorrer-se ao segundo momento: buscar um ou dois amigos, cuja intervenção pode ser mais persuasiva. Por último vem a correcção jurídica, que se faz oficialmente diante da autoridade eclesiástica. Se o pecador assim advertido não admite a correcção, deve ser excomun­gado, isto é, afastado da comunhão da Igreja e dos seus sacramentos.

18. E preciso compreender este versículo em relação com o poder prometido antes a Pedro (cfr Mt 16,13-19). Será, pois, a hierarquia da Igreja quem vai exercer este poder outorgado por Cristo a Pedro, aos Apóstolos e aos seus legítimos sucessores: o Papa e os Bispos.

19-20. «Ubi caritas et amor, Deus ibi est», «onde há caridade e amor, aí está Deus», canta a liturgia da Quinta–Feira Santa, inspirada no texto sagrado de lIoh 4, 12. Pois, com efeito, o amor não se concebe onde há um só, mas supõe duas ou mais pessoas (cfr Comentário sobre S. Mateus, 18, 19-20). Assim, quando vários cristãos se reúnem em nome de Cristo para orar, entre eles está presente o Senhor, que escuta com agrado essa oração unânime dos seus: «Todos eles se entregavam assiduamente à oração numa só alma, com algumas mulheres, incluindo Maria, mãe de Jesus» (Act l, 14). Por isso, a Igreja viveu desde o princípio a prática da oração em comum (cfr Act 12, 5). «Há práticas de piedade — poucas, breve e habituais — que sempre se viveram nas famílias cristãs, e entendo que são maravilhosas: a bênção da mesa, a oração antes e depois das refeições, a recitação do Terço juntos — apesar de não faltar, nestes tempos, quem ataque essa solidíssima devoção mariana —, as orações pessoais ao levantar e ao deitar. Tratar-se-á de costumes diversos segun­do os lugares, mas penso que sempre se deve fomentar algum acto de piedade, que os membros da família realizem juntos, de forma simples e natural, sem beatices» (Temas Actuais do Cristianismo, n.° 103).

14.08.14 – Mt 18,21-19.1

21Então aproximou-se Pedro e disse-Lhe: Perdão Senhor, se meu irmão pecar contra mim, quantas vezes lhe devo perdoar? Ate sete vezes? 22Disse-lhe Jesus: Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. 23Por isso, é semelhante o Reino dos Céus a um rei que quis ajustar contas com os seus servos. 24Logo ao começar, foi-lhe apresentado um que devia dez mil talentos. 25E como não tivesse com que pagar, mandou o senhor que o vendessem a ele e à mulher e aos filhos e a tudo quanto tinha e que assim se pagasse a dívida. 26Lançou-se o servo por terra e, prostrando-se diante dele, disse-lhe: «Senhor, tem paciência comigo e pagar-te-ei tudo». 27E o senhor, compadecido daquele servo, mandou-o embora e perdoou-lhe a dívida. 28Ao sair, encontrou-se o servo com um dos seus companheiros que lhe devia cem dinheiros e, aferrando-o pelo pescoço afo­gava-o, dizendo: Paga o que deves. 29Lançou-se-lhe o companheiro aos pés e começou a suplicar-lhe: Tem paciência comigo e pagar-te-ei. 30Ele, porém, não quis, mas foi metê-lo na cadeia até que pagasse a dívida. 31Os outros servos, ao verem o que se passava, ficaram muito magoados e foram contar tudo ao senhor. 32Então o senhor chamou-o e disse-lhe: Servo perverso, perdoei-te toda aquela dívida, porque mo pediste. 33Não devias tu compadecer-te do teu compa­nheiro, como eu me compadeci de ti? 34E, indignado, o senhor entregou-o aos algozes até que pagasse toda a dívida. 35Assim vos fará também o Meu Pai celeste, se não perdoardes, cada um a seu irmão, do íntimo dos vossos corações.

E aconteceu que, tendo Jesus acabado estes discursos, partiu da Galileia e foi para os confins da Judeia, por além do Jordão.

 

Comentário

21-35. A pergunta de Pedro e, sobretudo, a resposta de Jesus dão-nos a pauta do espírito de compreensão e miseri­córdia que deve presidir à actuação dos cristãos.

A cifra de setenta vezes sete na linguagem hebraica equivale ao advérbio «sempre» (cfr Gen 4,24): « De modo que não encerrou o Senhor o perdão num número determinado, mas deu a entender que se tem de perdoar continuamente e sempre» (Hom. sobre S. Mateus, 6). Também se pode observar aqui um contraste entre a atitude mesquinha dos homens em perdoar com cálculo e a misericórdia infinita de Deus. Por outro lado, a nossa situação de devedores relativamente a Deus fica muito bem reflectida na parábola. Um talento equivalia a seis mil denarios e um denário era o jornal diário de um trabalhador. A dívida de dez mil talentos é uma quantidade exorbitante que nos dá idéia do valor imenso que tem o perdão que recebemos de Deus. Contudo, o ensinamen­to final da parábola é o de perdoar sempre e do íntimo do coração aos nossos irmãos. «Esforça-te, se é preciso, por perdoar sempre aos que te ofenderem, desde o primeiro instante, já que, por maior que seja o prejuízo ou a ofensa que te façam, mais te tem perdoado Deus a ti» (Caminho, n.°452).

 

15.08.14 – Mt 19,3-12

3Aproximaram-se d’Ele uns Fariseus, para O tentarem, e disseram-Lhe: É lícito repudiar a própria mulher por qualquer motivo? 4Respondeu Ele: Não lestes que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e disse: 5«Por isso deixará o homem pai e mãe e unir-se-á com sua mulher e formarão os dois uma só carne?». 6Portanto, já não são dois, mas uma carne só. Não separe, pois, o homem o que Deus ajuntou. 7Replicaram eles: Então, porque é que Moisés mandou dar-lhe libelo de repúdio e desquitá-la? 8Respondeu-lhes: Moisés, por causa da dureza do vosso coração, permitiu-vos repudiar as vossas mulheres. Mas, ao prin­cípio, não era assim. 9Ora Eu digo-vos que todo o que se desquitar de sua mulher, excepto no caso de união ilegítima, e casar com outra, comete adultério. E quem casar com uma desquitada, comete adultério.

10Dizem-Lhe os discípulos: Se tal é a condição do homem com a sua mulher, mais vale não casar. 11Respondeu-lhes Ele: Nem todos compreendem esta palavra, mas só aqueles a quem foi concedido. 12Porque há eunucos de nascença, e há eunucos que foram feitos tais pelos homens, e há eunucos que tais se fizeram a si mesmos, por amor do Reino dos Céus. Quem pode compreender, compreenda.

Comentário

4-5. «O matrimônio e o amor conjugai destinam-se por sua própria natureza à geração e educação da prole. Os filhos são, sem dúvida, o maior dom do matrimônio e contribuem muito para o bem dos próprios pais. O mesmo Deus que disse ‘não é bom que o homem esteja só (Gen 2,18) e que ‘desde a origem fez o homem varão e mulher’ (Mt 19, 4), querendo comunicar-lhe uma participação especial na Sua obra criadora, abençoou o homem e a mulher dizendo: ‘sede fecundos e multiplicai-vos’ (Gen l, 28). Por isso, o autêntico culto do amor conjugai, e toda a vida familiar que dele nasce, sem pôr de lado os outros fins do matrimônio, tendem a que os esposos, com fortaleza de ânimo, estejam dispostos a colaborar com o amor do criador e salvador, que por meio deles aumenta cada dia mais e enriquece a sua família (Gaudium et spes, n. 50).

9. Em todo este passo predomina o ensinamento do Senhor acerca da unidade e da indissolubilidade do matri­mônio. Como diz São João Crisóstomo, comentando este passo, o matrimônio é um com uma e para sempre (cfr Hom. sobre S. Mateus, 62). Sobre o sentido da frase «a não ser por fornicação» veja-se a nota a Mt 5,31-32).

11. « Nem todos são capazes de compreender esta dou­trina»: O Senhor sabe bem que as exigências dos Seus ensinamentos à volta do matrimônio e a Sua recomendação do celibato por amor de Deus chocam com o egoísmo humano. Por isso afirma que compreender esta doutrina é dom de Deus.

12. Com este modo figurado de falar refere-Se o Senhor aos que por Seu amor renunciam ao matrimônio e Lhe oferecem totalmente a sua vida. A virgindade por amor de Deus é um dos carismas mais estimados na Igreja (cfr lCor 7); mostra-se com a própria vida o estado dos bem-aventurados, que no Céu são como anjos (Mt 22, 30). Daqui que o Magistério da Igreja tenha declarado a superioridade do estado de virgindade por amor do Reino dos Céus, sobre o estado matrimonial (cfr De Sacram. matr., can. 10; cfr também Sacra virginitas). Sobre a virgindade e o celibato ensina o Concilio Vaticano II: «A santidade da Igreja é também especialmente favorecida pelos múltiplos conselhos que o Senhor propõe no Evangelho aos Seus discípulos. Entre eles sobressai o de, com o coração mais facilmente indiviso, se consagrarem só a Deus, na virgindade ou no celibato, dom da graça divina que o Pai concede a alguns (cfr Mt 19, 11; l Cor 7, 7). Esta continência perfeita, abraçada pelo reino dos céus, foi sempre tida em grande estima pela Igreja, como sinal e incentivo do amor e ainda como fonte privilegiada de fecundidade espiritual no mundo» (Lumen gentium, n. 42; cfr Perfectae caritatis, n. 12). E em concreto, com relação ao celibato sacerdotal, cfr o Decr. Presbyterorum ordinis n. 16 e o Decr. Optatam totius, n. 10.

