em Evangelho do dia

Setembro de 2015

01.09.2015 – Lc4, 31-37

31Depois desceu a Cafarnaum, cidade da Galileia e, ao sábado, lá estava a ensinar aquela gente. 32Eles enchiam-se de assombro com o seu ensino, porque a Sua palavra era cheia de autoridade.

33Achava-se na sinagoga um homem que tinha o espírito dum Demônio impuro, o qual se pôs a bradar em alta voz: 34 — Ah! Que tens que ver connosco, Jesus de Nazaré? Vieste para nos perder? Eu sei quem Tu és: o Santo de Deus! 35Disse-lhe Jesus em tom severo: Cala- te e sai desse homem. E o De­mônio, depois de o arremessar para o meio da assistência, saiu sem lhe fazer mal algum. 36Todos se encheram de espanto e exclamavam: Que palavra esta! Manda com auto­ridade e poder nos espíritos impuros, e eles saem! 37E a Sua nomeada estendeu-se a todos os lugares da região.

Comentário

33-37. A mesma autoridade que Jesus tinha mostrado com a Sua palavra mostra agora com os Seus factos.

34. O demônio diz a verdade nesta ocasião, ao cha­mar-Lhe «o Santo de Deus», mas Jesus não aceita este testemunho do «pai da mentira» (cfrIoh 8,44). Com efeito, o demônio costuma dizer algumas vezes a verdade para en­cobrir o erro e, ao semear assim a confusão, enganar mais facilmente. Jesus, ao fazer calar o demônio e ao expul­sá-lo, ensina-nos a ser prudentes e a não nos deixarmos enganar pelas verdades a meias.

02.09.2015 – Lc4, 38-44

38Partiu então da sinagoga e entrou em casa de Simão. Ora a sogra de Simão estava com uma febre aguda e os discípulos inter­cederam junto d’Ele em seu favor. 39Chegando à cabeceira dela, falou imperiosa­mente à febre, que a deixou. Ela ergueu-se imediatamente e começou a servi-los.

40Ao pôr do Sol, todos quantos tinham doentes com várias enfermidades traziam-Lhos, e Jesus, impondo as mãos a cada um deles, curava-os. 41Também de muitos saíam Demônios, que gritavam: Tu és o Filho de Deus. Mas Ele, em tom severo, impedia-os de falar, porque sabiam que Ele era o Messias.

42Quando se fez dia, saiu e dirigiu-Se a um lugar solitário. Foram à Sua procura as multidões e, ao chegarem junto d’Ele, tentavam retê-Lo, para que as não deixasse. 43Mas Ele disse-lhes: Eu tenho de ir também anunciar às outras cidades a Boa Nova do Reino de Deus, que para isso é que fui enviado. 44E andava a pregar pelas sinagogas da Judeia.

Comentário

38-39. Na vida pública de Jesus aparecem vários episó­dios estranháveis e familiares (cfr, p. ex., Lc 19,1; Ioh 2.1) que ajudam a compreender e a apreciar a estima do Senhor pela vida ordinária do lar.

Manifesta-se aqui a eficácia da oração pelos outros: «Mal rogavam ao Salvador — diz São Jerónimo — Ele imediata­mente curava os doentes; dando a entender que também atende as súplicas dos fiéis contra as paixões dos pecados» (Expositio in Evangelium sec. Lucam, ad loc.).

Sobre esta cura instantânea e completa observa São João Crisóstomo: «Como a doença era curável deu a conhecer o Seu poder no modo de curar, fazendo o que a medicina não podia.Depois da cura da febre os enfermos necessitam de tempo para recuperar a sua antiga saúde, mas neste caso fez-se tudo no mesmo instante»(Hom. sobre S. Mateus, 27).

Os Santos Padres viram na febre desta mulher uma figura da concupiscência: «Na febre da sogra de Pedro (…) está representada a nossa carne afectada por diversas doenças e concupiscências; a nossa febre é a paixão, à nossa febre é a luxúria, a nossa febre é a ira, vícios que embora digam respeito ao corpo, perturbam a alma, a mente e o sentido» (ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.).

Quanto às consequências práticas, diz-nos São Cirilo: «Recebamos nós Jesus, porque quando nos visita e O levamos na mente e no coração extingue em nós o ardor das maiores paixões, e manter-nos-á incólumes para que O sirvamos, isto é, para que façamos o que Lhe agrada» (Hom. 28 in Mattheum).

43. De novo o Senhor insiste num dos motivos da Sua vinda a este mundo. São Tomás, falando do fim da Encarnação, explica que Cristo «veio ao mundo em primeiro lugar para manifestar a verdade, como Ele próprio diz: ‘para isto nasci e para isto vim ao mundo, para dar testemunho da verdade’ (Ioh 18,37). Por isto não devia ocultar-Se, levando uma vida solitária, mas manifestar-Se em público e pregar publicamente. E assim dizia aos que pretendiam detê-Lo: É necessário que Eu anuncie também a outras cidades o Evangelho do Reino de Deus, porque para isto fui enviado’. Em segundo lugar, veio para livrar os homens do pecado, de acordo com o que diz o Apóstolo: -‘Jesus Cristo veio a este mundo para salvar os pecadores’ (1Tim 1,15). Pelo que diz o Crisóstomo: ‘Embora permanecendo sempre no mesmo lu­gar Cristo tivesse podido atrair a Si todos para que ouvissem & Sua pregação, não o fez para nos dar exemplo de que temos de ir em busca das ovelhas perdidas, como o pastor busca a ovelha extraviada, ou o médico açode ao enfermo’. Em terceiro lugar, veio para que ‘por Ele tenhamos acesso a Deus’ (Rom 5,2)» (Suma Teológica, III, q. 40, a. l, c.).

03.09.2015 – Lc5, 1-11

1Uma vez em que a multidão se apertava em torno de Jesus, a ouvir a palavra de Deus, e Ele mesmo de pé junto ao lago de Genesaré, 2viu dois barcos estacionados no lago. Os pescadores, que deles se haviam retirado, lavavam as redes. 3Depois de subir para um dos barcos, que era de Simão, pediu-lhe que se afastasse um pouco da terra para o largo; e, sentando-Se, pôs-Se a ensinar do barco as multidões.

4Quando cessou de falar, disse a Simão: Faz-te ao largo; e vós, largai as redes para a pesca. 5Disse-Lhe Simão, em resposta: Mestre, moirejámos toda a noite e nada apanhamos; todavia, porque o dizes, largarei as redes. 6E, depois de o terem feito, apanharam grande quantidade de peixe. 7Ora as redes estavam a romper-se, e eles fizeram sinal aos companheiros que se encontravam no outro barco, para os virem ajudar. Estes vieram; e encheram ambos os barcos, a ponto de se irem afundando. 8Ao ver isso, Simão Pedro lançou-se aos pés de Jesus, dizendo: Afasta-Te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador. 9De facto, enchera-se de espanto, ele e todos os que com ele estavam, por causa da pesca que tinham feito, 10o mesmo sucedendo a Tiago e a João, filhos de Zebedeu, que eram companheiros de Simão. Disse Jesus a Simão: Não tenhas receio; doravante ficarás a apanhar homens. 11E eles, depois de reconduzirem os barcos para terra, deixaram tudo e seguiram-No.

Comentário

1. “Tal como hoje! Não estais a ver? Estão desejando ouvir a mensagem de Deus, embora o dissimulem exteriormente. Talvez alguns se tenham esquecido da doutrina de Cristo; talvez outros, sem culpa sua, nunca a tenham aprendido e olhem para a religião como coisa estranha… Mas convencei-vos de uma realidade sempre actual: chega sempre um momento em que a alma não pode mais; em que não lhe bastam as explicações vulgares; em que não a satisfazem as mentiras dos falsos profetas. E, mesmo que nem então o admitam, essas pessoas sentem fome, desejam saciar a sua inquietação com os ensinamentos do Senhor” (Amigos de Deus, n° 260).

3. Os Santos Padres viram nesta barca de Pedro, a que o Senhor sobe, uma imagem da Igreja peregrina nesta terra. “Esta é aquela barca que segundo São Mateus ainda se afunda, e segundo São Lucas se enche de peixes. Reconhecei assim os princípios dificultosos da Igreja e a sua posterior fecundidade” (ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.). Cristo sobe para a barca para ensinar dali as multidões. De igual modo continua a ensinar da Igreja – a barca de Pedro – todas as gentes.

Cada um de nós pode ver-se representado nesta barca a que Cristo sobe. Externamente pode não mudar nada: “Que mudança há então? Há mudança na alma, porque nela entrou Cristo, tal como entrou na barca de Pedro. Abrem-se amplos horizontes, maior ambição de servir e um desejo irreprimível de anunciar a todas as criaturas as magnalia Dei (Act 2, 11), as coisas maravilhosas que o Senhor faz, se lho permitimos” (Amigos de Deus, n° 265).

4. “Quando acabou a Sua catequese, ordenou a Simão: Faz-te mais ao largo e lançai as vossas redes para pescar; é Cristo o dono da barca; é Ele quem prepara para a faina. Para isso é que veio ao mundo: para tratar de que os seus irmãos descubram o caminho da glória e do amor do Pai” (Amigos de Deus, n° 260). Para levar a cabo esta tarefa, o Senhor ordena a todos que lancem as redes, mas somente a Pedro que dirija a barca mar adentro.