Mas tanto a virgindade como o matrimônio são necessários para o crescimento da Igreja, e ambos supõem uma vocação específica da parte do Senhor: «O celibato é exactamente ‘dom do Espírito’. Um dom semelhante, muito embora diverso, está contido na vocação para o verdadeiro e fiel amor conjugai, ordenado para a procriação segundo a carne no contexto tão sublime do sacramento do Matrimônio. É conhe­cido que este dom é algo fundamental para construir a grande comunidade da Igreja, Povo de Deus. Entretanto, se esta comunidade quiser corresponder plenamente à sua vocação em Jesus Cristo, é necessário que nela se realize, em proporção adequada, também aquele outro ‘dom’, o dom do celibato ‘por amor do reino dos Céus’» (Carta a todos os sacerdotes, n.° 8).

16.08.14 – Mt 19,13-15

13Então apresentaram-Lhe umas criancinhas, para que impusesse as mãos sobre elas e orasse. Os discípulos ralhavam com elas. 14Jesus, porém, disse-lhes: Deixai as criancinhas e não as estorveis de virem a Mim, porque dos que são como elas é o Reino dos Céus. 15E impôs-lhes as mãos. Depois partiu dali.

Comentário

13-34. Uma vez mais (vid. Mt 1 8, l -6) mostra Jesus a sua predilecção pelas crianças, acolhendo-as e abençoando-as. Também a Igreja deu às crianças um lugar importante urgindo a necessidade do Baptismo: «Todas as crianças devem ser baptizadas. O sentir comum e a autoridade dos Santos Padres, prova que esta lei deve entender-se não só dos que estão em idade adulta, mas também das crianças na infância, e que a Igreja recebeu esta lei por Tradição apostólica. Deve crer-se, além disso, que Cristo Nosso Senhor não quis que se negasse o Sacramento e a Graça do Baptismo às crianças, das quais dizia: ‘deixai as crianças e não as impeçais de vir a Mim, porque destas é o Reino dos Céus’: as quais estreitava entre os Seus braços, punha sobre elas as mãos e as abençoava» (Catecismo Romano, II, 2,32).

17.08.14 – Lc 1,39-56

39Por aqueles dias, pôs-se Maria a caminho e dirigiu-se à pressa para a serra, em direcção a uma cidade de Judá. 40Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel. 41Apenas Isabel ouviu a saudação de Maria, saltou-lhe o menino no seio; Isabel ficou cheia do Espírito Santo 42e, erguendo a voz, num grande brado, exclamou: Bendita és tu entre as mulheres e bendito o fruto do teu ventre. 43E donde me é dado que venha ter comigo a Mãe. do meu Senhor? 44Pois, logo que me chegou aos ouvidos o eco da tua saudação, saltou de alegria o menino no meu seio. 45Feliz daquela que acreditou que teriam cumprimento as coisas que lhe foram ditas da parte do Senhor!

46Maria disse então:

«A minha alma enaltece ao Senhor,

47e o meu espírito exulta em Deus, meu Salvador,

48porque olhou para a humilde condição da sua serva.

De facto, desde agora, me hão-de chamar ditosa todas as gerações,

49porque me fez grandes coisas o Omnipotente.

E santo o Seu Nome,

50e a Sua misericórdia vai de geração em geração para aqueles que O temem. 51Exerceu a força com o Seu braço, dispersou os que se elevavam no seu próprio conceito.

52Derrubou os poderosos de seus tronos, e exaltou os humildes. 53Encheu de bens os famintos, e aos ricos despediu-os sem nada. 54Tornou a Seu cuidado Israel, Seu servo, recordando a Sua misericórdia 55conforme tinha dito a nossos pais em favor de Abraão e sua descendência, para sempre».

56Ficou Maria com Isabel uns três meses, voltando depois para sua casa.

Comentário

39-56. Contemplamos este episódio da visitação de Nossa Senhora a sua prima Santa Isabel no segundo mistério gozoso do santo Rosário: «(…) Acompanha alegremente José e Santa Maria… e ficarás a par das tradições da Casa de David. (…) Caminhamos apressadamente em direcção às montanhas, até uma aldeia da tribo de Judá (Lc 1,39).

«Chegamos. — É a casa onde vai nascer João Baptista. — Isabel aclama, agradecida, a Mãe do Redentor: Bendita és tu entre todas as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre! — A que devo eu tamanho bem, que venha visitar-me a Mãe do meu Senhor? (Lc I, 42-43).

«O Baptista, ainda por nascer, estremece… (Lc 1,41). A humildade de Maria derrama-se no Magnificat… — E tu e eu, que somos — que éramos — uns soberbos, prometemos ser humildes» (Santo Rosário, segundo mistério gozoso).

39. Nossa Senhora ao conhecer pela revelação do anjo a necessidade em que se achava a sua prima Santa Isabel, próxima já do parto, apressa-se a prestar-lhe ajuda, movida pela caridade. A Santíssima Virgem não repara em dificul­dades. Embora não saibamos o lugar exacto onde se achava Isabel (hoje supõe-se que é Ayn Karim), em qualquer caso o trajecto desde Nazaré até à montanha da Judeia supunha na antiguidade uma viagem de quatro dias.

Este facto da vida da Santíssima Virgem tem um claro ensinamento para os cristãos: devemos aprender d’Ela a solicitude pelos outros. «Não podemos conviver filialmente com Maria e pensar apenas em nós mesmos, nos nossos problemas. Não se pode tratar com a Virgem e ter, egoisticamente, problemas pessoais» (Cristo que passa, n.° 145).

42. Comenta São Beda que Isabel bendiz Maria com as mesmas palavras usadas pelo Arcanjo «para que se veja que deve ser honrada pelos anjos e pelos homens e que com razão se deve antepor a todas as mulheres» (In Lucae Evangelium expositio, ad loc.). Na recitação da Ave Maria repetimos estas saudações divinas com as quais «nos alegramos com Maria Santíssima pela sua excelsa dignidade de Mãe de Deus e bendizemos o Senhor e agradecemos-Lhe ter-nos dado Jesus Cristo por meio de Maria» (Catecismo Maior, n.° 333).

43. Isabel, ao chamar a Maria «mãe do meu Senhor», movida pelo Espírito Santo, manifesta que a Virgem Santíssima é Mãe de Deus.

44. São João Baptista, ainda que tenha sido concebido em pecado — o pecado original — como os outros homens, todavia, nasceu sem ele, porque foi santificado nas entranha» de sua mãe Santa Isabel pela presença de Jesus Cristo (então no seio de Maria) e da Santíssima Viagem. Ao receber este benefício divino São João manifesta a sua alegria saltando de gozo no seio materno. Estes factos foram o cumprimento da profecia do arcanjo São Gabriel (cfr Lc 1,15).

São João Crisóstomo admirava-se na contemplação desta cena do Evangelho: «Vede que novo e admirável é este mistério. Ainda não saiu do seio e já fala mediante saltos; ainda não lhe é permitido clamar e já é escutado pelos factos (…); ainda não vê a luz e já indica qual é o Sol; ainda não nasceu e já se apressa a fazer de Precursor. Estando presente o Senhor não se pode conter nem suporta esperar o» prazos da natureza, mas procura romper o cárcere do seio materno e busca dar testemunho de que o Salvador está prestes a chegar» (Sermo apud Metaphr., mense Júlio).

45. Adiantando-se ao coro de todas as gerações vin­douras, Isabel, movida pelo Espírito Santo, proclama bem-|’-aventurada a Mãe do Senhor e louva a sua fé. Não houve fé como a de Maria; n’Ela temos o modelo mais acabado de quais devem ser as disposições da criatura diante do seu criador: submissão completa, acatamento pleno. Com a sua fé, Maria é o instrumento escolhido pelo Senhor para levar a cabo a Redenção como Mediadora universal de todas as graças. Com efeito, a Santíssima Virgem está associada à obra redentora de seu Filho: «Esta associação da mãe com o Filho na obra da Salvação, manifesta-se desde a conceição virginal de Cristo até à Sua morte. Primeiro, quando Maria, tendo partido solicitamente para visitar Isabel, foi por ela chamada bem-aventurada, por causa da fé com que acreditara na salvação prometida, e o precursor exultou no seio de sua mãe (…). Assim avançou a Virgem pelo caminho dá fé, mantendo fielmente a união com o seu Filho até à cruz. |Junto desta esteve, não sem desígnio de Deus (cfr Ioh 19,25), padecendo acerbamente com o seu Filho único, e associando-se com coração de mãe ao Seu sacrifício, consentindo com amor na imolação da vítima que d’Ela nascera» (Lúmen gentium, nn. 57-58).

O novo texto latino recolhe de modo literal o original grego ao dizer «quae crédidit», em vez de «quae credidisti», como fazia a Vulgata, que neste caso é mais fiel ao sentido que à letra. Assim traduzem a maioria dos autores e assim traduzimos nós: «Feliz daquela que acreditou».