Todo este passo faz referência, em certo modo, à vida da Igreja. Nela o Romano Pontífice, sucessor de Pedro, “é vigário de Jesus Cristo porque O representa na terra e faz as Suas vezes no governo da Igreja” (Catecismo Maior, n° 195). Cristo dirige-se também a cada um de nós para que nos sintamos urgidos a um trabalho apostólico audaz: “‘Duc in altum’ – Ao largo! – Repele o pessimismo que te torna cobarde. ‘Etlaxateretiavestra in capturam’ – e lança as redes para pescar. Não vês que podes dizer, como Pedro: ‘in nomine tuo, laxaborete’- Jesus, em Teu nome, procurarei almas?” (Caminho, n° 792).

“Se cedesses à tentação de perguntar a ti mesmo: quem me manda a mim meter-me nisto?, teria de responder-te: manda-to, pede-to o próprio Cristo. A messe é grande e os operários são poucos. Rogai, pois, ao Senhor da messe que mande operários para a sua messe (Mt IX, 37-38). Não digas, comodamente: eu para isto não sirvo; para isto já há outros. Se tu pudesses falar assim, todos podiam dizer a mesma coisa.

O pedido de Cristo dirige-se a todos e a cada um dos cristãos. Ninguém está dispensado: nem por razões de idade, nem de saúde, nem de ocupação. Não há desculpas de nenhum género. Ou produzimos frutos de apostolado ou a nossa fé será estéril” (Amigos de Deus, n° 272).

5. Perante a ordem de Cristo, Simão expõe as suas dificuldades. “A resposta de Simão parece razoável. Costumavam pescar de noite, e precisamente aquela noite tinha sido infrutífera. Para que haviam de pescar de dia? Mas Pedro tem fé: Porém, sobre a Tua palavra, lançarei a rede. Resolve proceder como Cristo lhe sugeriu; compromete-se a trabalhar, fiado na Palavra do Senhor” (Amigos de Deus, n.°261).

8. O desejo de Pedro não é que Cristo Se afaste dele, mas, por causa dos seus pecados, declara-se indigno de estar próximo do Senhor. O que disse Pedro recorda a atitude do Centurião que se confessa indigno de que Jesus entre na sua casa (Mt 8,8). A Igreja manda os seus filhos repetir estas mesmas palavras do Centurião antes de receberem a Santíssima Eucaristia. Como também indica a conveniência de manifestar externamente a reverência devida ao Sacramento no acto de comungar: Pedro ensina-nos com o seu gesto, ao prostrar-se diante do Senhor, que também os sentimentos internos de adoração a Deus se devem manifestar exteriormente.

11. A perfeição não consiste em deixar simplesmente todas as coisas, mas em deixá-las para seguir a Cristo. Isto é o que fizeram os Apóstolos: abandonam tudo para estarem disponíveis perante as exigências da vocação divina.

Devemos fomentar no nosso coração esta disponibilidade porque “Jesus não Se satisfaz ‘compartilhando’; quer tudo” (Caminho, n° 155).

Se falta a entrega generosa encontraremos muitas dificuldades para seguir a Jesus Cristo: “Desprende-te das criaturas até ficares despido delas. Porque – diz o Papa São Gregório – o demónio nada tem de seu neste mundo, e acode nu à contenda. Se vais, vestido, lutar com ele, em breve cairás por terra. Porque terá por onde apanhar-te” (Caminho, n° 149).

Se falta a entrega generosa encontraremos muitas difi­culdades para seguir a Jesus Cristo: «Desprende-te das criaturas até ficares despido delas. Porque — diz o Papa São Gregório — o demônio nada tem de seu neste mundo, e açode nu à contenda. Se vais, vestido, lutar com ele, em breve cairás por terra. Porque terá por onde apanhar-te»(Caminho, n° 149).

04.09.2015 – Lc5, 33-39

33Disseram-Lhe eles: Os discípulos de João jejuam muita vez e recitam orações; o jejum mesmo fazem também os dos Fariseus. Os Teus, porém, comem e bebem! 34Mas Jesus respondeu-lhes: Podeis vós fazer jejuar os companheiros do noivo, enquanto o noivo está com eles? 35Lá virão dias!… e, quando o noivo lhes for tirado, então, nesses dias, hão-de jejuar. 36Disse-lhes também uma parábola: Ninguém recorta um remendo de vestido novo para o deitar em vestido velho. Aliás, não só rasga o novo, mas também não se ajustará ao velho o remendo que vem do novo. 37Nem ninguém deita vinho novo em odres velhos. Aliás, o vinho novo romperá os odres, derramar-se-á, e os odres ficarão estragados. 38Mas deve deitar-se vinho novo em odres novos. 39E ninguém que bebeu do velho quer do novo, pois diz: «Ó velho é que é bom!»

Comentário

33-35. No Antigo Testamento estavam prescritos por Deus alguns dias de jejum; o mais assinalado era o «dia da expiação» (Num 29,7; Act 27,9). Por jejum costuma enten­der-se a abstenção, total ou parcial, de comida ou de bebida, e assim o entendiam também os Judeus. Moisés e Elias tinham jejuado (Ex 34,28; 1Reg 19,8), e o próprio Senhor jejuaria no deserto durante quarenta dias, antes de começar o Seu ministério público. No passo que comentamos, Jesus Cristo dá também um sentido mais profundo do jejum: a privação da Sua presença física, que os Apóstolos sofrerão depois da morte. O Senhor ia preparando os discípulos durante a Sua vida pública para a separação definitiva. Ao começo os Apóstolos não eram ainda fortes, e era mais conveniente que fossem consolados com a presença corporal de Cristo do que exercitados com a austeridade do jejum. Também os cristãos devem privar-se por vezes do ali­mento: «Jejuar e abster-se de comer carne quando o manda a Santa Madre Igreja» (Catecismo Maior, n° 495). Este é o objecto do quarto mandamento da Igreja. Mas, além disso, num sentido mais profundo, como diz São Leão Magno: «O mérito dos nossos jejuns não consiste somente na absti­nência dos alimentos; de nada serve tirar ao corpo a sua nutrição se a alma não se afasta da iniquidade e se a língua não deixa de falar mal» (Sermo IV in Quadragesima).

05.09.2015 – Lc6, 1-5

Passando Jesus, a um sábado, através dumas searas, puseram-se os Seus discípulos a arrancar e a comer espigas, esfre­gando-as com as mãos. 2Disseram alguns dos Fariseus: Porque fazeis o que não é permitido fazer ao sábado? 3Disse-lhes Jesus, em resposta: Nem sequer lestes o que fez David, quando teve fome, ele e os que estavam com ele? 4Como entrou na casa de Deus e, tomando os pães da proposição, deles comeu e deu aos companheiros, esses pães que só aos sacerdotes é permitido comer? 5E foi-lhes dizendo: O Filho do homem é senhor até do sábado.

6Noutro sábado, entrou na sinagoga e pôs-Se a ensinar. Estava lá um homem que tinha a mão direita ressequida. 7Ora os Escribas e os Fariseus observavam-No de perto, para verem se Ele realizaria uma cura ao sábado, a fim de acharem com que acusá-Lo. 8Mas Ele conhecia-lhes os pensa­mentos. Disse então ao homem que tinha a mão ressequida: Levanta-te e põe-te de pé, aí no meio. Este levantou-se e ficou de pé. 9Disse-lhes Jesus: Pergunto-vos se é permi­tido, ao sábado, fazer bem ou fazer mal, salvar a vida ou tirá-la? 10E, olhando-os a todos em volta, disse ao homem: Estende a mão, Ele estendeu-a, e a mão ficou-lhe curada. 11Eles encheram-se de fúria e come­çaram a falar entre si do que haviam de fazer a Jesus.

12Nesses dias, saiu Ele em direcção ao monte, para fazer oração, e passou a noite a orar a Deus. 13Ao amanhecer, chamou os discípulos e escolheu doze entre eles, aos quais deu precisamente o nome de Após­tolos: 14Simão, a quem deu também o nome de Pedro, e André, irmão deste; Tiago e João; Filipe e Bartolomeu; 15Mateus e Tome; Tiago, filho de Alfeu, e Simão, que era chamado Zeloso; 16Judas, irmão de Tiago, e Judas Iscariotes, que veio a ser o traidor.

Comentário

1-5. Diante da acusação dos fariseus, Jesus explica o sentido correcto do descanso sabático, invocando um exemplo do Antigo Testamento. Além disso, ao declarar-Se «Senhor do sábado» manifesta abertamente que Ele é o próprio Deus que deu o preceito ao povo de Israel. Para uma explicação mais ampla, vejam-se as notas a Mt 12,2 e 12,3-8.

10. Os Santos Padres ensinam-nos a descobrir um pro­fundo sentido espiritual mesmo naquelas palavras do Senhor que podem parecer irrelevantes à primeira vista. Assim, Santo Ambrósio comenta a frase «estende a mão»: «Este remédio é comum e geral (…).Estende-a muitas vezes, favorecendo o teu próximo; defende de qualquer injúria a quem vejas sofrer sob o peso da calúnia, estende também a tua mão ao pobre que te pede; estende-a também ao Senhor pedindo-Lhe o perdão dos teus pecados: é assim como se deve estender a mão, e é assim como se cura»(ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.).

11. Perante a pergunta do Senhor os fariseus não que­rem responder, e diante do milagre que realiza depois não sabem que dizer. Deveriam ter-se convertido, mas o seu coração ofusca-se e enche-se de inveja e de furor. Depois, aqueles que não tinham falado diante do Senhor começam a dialogar entre si, não para se aproximarem de Cristo mas para O perder. Neste sentido comenta São Cirilo: «Oh fa­riseu!,vês O que faz coisas prodigiosas e cura os doentes em virtude de um poder superior e tu projectas a Sua morte por inveja» (Commentarium in Lucam, ad loc.).