46-55. O cântico Magnificat que Nossa Senhora pronuncia em casa de Zacarias é de uma singular beleza poética. Evoca alguns passos do Antigo Testamento que a Virgem Santíssima tinha meditado (recorda especialmente l Sam 2,1-10).

Neste cântico podem distinguir-se três estrofes: na pri­meira (w. 46-50) Maria glorifica a Deus por a ter feito Mãe do Salvador, faz ver o motivo pelo qual a chamarão bem-aven­turada todas as gerações e mostra como no mistério da Encarnação se manifestam o poder, a santidade e a miseri­córdia de Deus. Na segunda (vv. 51-53) a Virgem Santíssima ensina-nos como em todo o tempo o Senhor teve predilecção pelos humildes, resistindo aos soberbos e arrogantes. Na terceira (vv. 54-55) proclama que Deus, segundo a Sua promessa, teve sempre especial cuidado do povo escolhido, ao qual vai dar o maior título de .glória: a Encarnação de Jesus Cristo, judeu segundo a carne (cfr Rom l ,3).

«A nossa oração pode acompanhar e imitar essa oração de Maria. Tal como Ela, sentiremos o desejo de cantar, de proclamar as maravilhas de Deus, para que a Humanidade inteira e todos os seres participem da nossa felicidade». (Cristo que passa, n.° 144).

46-47; « Os primeiros frutos do Espírito Santo são a paz e a alegria. E a Santíssima Virgem tinha reunido em si toda a graça do Espírito Santo…» (In Psalmos homiliae, in Ps 32). Os sentimentos da alma de Maria derramam-se no Magnificat. A alma humilde diante dos favores de Deus sente-se movida ao gozo e ao agradecimento. Na Santíssima Virgem o benefício divino ultrapassa toda a graça concedida a qual­quer criatura. «Virgem Mãe de Deus, o que não cabe nos Céus, feito homem, encerrou-Se no teu seio» (Antífona da Missa do Comum das. festas de Santa Maria). A Virgem humilde de Nazaré vai ser a Mãe de Deus; jamais a omnipotência do Criador se manifestou de um modo tão pleno. E o Coração de Nossa Senhora manifesta de modo desbordante a sua gratidão e a sua alegria.

48-49. Diante desta manifestação de humildade de Nossa Senhora, exclama São Beda: «Convinha, pois, que assim como tinha entrado a morte no mundo pela soberba dos nossos primeiros pais, se manifestasse a entrada da Vida pela humildade de Maria» (In Lucae Evangelium expositio, ad loc.).

«Que grande é o valor da humildade! — ‘Quia respexit humilitatem…’. Acima da fé, da caridade, da pureza ima­culada, reza o hino jubiloso da nossa Mãe em casa de Zacarias:

«’Porque viu a minha humildade, eis que por isto me chamarão bem-aventurada todas as gerações’» (Caminho, n.° 598).

Deus premeia a humildade da Virgem Santíssima com o reconhecimento por parte de todos os homens da sua grandeza: «Me hão-de chamar ditosa todas as gerações». Isto cumpre-se sempre que alguém pronuncia as pala­vras da Ave Maria. Este clamor de louvor à Nossa Mãe é ininterrupto em toda a terra. O Concilio Vaticano II recorda estas palavras da Virgem Santíssima ao falar-nos do culto a Nossa Senhora: « Desde os tempos mais antigos a Santíssima Virgem é honrada com o título de ‘Mãe de Deus’, e sob a sua protecção se acolhem os fiéis, em todos os perigos e necessi­dades. Foi sobretudo a partir do Concilio de Éfeso que o culto do Povo de Deus para com Maria cresceu admiravelmente, na veneração e no amor, na invocação e na imitação, segundo as suas proféticas palavras: ‘Todas as gerações me proclamarão bem-aventurada, porque realizou em mim grandes coisas Aquele que é poderoso’» (Lumen gentium, n. 66).

50. «A sua misericórdia vai de geração em geração». Estas palavras, «já desde o momento da Encarnação, abrem nova perspectiva da história da salvação. Após a ressurreição de Cristo, esta nova perspectiva passa para ó plano histórico e, ao mesmo tempo, reveste-se de sentido escatológico novo. Desde então sucedem-se sempre novas gerações de homens na imensa família humana, em dimensões sempre crescen­tes; sucedem-se também novas gerações do Povo de Deus, assinaladas pelo sinal da Cruz e da Ressurreição e ‘seladas’ com o sinal do mistério pascal de Cristo, revelação absoluta daquela misericórdia que Maria proclamou à entrada da casa da sua parente: ‘A sua misericórdia estende-se de geração em geração’ (…).

«Maria, portanto, é aquela que conhece mais profunda­mente o mistério da misericórdia divina. Conhece o seu preço e sabe quanto é elevado. Neste sentido chamamos-lhe Mãe da misericórdia, Nossa Senhora da Misericórdia, ou Mãe da divina misericórdia. Em cada um destes títulos há um profundo significado teológico, porque exprimem a parti­cular preparação da sua alma e de toda a sua pessoa, para torná-la capaz de descobrir, primeiro, através dos complexos acontecimentos de Israel e, depois, daqueles que dizem respeito a cada um dos homens e à humanidade inteira, a misericórdia da qual todos se tornam participantes, segundo o eterno desígnio da Santíssima Trindade, ‘de geração em geração’» (Dives in misericórdia, n. 9).

51. «Os que se elevavam no seu próprio conceito»: São os que querem aparecer como superiores aos outros, a quem desprezam. E também alude à condição daqueles que na sua arrogância projectam planos de ordenação da sociedade e do mundo de costas ou contra a Lei de Deus. Embora possa parecer que de momento têm êxito, no fim cumprem-se estas palavras do cântico da Virgem Santíssima, pois Deus disper­sá-los-á como já fez com os que tentaram edificar a torre de Babel, que pretendiam chegasse até ao Céu (cfr Gen 11,4).

«Quando o orgulho se apodera da alma, não é estranho que atrás dele, como pela arreata, venham todos os vícios: a avareza, as intemperanças, a inveja, a injustiça. O soberbo procura inutilmente arrancar Deus — que é misericordioso com todas as criaturas — do Seu trono para se colocar lá ele, que actua com entranhas de crueldade.

«Temos de pedir ao Senhor que não nos deixe cair nesta tentação. A soberba é o pior dos pecados e o mais ridículo. (…) A soberba é desagradável, mesmo humanamente, porque o que se considera superior a todos e a tudo está continua­mente a contemplar-se a si mesmo e a desprezar os outros, que lhe pagam na mesma moeda, rindo-se da sua fatuidade» (Amigos de Deus, n.° 100).

53. Esta Providência divina manifestou-se muitíssimas vezes ao longo da História. Assim, Deus alimentou com o maná o povo de Israel na sua peregrinação pelo deserto durante quarenta anos (Ex 16,4-35); igualmente Elias por meio de um anjo (1Reg 19, 5-8); Daniel no fosso dos leões (Dan 14,31-40); a viúva de Sarepta com o azeite que miraculosamente não se esgotava (l Reg 17,8 ss.). Assim também culminou as ânsias de santidade da Virgem Santíssima com a Encarnação do Verbo.

Deus tinha alimentado com a Sua Lei e a pregação dos Seus Profetas o povo eleito, mas o resto da humanidade sentia a necessidade da palavra de Deus. Agora, com a Encarnação do Verbo, Deus satisfaz a indigência da humani­dade inteira. Serão os humildes que acolherão este ofereci­mento de Deus; os auto-suficientes, ao não desejarem os bens divinos, ficarão privados deles (cfr In P salmos homiliae in Ps 33).

54. Deus conduziu o povo israelita como uma criança, como Seu filho a quem amava ternamente: «Yahwéh, teu Deus, conduziu-te por todo o caminho que tendes percorrido, como um homem conduz o seu filho…» (Dt 1,31). Isto fê-lo Deus muitas vezes, valendo-se de Moisés, de Josué, de Samuel, de David, etc., e agora conduz o Seu povo de maneira definitiva enviando o Messias. A origem última deste proceder divino é a grande misericórdia de Deus que Se compadeceu da miséria de Israel e de todo o gênero humano.

55. A misericórdia de Deus foi prometida desde tempos antigos aos Patriarcas. Assim, a Adão (Gen 3,15), a Abraão (Gen 22,18), a David (2Sam 7,12), etc. A Encarnação de Cristo tinha sido preparada e decretada por Deus desde a eternidade para a salvação da humanidade inteira. Tal é o amor que Deus tem aos homens; o próprio Filho de Deus Encarnado o declarará: «De facto, Deus amou de tal maneira o mundo que lhe deu o Seu Filho Unigênito, para que todo o que n’Ele acredita não pereça, mas tenha a vida eterna» (Ioh 3,16).