12-13. Com certa solenidade o Evangelista relata a trans­cendência deste momento em que Jesus constitui os Doze em Colégio Apostólico: «O Senhor Jesus, depois de ter orado ao Pai, chamando a Si os que Ele quis, elegeu doze para estarem com Ele e para os enviar a pregar o Reino de Deus (cfr Mc3,13-19; Mt 10,1-42): e a estes Apóstolos constituiu-os em colégio ou grupo estável e deu-lhes como chefe a Pedro, escolhido de entre eles (cfrIoh 21,17). Enviou-os primeiro aos filhos de Israel e, depois, a todos os povos, para que, participando do Seu poder, fizessem de todas as gentes discípulos seus e as santificassem e governassem (cfrMt 28,16-20 e par J e deste modo propagassem e apascentassem a Igreja, servindo-a, sob a direcção do Senhor, todos os dias até ao fim dos tempos (cfrMt 28,20). No dia de Pentecostes, foram plenamente confirmados nesta missão (cfrAct 2,1-36) (…). Os Apóstolos, pois, pregando por toda a parte o Evangelho (cfr Mc 16,20), recebido pelos ouvintes graças à acção do Espírito Santo, reúnem a Igreja universal que o Senhor fundou sobre os Apóstolos e levantou sobre o bem-aventurado Pedro seu chefe, sendo Jesus Cristo a suma pedra angular (cfrApc 21,14; Mt 16,18; Eph 2,20). A missão divina confiada por Cristo aos Apóstolos durará até ao fim dos tempos (cfrMt 28,20), uma vez que o Evangelho que eles devem anunciar é em todo o tempo o princípio de toda a vida na Igreja; pelo que os Apóstolos trataram de estabelecer sucessores, nesta sociedade hierarquicamente constituída» (Lumen gentium, nn. 19-20).

Jesus Cristo, antes de instituir o Colégio Apostólico, passou toda a noite em oração. É uma oração que Cristo faz pela Sua Igreja como tantas outras vezes (Lc 9,18; Ioh 17,1 ss.). Deste modo, o Senhor prepara os Seus Apóstolos, colunas da Igreja (cfr Gal 2,9). Próximo da Paixão, rogará ao Pai por Simão Pedro como cabeça da Igreja, e assim lho manifestará de um modo solene: «Mas Eu roguei por ti para que não desfaleça a tua fé» (Lc 22,32). A Igreja, seguindo o exemplo de Cristo, dispõe que na oração litúrgica se elevem preces em muitas ocasiões pelos pastores da Igreja: Romano Pontífice, Bispos e sacerdotes; pedindo a graça de Deus para que possam cumprir fielmente o seu ministério.

São contínuos os ensinamentos de Cristo de que temos de orar sempre (Lc 18,1). Nesta ocasião mostra-nos com o Seu exemplo que ,nos momentos importantes da nossa vida de­vemos orar com especial intensidade. «’Pernoctans in oratione Dei’» — passou a noite em oração. — É o que São Lucas nos diz do Senhor.

«Tu, quantas vezes perseveraste assim? — Então…?» (Ca­minho, n° 104).

Sobre a conveniência e as qualidades da oração do cristão, vejam-se as notas a Mt 6,5-6; 7,7-11; 14,22-23; Mc 1,35; Lc 5,16; 11,1-4; 18,1; 22,41-42.

12. Como é que Jesus Cristo, sendo Deus, faz oração?: Em Cristo há duas vontades, uma divina e outra humana (cfrCatecismo Maior, n.° 91), e ainda que pela Sua vontade divina era omnipotente, não assim pela Sua vontade humana. O que fazemos na oração de petição é manifestar a nossa vontade diante de Deus, e por isso Cristo, semelhante em tudo a nós menos no pecado (Heb 4,15), devia orar também como homem (cfrSuma Teológica, III, q. 21, a. 1). Ao con­templar Jesus em oração. Santo Ambrósio comenta: «O Se­nhor ora não para pedir por Ele, mas para interceder em meu favor; pois ainda que o Pai tenha posto todas as coisas à disposição do Filho, contudo o Filho, para realizar plena­mente a Sua condição de homem, julga oportuno implorar ao Pai por nós, pois Ele é o nosso Advogado (…). Mestre de obediência, instrui-nos com o Seu exemplo nos preceitos da virtude: ‘Temos um Advogado diante do Pai’ (1Ioh 2,1)» (ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.).

06.09.2015 – Mc 7, 31-37

31Deixando novamente a região de Tiro, veio por Sidónia, para o mar da Galileia, através do território da Decápole. 32Trazem-Lhe um surdo-tartamudo e pedem-Lhe que lhe imponha as mãos. 33E Ele, tomando-o consigo aparte, longe da multidão, meteu-lhe os dedos nos ouvidos e com a saliva tocou-lhe a língua. 34Depois, levantando os olhos ao céu, suspirou e disse-lhe: Effathá! — isto é — Abre-te! 35E imediatamente se lhe abriram os ouvidos e se desatou a prisão da língua e falava expeditamente. Ele mandou-lhes que o não contassem a ninguém. 36Mas quanto mais lho mandava, tanto mais eles o apregoavam 37e, fora de si de espanto, diziam: Tudo faz bem: faz ouvir os surdos e falar os mudos.

Comentário

32-33. Com alguma frequência aparece na Sagrada Escritura a imposição das mãos como gesto para transmitir poderes ou bênçãos (cfrGen 48,14ss.; 2Reg 5.11; Lc 13,13). De todos é conhecido que a saliva tem certa eficácia para aliviar feridas leves. Os dedos simbolizavam na linguagem da Revelação uma acção divina poderosa (cfrEx 8,19; Ps 8,4; Lc 11,20). Jesus, pois, emprega sinais que têm uma certaconaturalidade em relação com o efeito que se pretende produzir, ainda que, como vemos pelo texto, o efeito — a cura imediata do surdo-mudo — exceda completamente o sinal empregado.

No milagre do surdo-tartamudo podemos encontrar, além disso, uma imagem da actuação de Deus nas almas: para crer é necessário que Deus abra o nosso coração a fim de que possamos escutar a Sua palavra. Depois, como os Apóstolos, poderemos anunciar com a nossa língua as magnalia Dei, as grandezas divinas (cfrAct 2,11). Na Liturgia da Igreja (cfr o hino VeniCreator) o Espírito Santo é comparado ao dedo da mão direita de Deus Pai (Digituspaternaedexterae). O Consolador realiza nas nossas almas, na ordem sobrenatural, efeitos comparáveis aos que Cristo realizou no corpo do surdo-tartamudo.

07.09.2015 – Lc6, 6-11

6Noutro sábado, entrou na sinagoga e pôs-Se a ensinar. Estava lá um homem que tinha a mão direita ressequida. 7Ora os Escribas e os Fariseus observavam-No de perto, para verem se Ele realizaria uma cura ao sábado, a fim de acharem com que acusá-Lo. 8Mas Ele conhecia-lhes os pensa­mentos. Disse então ao homem que tinha a mão ressequida: Levanta-te e põe-te de pé, aí no meio. Este levantou-se e ficou de pé. 9Disse-lhes Jesus: Pergunto-vos se é permi­tido, ao sábado, fazer bem ou fazer mal, salvar a vida ou tirá-la? 10E, olhando-os a todos em volta, disse ao homem: Estende a mão, Ele estendeu-a, e a mão ficou-lhe curada. 11Eles encheram-se de fúria e come­çaram a falar entre si do que haviam de fazer a Jesus.

Comentário

10. Os Santos Padres ensinam-nos a descobrir um pro­fundo sentido espiritual mesmo naquelas palavras do Senhor que podem parecer irrelevantes à primeira vista. Assim, Santo Ambrósio comenta a frase «estende a mão»: «Este remédio é comum e geral (…).Estende-a muitas vezes, favorecendo o teu próximo; defende de qualquer injúria a quem vejas sofrer sob o peso da calúnia, estende também a tua mão ao pobre que te pede; estende-a também ao Senhor pedindo-Lhe o perdão dos teus pecados: é assim como se deve estender a mão, e é assim como se cura»(ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.).

11. Perante a pergunta do Senhor os fariseus não que­rem responder, e diante do milagre que realiza depois não sabem que dizer. Deveriam ter-se convertido, mas o seu coração ofusca-se e enche-se de inveja e de furor. Depois, aqueles que não tinham falado diante do Senhor começam a dialogar entre si, não para se aproximarem de Cristo mas para O perder. Neste sentido comenta São Cirilo: «Oh fa­riseu!,vês O que faz coisas prodigiosas e cura os doentes em virtude de um poder superior e tu projectas a Sua morte por inveja» (Commentarium in Lucam, ad loc.).

08.09.2015 – Mt 1, 1-16.18-23

Genealogia de Jesus Cristo, filho de Genealogia David, filho de Abraão.

2Abraão gerou a Isaac, Isaac gerou a Jacob, Jacob gerou a Judas e seus irmãos. 3Judas gerou a Fares e a Zara, de Tamar. Fares gerou a Esron, Esron gerou a Arão. 4Arão gerou a Aminabad, Aminabad gerou a Naásson, Naásson gerou a Salmon. 5Salmon gerou a Booz, de Raab. Booz gerou a Obed, de Rute. Obed gerou a Jessé, Jessé gerou a el-rei David.