18.08.14 – Mt 19,16-22

16Senão quando, aproxima-se um que Lhe diz: Mestre, que hei-de fazer de bom para obter a vida eterna? 17Respondeu-lhe Ele: Porque Me interrogas sobre o que é bom? Bom é um só. Mas se queres entrar na vida, guarda os mandamentos. l8Diz-Lhe: Quais? Jesus respondeu: Não matar, não adulterar, não roubar, não levantar falso testemunho, 19honrar pai e mãe e amar o próximo como a ti mesmo. 20Disse-Lhe o jovem: Tudo isso tenho eu observado desde a minha mocidade. Que me falta ainda? 21Respondeu-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende o que tens e dá-o aos pobres e terás um tesouro nos Céus. Depois, vem e segue-Me. 22O jovem, ao ouvir estas palavras, afastou-se triste, pois tinha muitos haveres.

Comentário

17. A Vulgata e outras versões, apoiadas em bastantes códices gregos, esclarecem esta frase completando-a: «Um só é o bom. Deus».

20-22. «Que me falta ainda?»: O jovem guardava já os mandamentos necessários para a salvação. Mas há mais. Por isso o Senhor responde: «se queres ser perfeito…», isto é, se queres adquirir o que ainda te falta. Trata-se de um novo chamamento de Jesus: «Depois, vem e segue-Me…». Com estas palavras o Senhor manifesta que quer fazê-lo Seu «discípulo», e por isso lhe exige, como fez com os outros (cfr Mt 4,19-22), que abandone tudo o que possa ser obstáculo para uma plena dedicação ao Reino de Deus.

A cena termina de forma melancólica: o jovem afasta-se triste. O apego às suas coisas prevalece sobre o convite carinhoso de Jesus. É a tristeza que se segue à falta de coragem para responder à chamada do Senhor com a entrega pessoal.

Os evangelistas ao narrar este acontecimento transcendem o mero episódio para nos situarem diante de um caso tipo: descreve-se uma situação, formula-se uma lei: a da vocação divina, específica, para entregar-se ao Seu serviço e ao de todos os homens.

Este jovem ficou como figura do cristão a quem a sua mediocridade e a curteza de vista impedem de converter a sua vida numa entrega gozosa e fecunda ao serviço de Deus e do próximo.

Se tivesse sido suficientemente generoso para responder ao chamamento divino, que teria chegado a ser? Um grande apóstolo, sem dúvida.

19.08.14 – Mt 19,23-30

23Jesus disse então aos discípulos: Em Pobreza verdade vos digo que um rico dificilmente cristas’93 entrará no Reino dos Céus. 24Torno a dizer: É mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico no Reino de Deus.

25Os discípulos, ao ouvirem isto, ficaram muito admirados e diziam: Se é assim, quem se poderá salvar? 26Jesus fitou-os e disse: Aos homens é impossível, mas a Deus tudo é possível. 27Então Pedro, tomando a palavra, disse-Lhe: Nós deixamos tudo e seguimos-Te; qual será, logo a nossa recom­pensa?

28E Jesus disse-lhes: Em verdade vos digo que vós, os que Me tendes seguido, na regeneração, quando o Filho do homem Se sentar no Seu trono de glória, sentar-vos-eis vós sobre doze tronos, a julgar as doze tribos de Israel. 29E todo aquele que deixar casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, mulher, filhos ou campos por causa do Meu nome, receberá cem por um e receberá em herança a vida eterna. 30Muitas vezes, porém, os primeiros serão os últimos e os últimos primeiros.

Comentário

24-26. Com esta comparação expõe Jesus a impossibi­lidade que têm de participar no Reino de Deus os que põem o seu coração nos bens deste mundo.

«A Deus tudo é possível»: Isto é, com a graça divina o homem pode ter a fortaleza e a generosidade suficientes para fazer das riquezas um instrumento de serviço a Deus e aos homens. Esta é a razão pela qual no capítulo 5 de São Mateus se precisa que são bem-aventurados os pobres de espírito (Mt 5, 3).

28. Por «regeneração» entende-se aqui a renovação de todas as coisas quando Jesus Cristo vier para julgar os vivos e os mortos. Parte integrante desta renovação será a ressurrei­ção dos corpos.

O antigo povo de Deus, Israel, estava constituído por doze tribos. O novo Povo de Deus, que é a Igreja, a que estão chamados todos os homens, está fundada por Jesus Cristo sobre os Doze Apóstolos sob o primado de Pedro.

29. Encontramo-nos perante umas expressões muito gráficas que não devem ser atenuadas. É significado nelas que o amor a Jesus Cristo e ao Seu Evangelho deve estar por cima de tudo. Estas frases não devem interpretar-se de forma contraditória com a Vontade do próprio Deus, que instituiu e santificou os laços familiares.

20.08.14 – Mt 20,1-16

Com efeito, o Reino dos Céus é semelhante a um proprietário que saiu de manhã cedo a contratar trabalhadores para da vinha a sua vinha. 2E, tendo ajustado com os trabalhadores a um dinheiro por dia, man­dou-os para a sua vinha. 3Saindo depois, cerca da terceira hora, viu outros que estavam na praça ociosos 4e disse-lhes: «Ide também vós para a minha vinha, e dar-vos-ei o que for; justo». 5E eles foram. Tornando a sair, certa da hora sexta e da nona, fez na mesma. 6Enfim, cerca da undécima, saindo, encon­trou lá outros parados e disse-lhes: «Porque estais aqui todo o dia sem fazer nada?» 7Responderam-lhe: «Porque ninguém nos falou». Disse-lhes: «Ide também vós para a minha vinha». 8Ao anoitecer, diz o dono da vinha ao feitor: «Chama os trabalhadores e paga-lhes a jorna, a começar pelos últimos até aos primeiros». 9E, chegando-se os da undécima hora, receberam cada qual um dinheiro. 10Quando chegaram os primeiros, julgaram que receberiam mais, mas rece­beram também eles cada qual um dinheiro. 11E, ao recebê-lo, murmuravam contra o proprietário 12e diziam: «Estes últimos tra­balharam só uma hora e igualaste-los a nós que agüentamos o peso do dia e a calma!» 13Ele, porém, respondendo a um deles, disse: «Meu amigo, não te faço nenhuma injus­tiça? Não ajustaste comigo por um dinheiro? 14Toma o que é teu e vai-te. Quero dar a este último tanto como a ti. 15Ou não me será lícito fazer o que quero do que é meu? Serão maus os teus olhos porque eu sou bom?» 16Assim, os últimos serão primeiros e pri­meiros os últimos.

 

Comentário

1-16. A parábola refere-se directamente ao povo judaico. Deus chamou-o na primeira hora, desde há séculos. Ultimamente chamou também os gentios. Todos são chamados com o mesmo direito a fazer parte do novo Povo de Deus, que é a Igreja. Para todos o convite é gratuito. Por isso, os Judeus, que foram chamados primeiro, não teriam razão ao murmurar contra Deus pela escolha dos últimos, que têm o mesmo prêmio: fazer parte do Seu Povo. À primeira vista, o protesto dos jornaleiros da primeira hora parece justo. E parece-o, porque não compreendem que poder trabalhar na vinha do Senhor é um dom divino. Jesus deixa claro com a parábola que são diversos os caminhos pelos quais chama, mas que o prêmio é sempre o mesmo: o Céu.

2. «Denario» era uma moeda de prata com inscrição e imagem de César Augusto (Mt 22,19-21) e, como se vê aqui, equivalia ao jornal de um operário agrícola.

3. Os judeus calculavam o tempo de modo diferente ao nosso. Dividiam a totalidade do dia em oito partes, quatro para a noite, que chamavam vigílias (Lc 12,38), e quatro para o tempo compreendido entre o nascer e o pôr do sol, que chamavam horas: hora de prima, de tércia, de sextae de noa.

A hora de prima começava ao nascer do sol e terminava pelas nove; a de tércia abarcava até às doze; a de sexta até às três da tarde e a de noa até ao pôr do sol. Por isso a duração das horas de prima e de noa era instável: minguava durante o Outono e o Inverno, e crescia durante a Primavera e o Verão; ao invés acontecia com as vigílias primeira e quarta.

Convém notar que por vezes se contavam as horas intermédias como aparece no v. 6, onde se fala da hora undécima talvez para recalcar o pouco tempo que faltava já para o pôr do sol, fim do trabalho.

16. A Vulgata, outras versões e bastantes códices gregos acrescentam: «Porque muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos» (cfr Mt 22,14).

 

21.08.14 – Mt 22,1-14

E Jesus, continuando, tornou a falar-lhes em parábolas, e disse: 2O Reino dos céus é semelhante a um rei que celebrou as bodas de seu filho, 3e mandou os servos bodas chamar os convidados para as bodas, mas eles não quiseram vir. 4Tornou a mandar outros servos com este recado: «Dizei aos convidados: Vede que o meu banquete está preparado, abatidos os meus novilhos e animais cevados, e tudo pronto. Vinde para as bodas.» 5Eles, porém, não fizeram caso e foram um para o seu campo, outro para o seu negócios; 6os outros lançaram mão dos servos, ultrajaram-nos e mataram-nos. 7O rei, encolerizado, enviou os seus exércitos 8Disse então aos servos: «As bodas estão preparadas, mas os convi­dados não eram dignos. 9Ide, pois, às encru­zilhadas dos caminhos e convidai quantos encontrardes.» 10Saíram os servos pelos caminhos e ajuntaram quantos encontraram, maus e bons, e encheu-se o salão de convivas. 11Entrando o rei, para ver os convivas, repa­rou num homem que não estava vestido com o traje de boda 12e disse-lhe: «Amigo, como entraste aqui sem o traje de boda?» Ele emudeceu. 13Disse então o rei aos ser­ventes: «Atai-o de pés e mãos e lançai-o nas trevas exteriores. Aí haverá choro e ranger de dentes.» 14Pois muitos são chamados, mas poucos escolhidos.

Comentário

1-14. Nesta parábola Jesus Cristo põe em realce a insistente Vontade de Deus Pai que chama todos os homens à salvação — o banquete que é o Reino dos Céus —, e a misteriosa malícia que se encerra na rejeição voluntária deste convite: tão grave, que merece um castigo definitivo. Diante da chamada de Deus à conversão, à aceitação da fé e das suas conseqüências, não há interesses humanos que se possam opor razoavelmente. Não admite desculpas.

Os Santos Padres viram nos primeiros convidados o povo judaico. Efectivamente, no curso da História da Salvação, Deus dirigiu-Se primeiro aos Israelitas, depois a todos os gentios (Act 13,46).

A repulsa da chamada amorosa de Deus por parte dos Israelitas, devida a indiferença ou a hostilidade, levou-os à perdição. Mas também os gentios devem corresponder fielmente à sua chamada para não serem arrojados «às trevas exteriores».

«As bodas, diz São Gregório Magno (In Evangelia homiliae, 36), são as bodas de Cristo com a Sua Igreja, e o traje é a virtude da caridade: entra portanto nas bodas, mas sem o vestido, quem tem fé na Igreja, mas não possui a caridade».

O traje de bodas indica, em geral, as disposições com que se há-de entrar no Reino dos Céus. Se alguém não as possui, mesmo pertencendo à Igreja, será condenado no dia em que Deus julgar cada um. Estas disposições são, em resumo, a correspondência à graça.

13. O Concilio Vaticano II recorda a verdade dos novís­simos, um de cujos aspectos declara este versículo. Ao falar da índole escatológica da Igreja, invoca a advertência do Senhor de que estejamos vigilantes contra as arremetidas do demônio, para poder resistir no dia mau (cfr Eph 6, 11-13). «Mas, como não sabemos o dia nem a hora, é preciso que, segundo a recomendação do Senhor, vigiemos continuamente, a fim de que no termo da nossa vida sobre a terra, que é só uma (cfr Heb 9, 27), mereçamos entrar com Ele para o banquete de núpcias e ser contados entre os eleitos (cfr Mt 25, 31 -46), e não sejamos lançados, como servos maus e preguiçosos (cfr Mt 25, 26), no fogo eterno (cfr Mt 25, 41), nas trevas exteriores, onde ‘haverá choro e ranger de dentes’» (Lumen gentium, n. 48).

14. Estas palavras não contradizem, de modo algum, a vontade salvífica universal de Deus (cfr lTim 2,4). Com efeito, Cristo, no Seu Amor pelos homens, busca a conversão de cada alma com infinita paciência, até ao extremo de morrer na cruz (cfr Mt 23, 37; Lc 15, 4-7). E a doutrina que ensina o apóstolo São Paulo, quando diz que Cristo nos amou e « Se entregou a Si mesmo por nós como oblação e vítima» (Eph 5, 2). Cada um de nós pode afirmar com o Apóstolo que Cristo «me amou e Se entregou a Si mesmo por mim» (Gal 2, 20). Não obstante, Deus, na Sua infinita sabedoria, respeita a liberdade do homem, que tem a tremenda possibilidade de rejeitar a graça (cfr Mt 7,13-14).

22.08.14 – Mt 22, 34-40

34Mas os Fariseus, ao saberem que fizera calar os Saduceus, juntaram-se num corpo, 35e um deles, que era doutor da lei, para O tentar, interrogou-O: 36Mestre, qual é o maior mandamento da Lei? 37Respondeu Ele: Ama o Senhor teu Deus, com todo o teu coração e com toda a tua alma e com todo o teu entendimento. 38Este é o maior e o primeiro mandamento. 39E o segundo é semelhante a este: Ama o teu próximo como a ti mesmo. 40 Destes dois mandamentos depende toda a Lei e os Profetas.

Comentário

34-40. Diante da pergunta, o Senhor põe em relevo que toda a Lei se condensa em dois mandamentos: o primeiro e mais importante consiste no amor incondicional a Deus; o segundo é consequência e efeito do primeiro: porque quando é amado o homem, diz São Tomás, é amado Deus já que o homem é imagem de Deus (cfr Comentário sobre S. Mateus, 22,4).

Quem ama deveras Deus ama também os seus iguais, porque verá neles os seus irmãos, filhos do mesmo Pai, redimidos pelo mesmo sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo: «Temos este mandamento de Deus: que o que ame a Deus ame também o seu irmão» (l Ioh 4, 21). Há, porém, um perigo: se amamos o homem pelo homem, sem referência a Deus, este amor converte-se em obstáculo que impede o cumprimento do primeiro preceito; e então deixa também de ser verdadeiro amor ao próximo. Mas o amor ao próximo por Deus é prova patente de que amamos a Deus: «se alguém diz: amo a Deus, mas despreza o seu irmão, é um mentiroso» (lIoh 4,20).

«Amarás o teu próximo como a ti mesmo»: Estabelece aqui o Senhor que a medida prática do amor ao próximo há-de ser o amor a si mesmo; tanto o amor aos outros como o amor a si mesmo fundamentam-se no amor a Deus. Daí que, nuns casos, o amor de Deus exigirá pôr uma necessidade do próximo por diante da nossa e, noutros casos, não: depende do diverso valor que tenham, à luz do amor de Deus, os bens espirituais e materiais que estejam em jogo.

É evidente que os bens do espírito têm uma precedência absoluta sobre os bens materiais, inclusive o da própria vida. Daí que sempre há que salvar, antes de mais, os bens espirituais, quer sejam próprios ou do próximo. Quando se trata do supremo bem espiritual, que é a salvação da alma, de nenhum modo se pode correr o perigo certo de condenar-se para salvar outro, porque, dada a liberdade humana, nunca podemos estar seguros da decisão pessoal que possa tomar o próximo: é a situação que reflecte a parábola das virgens néscias e prudentes (cfr Mt 25, 1-13) ao negar-se estas a dar-lhes o azeite; no mesmo sentido diz São Paulo que se faria anátema para salvar os seus irmãos (cfr Rom 9, 3), numa frase condicional irreal. Não obstante, é claro que temos de fazer tudo o possível para salvar os nossos irmãos, conscientes de que quem contribui para que o pecador se converta do seu extravio salvar-se-á ele mesmo da morte eterna e cobrirá a multidão dos seus pecados (Iac 5, 20). De tudo isso se deduz que o próprio amor recto de si, fundado no Amor de Deus ao homem, traz como consequência as exigências radicais do esquecimento de si para amar a Deus e ao próximo por Deus.

23.08.14 – Mt 13,44-46

44O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro escondido no campo; o homem que o encontrou, esconde-o e, cheio de alegria, vai, vende tudo o que tem e compra aquele campo.

45E também semelhante o Reino dos Céus a um negociante que procura pérolas finas. 46Tendo encontrado uma de grande preço, vendeu tudo o que tinha e comprou-a.

Comentário

44-46. Com duas parábolas apresenta Jesus o valor supremo do Reino dos Céus e a atitude do homem para o alcançar. Mesmo sendo muito parecidas entre si, apresentam diferenças dignas de nota: o tesouro significa a abundância de dons; a pérola, a beleza do Reino. O tesouro apresenta-se de repente, a pérola supõe, pelo contrário, uma busca esforçada; mas em ambos os casos o que encontra fica inundado de um profundo gozo. Assim é a fé, a vocação, a verdadeira sabedoria, «o desejo do céu»: por vezes, apre­senta-se de modo inesperado, outras segue-se a uma intensa busca (cfr In Evangelia homiliae, 11). Não obstante, a atitude do homem é idêntica em ambas as parábolas e está descrita com os mesmos termos: «vai e vende tudo quanto tem e compra-a»: o desprendimento, a generosidade, é condição indispensável para o alcançar.

«Quem compreende o reino que Cristo propõe, reconhece que vale a pena jogar tudo para o conseguir (…). O reino dos Céus é uma conquista difícil, e ninguém tem a certeza de o alcançar, embora o clamor humilde do homem arrependido consiga que se abram as suas portas de par em par» (Cristo que passa, n.° 180).

24.08.14 – Mt 16,13-20

13Em seguida, foi Jesus para os lados de Cesareia de Filipe e perguntou aos discípulos: Quem dizem os homens que é o Filho do homem? 14Responderam-Lhe: Uns, João Baptista: outros, Elias; outros, Jeremias ou algum dos profetas. 15Disse-lhes Jesus: E quem dizeis vós que Eu sou? 16Respondeu Simão Pedro, dizendo: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo. 17E Jesus, respondendo-lhe, disse: Bem-aventurado és tu, Simão, Barjona, porque não foi a carne e o sangue que to revelaram, mas Meu Pai que,está nos Céus. 18E Eu digo-te a ti que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a Minha Igreja, e as portas do Inferno não prevalecerão contra ela. 19Dar-te-ei as chaves do Reino dos Céus, e tudo o que ligares na terra, será ligado nos Céus; e tudo o que desligares na terra, será desligado nos Céus. 20Entáo intimou aos discípulos que não dissessem a ninguém que Ele era o Cristo.