6David gerou a Salomão, da que fora mulher de Urias. 7Salomão gerou a Roboão, Roboão gerou a Abias, Abias gerou a Asa. 8Asa gerou a Josafá, Josafá gerou a Jorão; Joráo gerou a Ozias. 9Ozias gerou a Joatã, Joatã gerou a Acaz, Acaz gerou a Ezequias. 10Ezequias gerou a Manasses, Manasses gerou a Amos, Amos gerou a Josias. 11Josias gerou a Jeconias e seus irmãos, no tempo da deportação para Babilônia.

12Depois da deportação para Babilônia, Jeconias gerou a Salatiel, Salatiel gerou a Zorobabel. 13Zorobabel gerou a Abiud, Abiud gerou a Eliacim, Eliacim gerou a Azor. 14Azor gerou a Sadoc, Sadoc gerou a Aquim, Aquim gerou a Eliud. 15Eliud gerou a Eléazar, Eléazar gerou a Mata, Mata gerou a Jacob. 16Jacob gerou a José, o esposo de Maria da qual nasceu Jesus, que se chama Cristo.

18Ora o nascimento de Jesus foi assim: Estando Maria, sua Mãe, desposada com José, antes de morarem juntos, notou-se que tinha concebido por virtude do Espírito Santo. 19José, seu esposo, como era justo e não a queria infamar, resolveu deixá-la secretamente. 20Mas, andando ele com este pensamento, apareceu-lhe, em sonhos, um anjo do Senhor, que lhe disse:

— José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que nela se gerou, é obra do Espírito Santo. 2lEla dará à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus, porque Ele salvará o seu povo dos seus pecados.

22Ora tudo isto aconteceu para se cumprir o que o Senhor tinha anunciado pelo profeta, que disse: 23«Eis que uma Virgem conceberá e dará à luz um filho, a quem será dado o nome de Emanuel», que quer dizer «Deus connosco».

Comentário

1. Este versículo vem a ser como que o título de todo o Evangelho. Em Jesus Cristo cumprem-se as promessas divinas de salvação feitas a Abraão em favor de toda a humanidade (Gen 12,3). Igualmente se cumpre a profecia de um reino eterno dada por meio do profeta Natan ao rei David (2Sam 7, 12-16).

A genealogia que introduz São Mateus, no começo do seu Evangelho, mostra a ascendência de Jesus Cristo segundo a Sua humanidade, ao mesmo tempo que dá uma indicação da plenitude a que chega a História da Salvação com a Encarnação do Filho de Deus, por obra do Espírito Santo. Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, é o Messias esperado.

A genealogia está apresentada segundo uma estrutura de três grupos. Cada grupo consta de catorze elos que mostram o desenvolvimento progressivo da história sagrada.

Entre os Judeus (como entre outros povos orientais de origem nômada) a árvore genealógica tinha uma importância capital. Há que ter em conta que, precisamente por essa origem seminômade, a identidade de uma pessoa estava especialmente ligada à família e tribo, sendo menos signifi­cativo o lugar. No povo hebreu a essas circunstâncias acrescentava-se o significado religioso de pertencer pelo sangue ao povo eleito.

Ainda na época de Jesus a árvore genealógica se conservava nas famílias judaicas com todo o cuidado, pois segundo essa árvore as pessoas constituíam-se em sujeitos de direitos e obrigações.

6. Nas genealogias nomeiam-se quatro mulheres: Tamar (cfrGen 38; 1Chr 2,4), Rahab (cfrIos 2; 6, 17), Betsabé (cfr 2Sam 11; 12,24) e Rut (cfr livro de Rut). Estas quatro mulheres estrangeiras, que de um ou outro modo se incorporamna história de Israel, são um símbolo, entre muitos outros, da salvação divina que abarca toda a humanidade.

Ao citar também outros personagens pecadores, mostra-se como os caminhos de Deus são diferentes dos caminhos humanos. Através de homens cujo comportamento não foi recto Deus vai realizar os Seus planos de salvação. Ele salva-nos, santifica-nos e escolhe-nos para fazer o bem, apesar dos nossos pecados e infidelidades. Tal é o realismo que Deus quis fazer constar na história da nossa salvação.

11. Sobre a deportação para Babilônia fala-se em 2Reg 24-25. Com este facto cumpre-se a ameaça dos profetas ao povo de Israel e aos seus reis, como castigo da sua infidelidade aos mandamentos da Lei de Deus, especialmente ao primeiro.

16. Entre os Hebreus as genealogias faziam-se por via masculina. José, como esposo de Maria, era o pai legal de Jesus. A figura do pai legal é equivalente quanto a direitos e obrigações à do verdadeiro pai. Neste facto se fundamenta solidamente a doutrina e a devoção ao Santo Patriarca como padroeiro universal da Igreja, visto que foi escolhido para desempenhar uma função muito singular no plano divino da nossa salvação: pela paternidade legal de São José é Jesus Cristo Messias descendente de David.

Do costume ordinário de celebrar os desposórios entre os membros de uma mesma estirpe, deduz-se que Maria pertencia à casa de David. Neste sentido falam também antigos Padres da Igreja. Assim Santo Inácio de Antioquia, Santo Ireneu, São Justino e Tertuliano, os quais fundamentam o seu testemunho numa tradição oral constante.

É de assinalar que São Mateus, para indicar o nascimento de Jesus, usa uma fórmula completamente diversa da aplicada aos demais personagens da genealogia. Com estas palavras o texto ensina positivamente a conceição virginal de Jesus, sem intervenção de varão.

18. São Mateus narra aqui como foi a conceição de Cristo (cfrLc 1, 25-38): «(…) verdadeiramente celebramos e veneramos por Mãe de Deus (Maria), por ter dado à luz uma pessoa que é juntamente Deus e homem (…)» (Catecismo Romano, l, 4, 7).

Segundo as disposições da Lei de Moisés, aproxima­damente um ano antes do casamento realizavam-se os desposórios. Estes tinham praticamente já o valor jurídico do matrimônio. O casamento propriamente dito consistia, entre outras cerimônias, na condução solene e festiva da esposa para casa do esposo (cfrDt 20,7).

Já desde os desposórios era preciso o libelo de repúdio, no caso de ruptura das relações.

Todo o relato do nascimento de Jesus ensina através do cumprimento da profecia de Isaías 7, 14 (que citará expres­samente nos versículos 22-23): 1° Jesus é descendente de David pela via legal de José; 2° Maria é a Virgem que dá à luz segundo a profecia; 3° o caracter miraculoso da con­ceição do Menino sem intervenção de varão.

19. «José era efectivamente um homem corrente, em quem Deus confiou para operar coisas grandes. Soube viver, tal como o Senhor queria, todos e cada um dos aconteci­mentos que compuseram a sua vida. Por isso, a Escritura Santa louva José, afirmando que era justo. E, na linguagem hebraica, justo quer dizer piedoso, servidor irrepreensível de Deus, cumpridor da Vontade divina (cfrGen 7,1; 23-32; Ez 18,5 ss; Prv 12, 10); outras vezes significa bom e caritativo com o próximo (cfrTob 7,6; 9,6). Numa palavra, o justo é o que ama a Deus e demonstra esse amor, cumprindo os Seus mandamentos e orientando toda a sua vida ao serviço dos irmãos, os outros homens»(Cristo que passa, n° 40).

José considerava santa a sua esposa não obstante os sinais da sua maternidade. Por isso se encontrava perante uma situação inexplicável para ele. Procurando precisamente actuar de acordo com a vontade de Deus sentia-se obrigado a repudiá-la, mas, com o fim de evitar a infâmia pública de Maria, decide deixá-la privadamente.

É admirável o silêncio de Maria. A sua entrega perfeita a Deus leva-a inclusivamente a não defender a sua honra e a sua inocência. Prefere que caia sobre Ela a suspeita e a infâmia, a manifestar o profundo mistério da Graça. Perante um facto inexplicável por razões humanas, abandona-se confiadamente no amor e providência de Deus.

Devemos contemplar a magnitude da prova a que Deus submeteu estas duas almas santas: José e Maria. Não nos pode causar estranheza que também nós sejamos submetidos por vezes, ao longo da vida, a provas duras; nelas temos de confiar em Deus e permanecer-Lhe fiéis, a exemplo de José e Maria.

20. Deus ilumina oportunamente o homem que actua com rectidão e confia no poder e sabedoria divina, perante situações que superam a compreensão da razão humana. O anjo recorda neste momento a José, ao chamar-lhe filho de David, que é o elo providencial que une Jesus com a estirpe de David, segundo a profecia messiânica de Natan (cfr2Sam 7, 12). Corno diz São João Crisóstomo: «Antes de mais recorda-lhe David, de quem tinha de vir Cristo, e não lhe consente estar perturbado desde o momento que, pelo nome do mais glorioso dos seus antepassados, lhe traz à memória a promessa feita a toda a sua linhagem » (Hom. sobre S. Mateus, 4).

«Jesus Cristo, único Senhor, nosso, Filho de Deus, quando tomou por nós carne humana no ventre da Virgem, foi con­cebido não por obra de varão, como os outros homens, mas, sobre toda a ordem natural, por virtude do Espírito Santo; de tal maneira que a mesma pessoa (do Verbo), permanecendo Deus, como o era desde a eternidade, se fizesse homem, o qual não era antes» (Catecismo Romano, 1,4,1).