Comentário

13-20. Neste passo promete-se a São Pedro o Primado sobre toda a Igreja. Primado que Jesus lhe conferirá, depois da Sua Ressurreição, segundo nos relata o Evangelho de São João (cfr Ioh21, 15-18). Os poderes supremos são dados a Pedro para bem da Igreja. Como esta há-de durar até ao fim dos tempos, esses poderes transmitir-se-ão àqueles que sucedam a Pedro ao longo da história. O Romano Pontífice é em concreto o sucessor de São Pedro.

A doutrina sobre o Primado de Pedro e dos seus sucessores foi definida como dogma de fé pelo Magistério solene da Igreja no Concilio Vaticano I, nos seguintes termos: «Ensinamos, pois, e declaramos que, segundo os testemunhos do Evangelho, o primado de jurisdição sobre a Igreja universal de Deus foi prometido e conferido, imediata e directamente, ao bem-aventurado Pedro por Cristo Nosso Senhor. Porque só a Simão — a quem já antes tinha dito: ‘Tu chamar-te-ás Cefas’ (Ioh l, 42) —, depois de pronunciar a sua confissão: ‘Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo’, se dirigiu o Senhor com estas solenes palavras: ‘Bem-aventurado és, Simão filho de João, porque não foi a carne nem o sangue que te revelaram isso, mas Meu Pai que está nos Céus. E Eu digo-te, que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a Minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Dar-te-ei as chaves do Reino dos Céus; e tudo o que ligares na terra ficará ligado nos Céus, e tudo o que desligares na terra, ficará desligado nos Céus’ (Mt 16, 16 ss.). E só a Simão Pedro conferiu Jesus, depois da Sua Ressurreição, a jurisdição de pastor e chefe supremo de todo o Seu rebanho, dizendo: ‘Apascenta os Meus cordeiros. Apascenta as Minhas ovelhas’ (Ioh21, 15 ss.)… (Canon). Se alguém disser que o bem-aventurado Pedro Apóstolo não foi constituído por Cristo Senhor príncipe de todos os Apóstolos e cabeça visível de toda a Igreja militante, ou que recebeu directa e imediatamente do próprio Jesus Cristo Senhor Nosso somente o primado de honra, mas não de verdadeira e própria jurisdição, seja anátema».

Ora bem, «o que Cristo Senhor, príncipe dos pastores e grão pastor das ovelhas, instituiu no bem-aventurado Após­tolo Pedro para perpétua salvação e bem perene da Igreja, é mister que dure perpetuamente por obra do mesmo Senhor na Igreja que, fundada sobre a pedra, tem de permanecer firme até à consumação dos séculos. ‘Para ninguém, na verdade, é duvidoso, antes, pára todos os séculos é notório, que o santo e beatíssimo Pedro, príncipe e cabeça dos Apóstolos, coluna da fé e fundamento da Igreja Católica, recebeu as chaves do Reino das mãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, Salvador e Redentor do gênero humano; e até ao tempo presente e sempre continua a viver, preside e exerce o juízo nos seus sucessores’ (cfr Concilio de Efeso), os bispos da santa Sé Romana, por ele fundada e pelo seu sangue consa­grada. Donde se segue que seja quem for o que sucede a Pedro nesta cátedra, esse, segundo a instituição do próprio Cristo, obtém o Primado de Pedro sobre a Igreja universal…

«Por esta causa, foi sempre necessário que a esta Igreja Romana, ‘pela sua mais poderosa principalidade, se unisse toda a Igreja, isto é, quantos fiéis há, de onde quer que sejam’…

«(Canon.) Se alguém disser que não é de instituição do próprio Cristo, isto é, de direito divino, que o bem-aven­turado Pedro tenha perpétuos sucessores no primado sobre a Igreja universal; ou que o Romano Pontífice não é sucessor do bem-aventurado Pedro no mesmo primado, seja anátema.

«… Julgamos que é absolutamente necessário afirmar solenemente a prerrogativa que o Unigênito Filho de Deus se dignou juntar com o supremo dever pastoral.

«Assim, pois, Nós, seguindo a tradição recolhida fielmente desde o princípio da fé cristã, para glória de Deus Salvador. Nosso, para exaltação da fé católica e salvação dos povos cristãos, com aprovação do sagrado concilio, ensinamos e definimos ser dogma divinamente revelado: Que o Romano Pontífice, quando fala ex cathedra — isto é, quando cumprindo o seu cargo de pastor e doutor de todos os cristãos, define pela sua suprema autoridade apostólica que uma doutrina sobre a fé e costumes deve ser definida pela Igreja universal —, pela assistência divina que lhe foi prometida na pessoa do bem-aventurado Pedro, goza daquela infalibilidade de que o Redentor divino quis que estivesse prevista a Sua Igreja na definição da doutrina sobre a fé e os costumes; e, por isso, que as definições do Romano Pontífice são irreformáveis por si mesmas e não pelo consentimento da Igreja.

«(Canon.) E se alguém tivesse a ousadia, o que Deus não permita, de contradizer essa definição nossa, seja anátema» (Pastor aeternus, caps l, 2 e 4).

25.08.14 – Mt 23,13-22

13Ai de vós, Escribas e Fariseus hipócritas, que fechais aos homens o Reino dos Céus, pois que nem vós entrais nem deixais que entrem os que já iam a entrar. 14Ai de vós, Escribas e Fariseus hipócritas, que devorais as casas das viúvas, sob pretexto de longas orações. Por isso recebereis maior conde­nação. 15Ai de vós, Escribas e Fariseus hipó­critas, que correis o mar e a terra para fazer um prosélito e, depois de feito, tornai-lo filho da Geena, duas vezes pior do que vós.

16Ai de vós, guias cegos, que dizeis: «Jurar pelo santuário não é nada; mas quem jurar pelo oiro do santuário, fica obrigado.» 17Insensatos e cegos! Pois qual é mais: o oiro, ou o santuário, que santifica o oiro? 18E: «Jurar pelo altar, não é nada; mas quem jurar pela oferenda que está sobre ele, fica obrigado.» l9Cegos! Qual é mais, a oferenda, ou o altar, que santifica a oferenda? 20A verdade é que quem jura pelo altar jura por ele e por todas as coisas que estão sobre ele. 21E quem jura pelo santuário jura por ele e por Aquele que nele habita. 22E quem jura pelo Céu jura pelo trono de Deus e por Aquele que nele está sentado.

Comentário

13. Começam aqui as invectivas do Senhor contra o comportamento de escribas e fariseus. Estas queixas marcadas pela palavra ai! incluem a rejeição de um passado cheio de más acções e uma ameaça para o futuro, se não há conversão e arrependimento.

14. Muitos manuscritos, por influxo de Mc 12,40 e Lc 20, 47, acrescentam o v. 14: «Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que devorais as casas das viúvas, sob o pretexto de longas orações! Por isso recebereis maior condenação». Com estas palavras o Senhor não reprova os fariseus por rezarem longas orações, mas pela sua hipocrisia e cobiça. Os fariseus, na verdade, através de muitas práticas externas de religião, procuravam ser considerados como homens de piedade, para se aproveitarem depois desta reputação diante das pessoas débeis, como eram as viúvas. Estas encomen­davam-se às suas rezas, e eles, em troca, pediam muitas esmolas. Jesus quer indicar com esta afirmação que a oração deve vir sempre de um coração recto e de um espírito generoso. Vejam-se as notas a Mt 6,5-8.

15. Com a palavra’« prosélito» designavam-se os pagãos que se convertiam ao judaísmo. Prosélito — segundo a sua raiz — indica « o que vem », o que se une por um chamamento de Deus ao povo escolhido, vindo da idolatria. Os fariseus não se poupavam a esforços para ganhar uma nova conversão. Nosso Senhor não os reprova pelo seu proselitismo, mas por se preocuparem exclusivamente por ter um êxito humano, por motivos de vangloria.

A desgraça destes prosélitos era que, tendo recebido a luz da revelação do Antigo Testamento, ficavam, todavia, nas mãos dos escribas e fariseus, que os imbuíam também da sua própria visão humana.

22. A doutrina de Nosso Senhor sobre o juramento está exposta no Sermão da Montanha (Mt 5,33-37). Jesus elimina a casuística minuciosa dos fariseus para apontar directamente para a rectidão de intenção do que jura e para realçar a majestade e a dignidade de Deus. O que pede Jesus é um coração puro, sem engano.

O Senhor repreende sobretudo a atitude de desvirtuar o juramento, que tinham os doutores da Lei, faltando com isso ao respeito pelas coisas sagradas e, principalmente, pelo Nome Santo de Deus. Jesus chama a atenção, portanto, sobre o preceito da Lei: «Não tomaras em vão o nome do Senhor, teu Deus» (Ex 20, 7; Lev 19,12; Dt 5,11).

26.08.14 – Mt 23,23-26

23Ai de vós, Escribas e Fariseus hipócritas, que pagais os dízimos da hortelã, do endro e dos cominhos e deixais o que é de maior importância na Lei: a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Estas são as coisas que devíeis praticar sem omitir aquelas. 24Guias cegos, que filtrais o mosquito e engulis o camelo.