21. Segundo a raiz hebraica, o nome de Jesus significa «salvador». Depois da Virgem Santa Maria, José é o primeiro homem que recebe esta declaração divina do facto da salvação, que já se estava a realizar.

«Jesus é o nome exclusivo do que é Deus e homem, o qual significa salvador, imposto a Cristo não casualmente nem por ditame ou disposição humana, mas por conselho e mandato de Deus.

(…) Os nomes profetizados (… o Admirável, o Conselheiro, Deus, o Forte, o Pai do século vindouro, o Príncipe da paz, cfrIs 9, 6), que se deviam dar por disposição divina ao Filho de Deus, resumem-se no nome de Jesus, porque, enquanto os outros se referem apenas sob algum aspecto à salvação que nos devia dar, este compendiou em si mesmo a realidade e a causa da salvação de todos os homens» (Catecismo Romano I, 3, 5 e 6).

23. «Emanuel»: A profecia de Isaías 7, 14 citada neste versículo, preanunciava, já desde há uns sete séculos, que o sinal da salvação divina ia ser o acontecimento extraor­dinário de uma virgem que vai dar à luz um filho. O Evan­gelho revela-nos, pois, neste passo duas verdades:

A primeira que, na verdade, Jesus é o Deus connosco preanunciado pelo profeta. Assim o sentiu sempre a tradição cristã. Inclusivamente o Magistério da Igreja (no Breve Divinade Pio VI, 1779) condenou uma interpretação que negava o sentido messiânico do texto de Isaías. Cristo é, pois, verdadeiramente Deus connosco, não só pela Sua missão divina mas porque é Deus feito homem (cfrJo 1, 14).Não quer dizer que Jesus Cristo tenha de ser normalmente chamado Emanuel: este nome refere-se mais directamente ao Seu mistério de Verbo Encarnado. O anjo da anunciação indicou que Lhe fosse posto o nome de Jesus, que significa Salvador. Assim o fez São José.

A segunda verdade que nos revela o texto sagrado é que Santa Maria, em quem se cumpre a profecia de Is 7, 14, permanece virgem antes do parto e no próprio parto. Preci­samente o sinal miraculoso que dá Deus de que chegou a salvação é que uma mulher que é virgem, sem deixar de o ser, é também mãe.

«Jesus Cristo saiu do seio materno sem detrimento algum da virgindade de Sua Mãe; assim pois, com louvores merecidíssimos, celebramos a sua imaculada e perpétua virgindade. E isto em verdade operou-se por virtude do Espírito Santo, que tanto engrandeceu a Mãe na conceição e no nascimento do Filho, que lhe deu a ela fecundidade e conservou ao mesmo tempo a sua perpétua virgindade»(Catecismo Romano, 1,4,8).

09.09.2015 – Lc6, 20-26

20Erguendo os olhos para os Seus discípulos, pôs-Se a dizer: Felizes de vós, os pobres, porque é vosso o Reino de Deus.

21Felizes de vós, os que tendes agora fome, porque sereis saciados.

Felizes de vós, os que chorais agora, porque haveis de rir.

22Felizes sereis quando os homens vos odiarem, e quando vos rejeitarem, vos insul­tarem, e proscreverem o vosso nome como infame, por causa do Filho do homem. 23Alegrai-vos e exultai nesse dia, pois é grande no Céu a vossa recompensa. Desse modo, efectivamente, é que pro­cediam os pais deles com os falsos profetas.24Mas ai de vós, os ricos, porque recebeis a vossa consolação.

25Ai de vós, os que estais agora fartos, porque haveis de ter fome.

Ai de vós, os que rides agora, porque haveis de entristecer-vos e chorar.

26Ai de vós, quando todos os homens de vós disserem bem.

Comentário

20-26. As oito Bem-aventuranças que São Mateus apre­senta (5,3-12) oferece-as São Lucas resumidas em quatro, mas acompanhadas de quatro antíteses. Podemos dizer, com Santo Ambrósio, que as oito de Mateus estão compreendidas nas quatro de Lucas (cfrExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.). As expressões do texto de Lucas têm, por vezes, uma forma mais directa e incisiva que as do primeiro Evangelho, que são mais explicativas; por exemplo, a primeira bem-aventurança diz simplesmente «Felizes os pobres», en­quanto em Mateus se lê «Bem-aventurados os pobres em espírito», que constitui uma breve explicação do sentido da virtude da pobreza.

20. «Todo o cristão corrente tem que tornar compa­tíveis na sua vida dois aspectos que, à primeira vista, podem parecer contraditórios: pobreza real, que se note e que se toque — feita de coisas concretas — que seja uma profissão de fé em Deus, uma manifestação de que o coração não se satisfaz com coisas criadas, mas aspira ao Criador, que deseja encher-se do amor de Deus e depois dar a todos desse mesmo amor; e, ao mesmo tempo ser mais um entre os seus irmãos os homens, de cuja vida participa, com que se alegra, com quem colabora, amando o mundo e todas as coisas criadas para resolver os problemas da vida humana e para estabelecer o ambiente espiritual e material que facilite o desenvolvimento das pessoas e das comunidades.

«(…) O melhor exemplo de pobreza sempre foram esses pais e essas mães de família numerosa e pobre que se desfazem pelos seus filhos e que, com o seu esforço e cons­tância — muitas vezes sem voz para dizer a alguém que passam necessidades — mantêm os seus, criando um lar alegre em que todos aprendem a amar, a servir, a trabalhar» (Temas Actuais do Cristianismo, nos 110 e 111).

24-26. Com estas quatro exclamações condena o Ser aavareza e o apego aos bens do mundo; o excessivo cuida do corpo, a gula; a alegria néscia e a busca da própria complacência em tudo; a adulação, o aplauso e o afã desordenado de glória humana. Quatro tipos de vícios que são muito comuns no mundo, e diante dos quais o cristão deve estar vigilante para não se deixar arrastar por eles.

24.De modo semelhante a como no v. 20 se fala dos pobres referindo-se àquelas pessoas que amam a pobreza para agradar mais a Deus, assim, neste versículo, por ricos» há que entender aqueles que se afanam em acumular bens sem atender à liceidade ou iliceidade dos meios empregados, e que, além disso, põem nestas riquezas a sua felicidade, como se fossem o seu fim último. Pelo contrário, aqueles ricos que por herança ou através de um trabalho honrado abundam em bens são realmente pobres se não se apegam àesses bens, e como consequência desse desprendimento sabem empregá-los em benefício dos outros, segundo Deus lhes pede. Na Sagrada Escritura aparecem alguns personagens como Abraão, Isaac, Moisés, David e Job aos quais, mesmo possuindo muitas riquezas, se pode aplicar a bem-aventurança dos pobres.

Já em tempos de Santo Agostinho havia quem entendesse mal a pobreza e a riqueza, fazendo este raciocínio: o Reino dos Céus será dos pobres, dos Lázaros, dos famintos; os ricos são todos maus, como o rico avarento. Diante destas opiniões errôneas explica Santo Agostinho o sentido profundo da riqueza e da pobreza segundo o espírito evangélico: « Ouve-me, senhor pobre, sobre o que dizes. Quando te chamas a ti mesmo Lázaro, aquele santo varão chagado, temo que por soberba não sejas aquele que dizes. Não desprezes os ricos misericordiosos, os ricos humildes; ou, para o dizer em poucas palavras, não desprezes os que denominei ricos pobres. Oh pobre!,sé tu pobre também; pobre, ou seja, humilde (…). Ouve-me, pois. Sé verdadeiro pobre, sé piedoso, sé humilde; se te glorias dos teus andrajos e da tua pobreza ulcerosa, se te glorias de te assemelhares ao mendigo estendido junto da casa do rico, não reparas senão em que foi pobre e não te fixas em nada mais. Em que vou fixar-me?,dizes. Lê as Escrituras e entenderás o que te digo. Lázaro foi pobre, mas aquele para cujo seio foi levado era rico. ‘Sucedeu — está escrito — que morreu o pobre e foi levado pelos anjos ao seio de Abraão’. Para onde? Para o seio de Abraão, ou digamos, para o misterioso lugar onde repousava Abraão. Lê (…) e pondera como Abraão foi opulentíssimo na terra, onde teve em abundância prata, família, gados, fazenda; e, contudo, este rico foi pobre, pois foi humilde. ‘Creu Abraão em Deus, e foi-lhe contado como justiça’ (…) Era fiel, praticava o bem, recebeu o mandato de imolar o seu filho e não demorou a oferecer o que tinha recebido Àquele de Quem, o tinha recebido. Ficou provado aos olhos de Deus e posto como exemplo de fé»(Sermo14).

Em resumo, a pobreza não consiste em algo puramente exterior, em ter ou não ter bens materiais, mas em algo mais profundo que afecta o coração, o espírito do homem, consiste em ser humilde diante de Deus, em ser piedoso, em ter uma fé submissa. Se se possuem estas virtudes e, além disso, abundância de bens materiais, a atitude do cristão será de desprendimento, de caridade para com os outros homens, e assim agradar-se-á a Deus. Pelo contrário, o que não possui bens materiais abundantes nem por isso está justificado diante de Deus, se não se esforça por adquirir essas virtudes que constituem a verdadeira pobreza.