25Ai de vós Escribas e Fariseus hipócritas, que limpais por fora o copo e o prato quando, por dentro, estão cheios de rapina e de cobiça. 26Fariseu cego, começa por limpar o interior do copo e do prato para que o exterior fique limpo!

Comentário

23. A hortelã, o endro (ou anis) e o cominho são ervas que os Judeus cultivavam e empregavam para aromatizar as casas ou para condimentar a comida. Sendo produtos insigni­ficantes não entravam no preceito moisaico do pagamento dos dízimos (Lev 27, 30-33; Dt 14, 22 ss.); este dizia respeito aos animais domésticos e a alguns dos produtos mais cor­rentes do campo: trigo, vinho, azeite, etc. Não obstante, os fariseus, para ostentar o seu respeito escrupuloso pela Lei, pagavam os dízimos inclusive daquelas ervas. Era uma falsa manifestação de generosidade e de acatamento da Lei: o Senhor não a despreza nem a rejeita, apenas restabelece a ordem das coisas. E inútil cuidar os pormenores secundários, se não se cuidam as coisas fundamentais e verdadeiramente importantes: a justiça, a misericórdia e a fidelidade.

24. Por escrúpulo de não se exporem a tragar algum insecto declarado impuro pela Lei, os fariseus chegavam a filtrar as bebidas através de um lenço. Nosso Senhor reprova–os por esse modo ridículo de se comportarem: filtrar cuida­dosamente um mosquito, ter escrúpulo da menor coisa e tragar sem vacilação de nenhuma espécie o camelo: cometer grandes pecados.

25-26. Antes o Senhor tinha reprovado os fariseus pela sua hipocrisia nas práticas de piedade; aqui lança-lhes à cara a sua simulação no terreno moral. Os Judeus faziam nume­rosas abluções de pratos, copos e objectos de mesa, segundo as condições requeridas sobre a pureza legal (cfr Mc 7,1-4).

A imagem utilizada aponta para um nível mais profundo: o cuidado da pureza moral que está no interior do homem. Esta é a que primordialmente interessa: limpeza de coração, rectidão de intenção, coerência entre palavras e obras, etc.

27.08.14 – Lc 7, 11-17

11Em seguida, dirigiu-Se a uma cidade chamada Naim, indo com Ele os Seus discípulos e grande multidão. 12Quando Se aproximava da porta da cidade, traziam um defunto a enterrar, filho único de sua mãe. Esta era viúva, e vinha a acompanhá-la bastante gente da cidade. 13Ao vê-la, o Senhor compadeceu-Se dela e disse-lhe: Não chores. 14Aproximando-Se, tocou no caixão e estacaram os que o transportavam. Depois disse: Meu rapaz, Eu to digo, levan­ta-te. I5O morto sentou-se e começou a falar; e Ele entregou-o à mãe. 16Encheram-se todos de temor e davam glória a Deus, dizendo: Surgiu entre nós um grande profeta, e Deus visitou o Seu povo. 17Divulgou-se este dito a Seu respeito na Judeia inteira e em toda a região circunvizinha.

Comentário

11-17. «Jesus vê a angústia daquelas pessoas com quem Se cruza ocasionalmente. Podia ter passado de lado ou ter esperado que O chamassem e Lhe fizessem um pedido. Mas não Se afasta, nem fica na expectativa. Toma Ele próprio a iniciativa, movido pela aflição de uma viúva que perdera a única coisa que lhe restava —o filho.

«Explica o evangelista que Jesus Se compadeceu- talvez a Sua comoção tivesse também sinais externos, como pela morte de Lázaro. Jesus não era, nem é, insensível ao padecimento que nasce do amor, nem sente prazer em separar os filhos dos pais. Supera a morte, para dar a vida, para que aqueles que se amam convivam, exigindo, antes e ao mesmo tempo, a preeminência do Amor divino que deve informar a autêntica existência cristã.

Cristo sabe que O rodeia uma grande multidão, a quem o milagre encherá de pasmo e que há-de ir apregoando o sucedido por toda aquela região. Mas o Senhor não actua com artificialismo, só para praticar um ‘feito’; sente-Se singelamente afectado pelo sofrimento daquela mulher; não pode deixar de a consolar. Então, aproximou-Se e disse-lhe: não chores (Lc VII, 13). Que é como se lhe dissesse: hão te quero ver desfeita em lágrimas, pois Eu vim trazer à Terra a alegria e a paz. E imediatamente se dá o milagre, manifes­tação do poder de Cristo, Deus. Mas antes já se dera a comoção da Sua alma, manifestação evidente da ternura do coração de Cristo, Homem» (Cristo que passa, n.° 166).

15. A alegria da mãe ao recuperar vivo o seu filho recorda a alegria da Santa Madre Igreja pelos seus filhos pecadores regressados à vida da graça. «A mãe viúva — comenta Santo Agostinho — alegra-se com o seu filho ressus­citado. A Mãe Igreja alegra-se diariamente com os homens que ressuscitam na sua alma. Aquele, morto quanto ao corpo; estes, quanto ao seu espírito. Aquela morte visível chora-se visivelmente; a morte invisível destes nem se chora nem se vê. Busca estes mortos o que os conhece, o que os pode fazer regressar à vida» (Sermo 98,2).

28.08.14 – Mt 24,42-51

42Vigiai, pois, porque não sabeis em que dia virá o vosso Senhor.43Notai, porém, uma coisa: Se o pai de família soubesse em que quarto da noite havia de vir o ladrão, estaria alerta e não deixaria arrombar a sua casa. 44Por isso, estai vós também preparados, porque, na hora em que menos o pensais, virá o Filho do homem.

45Quem é, pois, o servo fiel e prudente, a quem o Senhor pôs à frente da sua criadagem, para lhe dar de comer a seu tempo? 46Ditoso daquele servo, a quem o Senhor, quanto vier, encontrar procedendo assim! Em verdade vos digo que o fará superintendente de todos os seus haveres. 48Mas se aquele mau servo disser de si para consigo: «o meu senhor ainda tarda», 49e começar a espancar os companheiros, e a comer e a beber com os ébrios, 50virá o senhor do tal servo, no dia em que não espera, e na hora que não sabe, 51e parti-lo-á em dois, e dar-lhe-á a sorte dos hipócritas. Aí haverá choro e ranger de dentes. tendente de todos os seus haveres. 48Mas se aquele mau servo disser de si para consigo: «o meu senhor ainda tarda», 49e começar a espancar os companheiros, e a comer e a beber com os ébrios, 50virá o senhor do tal servo, no dia em que não espera, e na hora que não sabe, 51e parti-lo-á em dois, e dar-lhe-á a sorte dos hipócritas. Aí haverá choro e ranger de dentes.

Comentário

42. A consequência que tira o próprio Jesus Cristo desta revelação sobre as coisas futuras é que o cristão deve viver vigilante cada dia como se fosse o último da sua vida.

O importante não é elocubrar acerca de quando e como serão esses acontecimentos últimos, mas viver de tal forma que nos encontrem na graça de Deus.

51. «Dar-lhe-á o maior castigo»: Literalmente «parti-lo-á em dois»; pode entender-se, metaforicamente, «arrojá-lo-á de si». «Pranto e ranger de dentes»: As penas do inferno.

29.08.14 – Mc 6,17-29

17De facto, Herodes mandara prender a João e pusera-o a ferros numa prisão por causa de Herodiade, mulher de seu irmão

Filipe, com a qual tinha casado. 18Porque João dizia a Herodes: Não te é lícito ter a mulher de teu irmão. 19Herodíade perseguia-o e queria fazê-lo condenar à morte, mas não podia. 20É que Herodes, sabendo que João era homem justo e santo, temia-o e protegia–o e, quando o ouvia, ficava muito perplexo, mas escutava-o com prazer. 21Chegou enfim um dia favorável, quando Herodes, no seu aniversário natalício, deu um banquete aos grandes da sua corte e aos oficiais e aos principais da Galileia. 22A filha da mesma Herodíade apresentou-se a dançar e agradou a Herodes e aos convivas, tanto que o rei disse à moça: Pede-me o que quiseres e dar-to-ei. 23E jurou-lhe: Tudo o que me pedires te darei, ainda que seja metade do meu reino. 24Ela saiu a perguntar à mãe: Que hei-de pedir? Respondeu-lhe: A cabeça de João Baptista. 25Voltou ela, a correr, à pre­sença do rei e fez-lhe assim o pedido: Quero que me dês agora mesmo, num prato, a cabeça de João Baptista. 26Entristeceu-se muito o rei, mas, por causa do juramento e dos convivas, não quis faltar-lhe à palavra. 27E logo o rei mandou um guarda com ordem de trazer a cabeça dele. Este foi e decapitou-o no cárcere; 28e trouxe a cabeça num prato e deu-a à moça, e a moça deu-a à mãe. 29Ao saberem disso, os seus discípulos vieram e levaram o corpo e depuseram-no num sepulcro.

Comentário

16-29. E de notar que se intercala no relato evangélico o extenso episódio da morte de João Baptista. A razão é que São João Baptista tem relevância especial na História da Salvação, porque é o Precursor, encarregado de preparar os caminhos do Messias. Por outro lado, João Baptista tinha um grande prestígio entre o povo: consideravam-no profeta (Mc 11,32) e alguns inclusivamente o Messias (Lc 3, 15; Ioh l, 20) e acorriam a ele de muitos lugares (Mc l, 5). O próprio Jesus chegou a dizer: «Entre os nascidos de mulher, não surgiu nenhum maior que João Baptista» (Mt 11,11). Mais tarde, o apóstolo São João voltaria a falar dele no seu Evangelho: « Houve um homem enviado por Deus, que se chamava João» (Ioh l, 6). Mas no texto sagrado esclarece-se, não obstante, que o Baptista, apesar de tanto, não era a luz, mas a testemunha da luz (Ioh l, 6-8). Propriamente apenas era a lâmpada que levava a luz (Ioh 5,35).

De João Baptista é-nos dito aqui que era justo e que pregava a cada qual aquilo de que necessitava: à multidão do povo, aos publicanos, aos soldados (Lc 3,10-14); aos fariseus e aos saduceus (Mt 3, 7-12), ao próprio rei Herodes (Mc 6, 18-20). Este homem humilde, íntegro e austero, garante com a sua vida o testemunho que davam as suas palavras sobre o Messias Jesus (Ioh l, 29.36-37).

26. Os juramentos e as promessas de conteúdo imoral não se devem fazer. E, se se fizeram, não se devem cumprir. Esta é a doutrina da Igreja, resumida pelo Catecismo Maior de São Pio X, n.° 383, da seguinte maneira: «Estamos obrigados a manter o juramento de fazer coisas injustas ou ilícitas? Não só não estamos obrigados, mas, pelo contrário, pecamos ao fazê-las, como coisas proibidas pela Lei de Deus ou da Igreja».

30.08.14 – Mt 25,14-30

14Com efeito, é como um homem que ao empreender uma viagem chamou os servos e lhes entregou os próprios bens. 15A um deu cinco talentos, a outro dois e a outro um, a cada qual segundo a sua capacidade, e partiu. 16O que recebera cinco talentos foi logo negociar com eles e lucrou outros cinco. 17Do mesmo modo, o que recebera dois lucrou, também ele, outros dois. 18Mas o que recebera um só, foi abrir uma cova na terra e escondeu o dinheiro do seu senhor. 19Depois de muito tempo, voltou o senhor daqueles servos e chamou-os a contas. 20O que rece­bera cinco talentos chegou, apresentou outros cinco talentos e disse: «Senhor, cinco talentos me entregaste, aqui estão outros cinco que eu ganhei».21 Respondeu-lhe o senhor: «Muito bem! Servo bom e fiel! Foste fiel em coisas de pouca monta, dar-te-ei a superintendência de coisas grandes. Entra no gozo do teu Senhor.» 22Chegou também o que recebera dois talentos e disse: «Senhor dois talentos me entregaste, aqui estão outros dois que eu ganhei.» 23Disse-lhe o senhor: «Muito bem! Servo bom e fiel! Foste fiel em coisas de pouca monta, dar-te-ei a superintendência de coisas grandes. Entra no gozo do teu Senhor.» 24Chegou também o que tinha recebido um só talento e disse: «Senhor, eu sabia que és homem duro, que ceifas onde não semeaste, e recolhes donde não espalhastes. 25Com medo fui esconder o teu talento na terra. Aqui tens o que é teu». 26Respondeu-lhe o senhor: «Servo mau e preguiçoso! Sabias que eu ceifo onde não semeei e recolho donde não espalhei? 27Por isso mesmo devias dar o meu dinheiro aos banqueiros e eu, quando voltasse, receberia o que era meu com os juros. 28Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem dez talentos. 29Porque a todo aquele que tem, dar-se-lhe-á e terá em abundância; ao que não tem, ainda o que tem lhe será tirado. 30Quanto a esse servo inútil, lançai-o nas trevas exte­riores. Aí haverá choro e ranger de dentes».

Comentário

14-30. O talento não era propriamente uma moeda, mas uma unidade contável”, que equivalia aproximadamente a uns cincoenta quilos de prata.

Nesta parábola o Senhor ensina-nos principalmente a necessidade de corresponder à graça de uma maneira esfor­çada, exigente e constante durante toda a vida. Importa fazer render todos os dons de natureza e de graça recebidos do Senhor. O importante não é o número, mas a generosidade para os fazer frutificar.

A vocação cristã não se pode esconder, nem esterilizar, deve ser comunicativa, apostólica, entregada. «Não percas a tua eficácia, aniquila, pelo contrário o teu egoísmo. A tua vida para ti? A tua vida para Deus, para o bem de todos os homens, por amor ao Senhor. Desenterra esse talento! Torna-o produtivo» (Amigos de Deus, n.° 47).

A um fiel cristão corrente não pode passar-lhe desper­cebido o facto de que Jesus tenha querido explicar a doutrina da correspondência à graça servindo-se como figura do trabalho profissional dos homens. Não é isto recordar-nos que a vocação cristã se dá no meio das ocupações ordinárias da vida? «Há uma única vida. feita de carne e espírito, e essa é que tem de ser — na alma e no corpo — santa e cheia de Deus, deste Deus invisível, que nós encontramos nas coisas mais visíveis e materiais. Não há outro caminho, meus filhos: ou sabemos encontrar o Senhor na nossa vida corrente, ou nunca O encontraremos» (Temas Actuais do Cristianismo, n.° 114).

31.08.14 – Mt 16,21-27

21Desde então começou Jesus a declarar aos discípulos que tinha de ir a Jerusalém e padecer muito da parte dos Anciãos, dos Príncipes dos sacerdotes e dos Escribas, e ser morto e, ao terceiro dia, ressuscitar. 22Pelo que Pedro, chamando-O à parte, come­çou a estranhar-Lho, dizendo: Deus Te livre de tal, Senhor! Isso não Te acontecerá! 23Voltou-Se Ele e disse a Pedro: Tira-te da minha frente, satanás, tu és para Mim um escândalo, pois não aprecias as coisas de Deus, mas somente as dos homens.

24Jesus disse então aos discípulos: Se alguém quer vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. 25Porque, quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por minha causa, encontrá-la-á. 26Pois, de que servirá ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua alma? Ou que dará o homem em resgate da sua alma? 27Porque o Filho do homem há-de vir na glória de Seu Pai, com os Seus Anjos, e então remunerará a cada um segundo as suas obras.

 

Comentário

23. Jesus opõe-Se com energia aos protestos bem intencio­nados de São Pedro. O Senhor dá-nos a entender assim a importância capital que tem para a salvação o aceitar a cruz (cfr 1Cor 1, 23-25). Pouco antes (Mt 16, 17) Jesus tinha elogiado Pedro: «Bem-aventurado és Simão»; agora repreende-o: «Afasta-te de Mim, Satanás!»; ali tinha falado Pedro movido pelo Espírito Santo, aqui pelo seu próprio espírito de que não se tinha despojado totalmente.

24. «O amor de Deus que ‘foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado’ (Rom 5, 5), torna os leigos capazes de exprimir em verdade, na própria vida, o espírito das Bem-aventuranças. Seguindo a Cristo pobre, nem se deixam abater com a falta dos bens temporais nem se exaltam com a sua abundância; imitando a Cristo humilde, não são cobiçosos da glória vã (cfr Gal 5, 26), mas procuram mais agradar a Deus que aos homens, sempre dispostos a deixar tudo por Cristo (cfr Lc 14, 25) e a sofrer perseguição pela justiça (cfr t5,10), lembrados da palavra do Senhor: ‘se alguém quiser seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me’ (Mt 16, 24)» (Apostolicam actuositatem, n. 4).

25. O cristão não pode passar por alto estas palavras de Jesus Cristo. Deve arriscar-se, jogar a vida presente em troca de conseguir a eterna. « Que pouco é uma vida para oferecê-la a Deus!…» (Caminho, n.°420).

A exigência do Senhor inclui renunciar à própria vontade para a identificar com a de Deus, não aconteça que, como comenta São João da Cruz, tenhamos a sorte de muitos «que queriam que Deus quisesse o que eles querem, e entristecem-se de querer o que Deus quer, e têm repugnância em acomodar a sua vontade à de Deus. Disto vem que muitas vezes, no que não acham a sua vontade e gosto, pensam não ser da vontade de Deus e, pelo contrário, quando se satisfazem, crêem que Deus Se satisfaz, medindo também a Deus por si, e não a si mesmos por Deus» (Noite Escura, liv. I, cap. 7, n.° 3).

26-27. As palavras de Cristo são de uma clareza meridiana: situam cada homem, individualmente, diante do Juízo Final. A salvação tem, pois, um caracter radicalmente pessoal: «remunerará a cada um segundo as suas obras» (v. 27).

O fim do homem não é ganhar os bens temporais deste mundo, que são apenas meios ou instrumentos; o fim último do homem é o próprio Deus, que é possuído como antecipação aqui na terra pela graça, e plenamente e para sempre na Glória. Jesus indica qual é o caminho para conseguir esse fim: negar-se a si mesmo (isto é, tudo o que é comodidade, egoísmo, apego aos bens temporais) e levar a cruz. Porque nenhum bem terreno, que é caduco, é comparável à salvação eterna da alma. Como explica com precisão teológica São Tomás, «o menor bem da graça é superior a todo o bem do universo» (Suma Teológica, I-II, q.113, a. 9).

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