10.09.2102 – Lc6, 27-38

27Mas Eu digo-vos a vós que Me ouvis: Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, 28bendizei os que vos amaldi­çoam, rezai pelos que vos maltratam. 29Ao que te bate numa face oferece-lhe também a outra, e àquele que te leva a capa não lhe impeças de ficar também com a túnica. 30Dá a todo aquele que te pede, e ao que leva o que é teu não lho reclames. 31O que quiserdes que vos façam os homens, fazei-lho de igual modo vós também. 32Se amardes os que vos amam, que agradecimento vos é devido? Pois também os pecadores amam aqueles que os amam. 33Se fizerdes bem aos que bem vos fazem, que agradecimento vos é devido? Também os pecadores fazem o mesmo. 34E, se emprestardes àqueles de quem esperais receber, que agradecimento vos é devido? Também os pecadores em­prestam aos pecadores, a fim de receberem outro tanto. 35Mas vós, amai os vossos inimigos, fazei bem e emprestai, sem nada esperar em troca. Será grande assim a vossa recompensa e sereis filhos do Altíssimo, porque Ele é benigno para com os ingratos e os maus. 36Sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso. 37Não julgueis, e não sereis julgados. Não condeneis, e não sereis condenados. 38Absolvei, e sereis absolvidos. Dai, e dar-se-vos-á. Deitar-vos-ão no regaço uma boa medida, calcada, agitada, a transbordar, pois com a medida que empregardes vos será medido.

Comentário

27. «No facto de amarmos os nossos inimigos vê-se claramente certa semelhança com Deus Pai, que reconciliou consigo o gênero humano, que estava em inimizade com Ele e era contra Ele, redimindo-o da condenação eterna por meio da morte do Seu Filho (cfr Rom 5,8-10)» (Catecismo Romano, IV, 14,19). Seguindo o exemplo de Deus nosso Pai, devemos desejar para todos os homens — também para os que se declaram nossos inimigos — em primeiro lugar a vida eterna; depois, o cristão tem obrigação de respeitar e de compreender a todos sem excepção pela intrínseca dignidade da criatura humana, feita à imagem e semelhança do Criador.

28. Jesus Cristo ensinou-nos com o Seu exemplo que este preceito não é uma simples recomendação piedosa: estando já pregado na Cruz Jesus pediu a Seu Pai pelos que O tinham entregado: «Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem» (Lc 23,34). À imitação do Mestre, Santo Estêvão, o primeiro mártir da Igreja, no momento de ser lapidado pedia ao Senhor que não tivesse em conta o pecado dos seus inimigos (cfrAct 7,60). A Igreja, na Liturgia de Sexta Feira Santa, eleva a Deus orações e sufrágios pelos que estão fora da Igreja para que lhes dê a graça da fé, para que os que não conhecem a Deus saiam da sua ignorância; para que os Judeus recebam a luz da verdade; para que os não católicos. estreitados pelo laço da verdadeira caridade, se unam de novo à comunhão da Igreja nossa Mãe.

29. O Senhor continua a mostrar-nos como devemos comportar-nos para imitar a misericórdia de Deus. Em primeiro lugar põe-nos um exemplo para que exercitemos uma das obras de misericórdia que a tradição cristã chama espirituais: perdoar as injúrias e sofrer com paciência os defeitos do próximo. Isto é o que quer dizer, em primeiro lugar, a recomendação de apresentar a outra face a quem lhe bate numa.

Para captar bem esta recomendação, comenta São Tomás, «há que entender a Sagrada Escritura à luz do exemplo de Cristo e de outros santos. Cristo não apresentou a outra face ao ser esbofeteado em casa de Anás (Ioh 18,22-23) nem tão-pouco São Paulo quando, segundo nos contam os Actos dos Apóstolos, foi açoitado em Filipos (Act 16,22 ss.). Por isso, não há por que entender que Cristo tenha mandado à letra oferecer a outra face ao que te bate numa; mas isto deve entender-se quanto à disposição interior; ou seja, que se for necessário, devemos estar dispostos a que não se turve o nosso ânimo contra o que nos bate, e a estar preparados para suportar algo semelhante e inclusivamente mais. Assim fez o Senhor quando entregou o Seu corpo à morte»(Comentário sobre S. João, 18,37).

36. O modelo de misericórdia que Cristo nos propõe é o próprio Deus. D’Ele diz São Paulo: «Bendito seja Deus Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e Deus de toda a consolação, o qual nos consola em todas as nossas tribulações» (2Cor 1,3-4). «A primeira excelência que tem esta virtude — explica Frei Luís de Granada — é tornar os homens semelhantes a Deus, e semelhantes na coisa mais gloriosa que há n’Ele, que é na misericórdia (Lc 6,36).

Porque é certo que a maior perfeição que pode ter uma criatura é ser semelhante ao seu Criador: e quanto mais tiver desta semelhança, tanto mais perfeita será. E é certo também que uma das coisas que mais propriamente convém a Deus é a misericórdia, como o significa a Igreja naquela oração que diz: Senhor Deus, de quem é próprio ter misericórdia e perdoar. E diz ser isto próprio de Deus, porque assim como à criatura, enquanto criatura, pertence ser pobre e necessitada (epor isto a ela pertence receber e não dar), assim pelo contrário, como Deus é infinitamente rico e poderoso, só a Ele por excelência pertence dar e não receber, e por isto d ‘Ele é próprio ter misericórdia e perdoar» (Livro da oração e meditação, terceira parte, tratado terceiro).

O comportamento do cristão há-de seguir esta norma: compadecer-se das misérias alheias como se fossem próprias e procurar remediá-las. Neste mesmo sentido a nossa Santa Mãe a Igreja concretizou-nos uma série de obras de miseri­córdia tanto corporais (visitar e cuidar os doentes, dar de comer ao faminto, dar de beber ao sequioso…), como espirituais (ensinar aquele que não sabe, corrigir o que erra, perdoar as injúrias…) (cfr Catecismo Maior, nos 944-945). Também perante quem está no erro temos de ter com­preensão: «Este amor e benevolência de modo algum nos devem tornar indiferentes perante a verdade e o bem. Pelo contrário, é o próprio amor que incita os discípulos de Cristo a anunciar a todos a verdade salvadora. Mas deve distin­guir-se entre o erro, sempre de rejeitar, e aquele que erra, o qual conserva sempre a dignidade própria da pessoa, mesmo quando atingido por ideias religiosas falsas ou menos exactas. Só Deus é juiz e penetra os corações; por esse motivo, proibe-nos Ele de julgar da culpabilidade interna de qualquer pessoa»(Gaudium et spes, n. 28).

38. Lemos na Sagrada Escritura a generosidade da viúva de Sarepta, à qual Deus pediu que alimentasse o profeta Elias com o pouco que lhe restava; depois premiou a sua generosidade multiplicando-lhe a farinha e o azeite que tinha (1Reg 17,9 ss.). De maneira semelhante aquele menino que forneceu os cinco pães e os dois peixes, para que o Senhor os multiplicasse e alimentasse uma grande multidão (cfrIoh 6,9), é um exemplo vivo do que o Senhor faz quando entregamos o que temos, ainda que seja pouco.

Deus não Se deixa vencer em generosidade: «Vamos! Diz-Lhe com generosidade e como um menino: Que me irás dar quando me exiges ‘isso’?» (Caminho, n° 153). Por muito que demos a Deus nesta vida, mais nos dará o Senhor como prêmio na vida eterna paciência e com carinho os que erram. Mas a pessoa que tem no seu coração um tesouro de maldade faz exactamente o contrário: odeia os seus amigos, fala mal de quem o ama, e todas as outras coisas condenadas pelo Senhor»(In LucaeEvangeliumexpositio, II, 6).

11.09.2015 – Lc6, 39-42

39Disse-lhes também uma parábola: Pode um cego guiar a outro cego? Não cairão ambos nalguma cova?

40Não está o discípulo acima do mestre, mas todo o discípulo bem formado ficará como o seu mestre.

41Porque olhas para o argueiro que está no olho de teu irmão, e não reparas na trave que tens no teu? 42Como podes dizer a teu irmão: «irmão, deixa que eu extraia o argueiro que está no teu olho», tu que não vês a trave que tens no teu? Hipócrita, extrai primeiro a trave do teu olho, e então verás bem, para extraires o argueiro que está no olho de teu irmão.

Comentário

12.09.2015 – Lc6, 43-49

43De facto, não há árvore boa que dê mau fruto, nem tão-pouco árvore má que dê bom fruto, 44pois cada árvore se conhece pelo próprio fruto. Não se colhem,efectivamente, figos dos espinheiros, nem se apanham uvas duma silva. 45O homem bom, do bom tesoiro do seu coração, tira o que é bom, e o mau, do mau tesoiro, tira o que é mau, pois da abundância do coração é que fala a sua boca. 46Porque Me chamais: «Senhor, Senhor», e não fazeis o que Eu digo? 47Mostrar-vos-ei a quem é semelhante todo aquele que vem ter comigo, ouve as Minhas palavras e as põe em prática. 48É semelhante a um homem que, para construir uma casa, esca­vou, aprofundou e assentou os alicerces sobre a rocha. E, sobrevindo uma inundação, irrompeu a torrente contra aquela casa e não conseguiu abalá-la, por ter sido bem construída. 49Mas aquele que as ouve e as não põe em prática é semelhante a um homem que construiu uma casa sobre a terra, sem alicerces. Irrompeu a torrente contra ela, e logo ruiu. E foi grande o desmoronamento daquela casa.

Comentário

46. Jesus pede que o nosso comportamento seja coerente com a condição de cristãos e que não haja separação entre a fé que professamos e a nossa forma de viver: «Não está o negócio em ter hábito de religião ou não; mas em procurar exercitar as virtudes e submeter a nossa vontade à de Deus em tudo e que o concerto da nossa vida seja o que Sua Majestade ordenar dela, e não queiramos nós que se faça a nossa vontade, mas a Sua» (Moradas, moradas terceiras, cap. 2, n° 6).

 

13.09.2015 – Mc 8, 27-35

27Partiu dali Jesus com os discípulos para as aldeias de Cesareia de Filipe e, no caminho, perguntava aos discípulos: Quem dizem os homens que Eu sou? 28Responderam-Lhe eles: João Baptista, outros Elias, outros que um dos profetas. 29E Ele perguntou-lhes: E vós quem dizeis que Eu sou? Respondeu Pedro e disse-Lhe: Tu és o Cristo. 30E Ele intimou-lhes que não dissessem nada d’Ele a ninguém.

31E começou a ensinar-lhes que o Filho do homem tinha de padecer muito, e ser rejei­tado pelos Anciãos e Príncipes dos sacerdotes e Escribas, e ser morto, e ressuscitar depois de três dias. 32Falava com toda a clareza. Então Pedro, tomando-O à parte, começou a estranhar-Lho. 33Voltou-Se Ele e, olhando para os discípulos, repreendeu a Pedro, dizendo: Tira-te de diante de Mim, satanás, pois não aprecias as coisas de Deus, mas só as dos homens.

34E, chamando o povo com os Seus discí­pulos, disse-lhes: Se alguém quer vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. 35Porque quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por causa de Mim e do Evangelho, salvá-la-á.

Comentário

29. A profissão de fé de Pedro é relatada aqui de uma maneira mais breve que em Mt 16,18-19. Pedro parece limi­tar-se a afirmar que Jesus é o Cristo, o Messias. Já Eusébio de Cesareia, no s. IV, explicava a sobriedade do Evangelista pela sua condição de intérprete de São Pedro, que na sua pregação costumava omitir tudo o que pudesse aparecer como louvor próprio. O Espírito Santo, ao inspirar São Marcos, quis que ficasse reflectida no seu Evangelho a pregação do Príncipe dos Apóstolos, deixando para outros Evangelhos o completar alguns pormenores importantes do mesmo epi­sódio da confissão de Pedro nos confins de Cesareia de Filipe.

Dentro da simplicidade do relato fica claro o papel de Pedro: adianta-se a todos os outros afirmando o messianismo de Jesus. Esta pergunta do Senhor, «e vós, quem dizeis que Eu sou?», assinala o que Jesus pede aos Apóstolos: não uma opinião, mais ou menos-favorável, mas a firmeza da fé. São Pedro é quem manifesta esta fé (cfr a nota a Mt 16,13-20).

31-33. Esta é a primeira ocasião em que Jesus anuncia aos discípulos os sofrimentos e a morte que terá de padecer. Mais tarde fá-lo-á outras duas vezes (cfr Mc 9,31 e 10,32). Perante esta revelação os Apóstolos ficam surpreendidos, porque não podem nem querem compreender que o Messias tenha de passar pelo sofrimento e pela morte, e muito menos que isto Lhe seja imposto «pelos Anciãos e Príncipes dos sacerdotes e Escribas». Pedro, com a sua espontaneidade habitual, levanta imediatamente um protesto. E Jesus res­ponde-lhe usando as mesmas palavras que dirigiu ao diabo quando este O tentou (cfr Mt 4,10) para afirmar/uma vez mais, que a Sua missão não é terrena mas espiritual, e que por isso não pode ser compreendida com meros critérios humanos, mas segundo os desígnios de Deus. Estes eram que Jesus Cristo nos redimisse mediante a Sua Paixão e Morte. Por sua vez, o sofrimento do cristão, unido ao de Cristo, é também meio de salvação.

34. Quando Jesus disse «se alguém quer vir após Mim…», tinha presente que o cumprimento da Sua missão O levaria à morte de cruz; por isso fala claramente da Sua Paixão (vv. 31-32). Mas também a vida cristã, vivida como se deve viver, com todas as suas exigências, é uma cruz que se deve levar em seguimento de Cristo.

As palavras de Jesus, que devem ter parecido assusta­doras àqueles que as escutavam, dão a medida do que Cristo exige para O seguir. Jesus não pede um entusiasmo passa­geiro, nem uma dedicação momentânea; o que pede é a renúncia de si mesmo, o carregar cada um com a sua cruz e o segui-Lo, Porque a meta que o Senhor quer para os homens é a vida eterna. Todo este passo evangélico está contem­plando precisamente o destino eterno do homem. À luz dessa vida eterna é que deve ser avaliada a vida presente: esta não tem um caracter definitivo nem absoluto, mas é transitória, relativa; é um meio para conseguir aquela vida definitiva do Céu. «Tudo isso, que te preocupa de momento, é mais ou menos importante. — O que importa acima de tudo é que sejas feliz, que te salves»(Caminho, n° 297).

«Há no ambiente uma espécie de medo da Cruz, da Cruz do Senhor. Tudo porque começaram a chamar cruzes a todas as coisas desagradáveis que acontecem na vida, e não sabem aceitá-las com sentido de filhos de Deus, com visão sobrenatural. Até tiram as cruzes que os nossos avós levan­taram nos caminhos!…

«Na Paixão, a Cruz deixou de ser símbolo de castigo para se converter em sinal de vitória. A Cruz é o emblema do Redentor, in quo est salus, vitaetresurrectionostra, ali está a nossa salvação, a nossa vida e a nossa ressurreição» (Via Sacra, II, n° 5).

35. «Vida»; O texto original e a Neo-vulgatadizem literalmente «alma». Mas neste, como noutros muitos casos, «alma» e «vida» são equivalentes. A palavra «vida» é empregada, como é claro, num duplo significado: vida terrena e vida eterna, a vida do homem aqui na terra, e a felicidade eterna do homem no Céu. A morte pode pôr fim à vida terrena, mas não pode destruir a vida eterna (cfr Mt 10,28), a vida que só pode dar Aquele que vivifica os mortos.

Entendido isto capta-se bem o sentido paradoxal da frase do Senhor: quem quiser salvar a sua vida (terrena), perderá a sua vida (eterna). Mas quem perder a sua vida (terrena) por Mim e pelo Evangelho, salvá-la-á (a eterna). Que significa, pois, salvar a vida (terrena)? Significa viver esta vida como se tudo acabasse aqui na terra: deixando-se dominar pela concupiscência da carne, pela concupiscência dos olhos, e pela soberba da vida (cfr 1Ioh2,16). Por contraposição, compreende-se bem que significa «perder a vida» (terrena): fazer morrer, por meio de uma luta ascética continuada, aquela tripla concupiscência — isto é tomar sobre si a cruz (v. 34) — e viver, por conseguinte, buscando e saboreando as coisas que são de Deus e não as da terra (cfrCol 3,1-2).

14.09.2015 – Jo3, 13-17

13Ninguém subiu ao Céu, a não ser Aquele que do Céu desceu, o Filho do homem. 14Do mesmo modo que Moisés elevou a serpente no deserto, assim tem de ser elevado o Filho do homem, 15para que todo aquele que acredita tenha, por Ele, a vida eterna.

16De facto, Deus amou de tal maneira o mundo que deu o Seu Filho único, para que todo o que n’Ele acredita náo pereça, mas tenha a vida eterna. 17É que Deus não enviou o Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para o mundo ser salvo por Seu inter­médio.

Comentário

13. Afirmação solene da divindade de Jesus. Ninguém sobe ao Céu e, portanto, ninguém pode conhecer perfeita­mente os segredos de Deus, senão o próprio Deus que en­carnou e desceu do Céu: Jesus, segunda Pessoa da Santíssima Trindade, o Filho do Homem profetizado no Antigo Testa­mento (cfrDn 7,13), ao qual foi concedido senhorio eterno sobre todos os povos, nações e línguas.

Ao encarnar o Verbo não deixa de ser Deus. E assim, ainda que esteja na terra enquanto homem, nem por isso deixa de estar no Céu enquanto Deus. Só depois da Ressur­reição e da Ascensão, Jesus Cristo está no Céu também enquanto homem.

14-15. A serpente de bronze, alçada por Moisés num mastro, era o remédio indicado por Deus para curar aqueles que eram mordidos pelas serpentes venenosas do deserto (cfr Num 21,8-9). Jesus Cristo compara este facto com a Sua Crucifixão, para explicar assim o valor da Sua exaltação na Cruz, que é salvação para todos os que O fixem com fé. Neste sentido podemos dizer que no bom ladrão se cumpre já o poder salvífico de Cristo na Cruz: esse homem descobriu no Crucificado o Rei de Israel, o Messias, que imediatamente lhe promete o Paraíso para aquele mesmo dia (cfrLc 23,39-43).

O Filho de Deus tomou a nossa natureza humana para dar a conhecer os mistérios ocultos da vida divina (cfr Mc 4,11; Ioh 1,18; 3,1-13; Eph 3,9) e para livrar do pecado e da morte aqueles que O fixem com fé e amor (cfrIoh 19,37; Gal 3,1) e aceitem a cruz de cada dia.

A fé de que nos fala o Senhor não se reduz simplesmente à aceitação intelectual das verdades que Ele nos ensinou, mas inclui reconhecê-Lo como Filho de Deus (cfr1Ioh 5,1), parti­cipar da Sua própria Vida (cfrIoh 1,12), e entregarmo-nos por amor, tornando-nos assim semelhantes a Ele (cfrIoh 10,27; 1Ioh 3,2). Mas esta fé constitui um dom de Deus (cfrIoh 3, 3.5-8), a quem devemos pedir que a fortaleça e acres­cente, como fizeram os Apóstolos: Senhor, «aumenta-nos a fé» (Lc 17,5). Sendo a fé um dom divino, sobrenatural e gratuito, é, ao mesmo tempo, uma virtude, um hábito bom, susceptível de ser exercitado pessoalmente e, portanto, robustecido através desse exercício. Daí que o cristão, que já possui o dom divino da fé, ajudado pela graça deva fazer actos explícitos de fé para que esta virtude cresça nele.

15.09.2015 – Lc2, 33-35

33Seu pai e Sua mãe estavam admirados com as coisas que d’Ele se diziam. 34Simeão abençoou-os e disse a Maria, Sua mãe: Olha que Ele está aqui para a queda e o ressurgi­mento de muitos em Israel e para ser sinal de contradição — 35uma espada te há-de traspassar a tua própria alma — a fim de se revelarem os pensamentos de muitos espí­ritos.

Comentário

34-35. Depois de os abençoar, Simeão, movido pelo Espírito Santo, profetiza de novo sobre o futuro do Menino e de Sua Mãe. As palavras de Simeão tornaram-se mais claras para nós ao cumprirem-se na Vida e na Morte do Senhor.

Jesus, que veio para a salvação de todos os homens, não obstante, será sinal de contradição porque alguns obstinar-se-ão em rejeitá-Lo, e para estes Jesus será a sua ruína. Para outros, porém, ao aceitá-Lo com fé, Jesus será a sua salvação, livrando-os do pecado nesta vida e ressuscitando-os para a vida eterna.

As palavras dirigidas à Santíssima Virgem anunciam que Maria teria de estar intimamente unida à obra redentora do seu Filho. A espada de que fala Simeão expressa a participação de Maria nos sofrimentos do Filho; é uma dor inenarrável, que traspassa a alma. O Senhor sofreu na Cruz pelos nossos pecados; também são os pecados de cada um de nós que forjaram a espada de dor da nossa Mãe. Por conseguinte, temos um dever de desagravo não só com Deus, mas também com a Sua Mãe, que é igualmente nossa Mãe. As últimas palavras da profecia, «a fim de se revelarem os pensamentos de muitos espíritos», enlaçam com o v. 34: na aceitação ou rejeição de Cristo manifesta-se a rectidão ou a perversão dos corações.

 

16.09.2015 – Lc7, 31-35

31A quem hei-de, pois, comparar os homens desta geração? A quem são semelhantes? 32Assemelham-se a esses garotos que, sen­tados na praça, se interpelam uns aos outros, dizendo: Tocamos flauta para vós e não dançastes! Entoamos endechas e não chorastes!

33Veio, efectivamente, João Baptista, que não come pão nem bebe vinho, e vós dizeis: «Está possesso do Demônio». 34Veio o Filho do homem, que come e bebe, e vós dizeis: «Aí está um homem glutão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores». 35Mas a Sabedoria foi justificada por todos os Seus filhos.

Comentário

31-34. Veja-se a nota a Mt 11,16-19.

35. A sabedoria que aqui se menciona é a Sabedoria divina, que é por excelência o próprio Cristo (cfrSap 7,26; Prv 8,22). «Filhos da Sabedoria» é um hebraísmo que signi­fica simplesmente «sábios»; por sua vez, é verdadeiramente sábio o que chega a conhecer Deus, O ama e se salva: numa palavra, o santo.

A sabedoria divina manifesta-se na criação e no governo do universo e, sobretudo, na salvação do gênero humano. Que os sábios justifiquem a sabedoria parece significar que os sábios, os santos, deem testemunho de Cristo com a sua vida santa: «Brilhe assim a vossa luz diante dos homens para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos Céus» (Mt 5,16).

17.09.2015 – Lc7, 36-50

36Um fariseu convidou-O a comer consigo. Ele entrou em casa do fariseu e pôs-Se à mesa. 37Ora uma mulher, que era pecadora naquela cidade, ao saber que Ele estava à mesa em casa do fariseu, trouxe um vaso de alabastro com perfume. 38Colocou-se por detrás, chorando a Seus pés e, com lágrimas, começou a banhar-Lhe os pés; pôs-se depois a enxugar-Lhos com os seus cabelos, a beijar-Lhos e a ungir-Lhos com perfume. 39Ao ver tal cena, o fariseu que O tinha convidado disse consigo: «Este homem, se fosse profeta, saberia quem é e de que espécie é a mulher que Lhe está a tocar: uma pecadora!» 40Então Jesus tomou a palavra e disse-lhe: Simão, tenho uma coisa a dizer-te. Este respondeu: Diz lá, Mestre. 41Tinha certo prestamista dois devedores: um devia qui­nhentos denarios e o outro cinquenta. 42Não tendo eles com que pagar, perdoou a ambos. Qual deles então lhe ficará com mais amizade? 43Simão disse, em resposta: Penso que aquele a quem mais perdoou. Respondeu-lhe Ele: Julgaste bem. «E, voltando-Se para a mulher, disse a Simão: Vês esta mulher? Entrei em tua casa e não Me deste água para os pés; mas ela banhou-Me os pés com lágrimas e enxugou-Mos com os seus cabelos. 45Não Me deste um ósculo; mas ela, desde que Eu entrei, não deixou de Me beijar os pés. 46Não Me ungiste a cabeça com óleo; mas ela ungiu-Me os pés com perfume. 47Por isso te digo: Estão perdoados os seus muitos peca­dos, visto que manifestou muito amor. Mas aquele a quem pouco se perdoa pouco amor manifesta. 48Depois, disse-lhe a ela: Estão perdoados os teus pecados. 49Começaram então os convivas a dizer consigo: Quem é Este que até os pecados perdoa? 50E Jesus disse à mulher: Salvou-te a tua fé: vai em paz!

Comentário

36-40. A mulher pecadora, movida sem dúvida pela graça, acorreu atraída pela pregação de Cristo e pelo que se dizia d’Ele. Os convidados punham-se à mesa apoiados sobre o braço esquerdo, em pequenos divãs, de forma que os pés ficavam retirados para fora. Eram deveres de cortesia para com o hóspede dar-lhe o beijo de boas-vindas, ofere­cer-lhe água para lavar os pés e perfumes com que se ungisse.

41-50. Três coisas nos ensina Cristo na breve parábola dos dois devedores: a Sua divindade e o poder de perdoar os pecados; o mérito do amor da pecadora; e a descortesia que encerram os descuidos de Simão, que omitiu no convívio com Jesus os pormenores de urbanidade que se costumavam ter com os convidados. O Senhor não buscava esses porme­nores pelo valor que em si possuíam mas pelo carinho que eles expressavam, e por isso queixa-Se da falta de cortesia de Simão.

«(…) Jesus repara em todos esses pormenores de cortesia e de delicadeza humanas, que o fariseu não soube manifes­tar-Lhe. Cristo é perfectus Deus, perfectus homo (Símbolo Atanasiano), Deus, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, e homem perfeito. Traz a salvação e não a destruição da natureza. Com Ele aprendemos que não é cristão compor­tar-se mal com o homem, criatura de Deus, feito à Sua imagem e semelhança (Gen 1, 26)»(Amigos de Deus, n° 73).

Além disso, o fariseu pensou mal ao julgar negativa­mente a pecadora e Jesus: Simão duvida do conhecimento que Cristo tem e murmura interiormente. O Senhor, que conhecia os segredos dos corações dos homens (manifes­tando assim a Sua divindade), intervém para lhe indicar o seu descaminho. A verdadeira justiça, diz-nos São Gregório Magno (cfrIn Evangeliahomiliae, 33), tem compaixão; a falsa, pelo contrário, indigna-se. Muitos são como esse fa­riseu: esquecendo a sua condição, passada ou presente, de pobres pecadores, quando veem os pecados dos outros, imedia­tamente, sem piedade, deixam-se levar pela indignação, ou apressam-se a julgar, ou riem-se ironicamente deles. Não pensam nas frases de São Paulo: «O que crê estar de pé, veja que não caia» (1Cor 10,12). «Irmãos, se porventura alguém é achado em alguma falta, vós, que sois espirituais, corrigi-o com espírito de mansidão (…).Levai os fardos uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo» (Gal 6,1-2).

Devemos esforçar-nos para que a caridade presida a todos os nossos juízos. Se não, facilmente seremos injustos com os outros: «Não queiramos julgar. — Cada qual vê as coisas do seu ponto de vista… e com o seu entendimento, bem limitado quase sempre, e com os olhos obscuros 6u enevoados, com trevas de exaltação muitas vezes (…).

«Como valem pouco os juízos dos homens! — Não jul­gueis sem joeirar o vosso juízo na oração»(Caminho, n° 451).

A caridade e a humildade far-nos-ão ver nos pecados dos outros a nossa própria condição débil e desprotegida, e ajudar-nos-ão a unir-nos do coração à dor de todo o pecador que se arrepende, porque também nós cairíamos em iguais ou mais graves pecados se a divina piedade não estivesse» misericordiosamente junto de nós.

«O Senhor — conclui Santo Ambrósio — amou não o unguento, mas o carinho; agradeceu a fé, louvou a humildade.E tu também, se desejas a graça, aumenta o teu amor; derrama sobre o corpo de Jesus a tua fé na Ressurreição, os perfume da Igreja santa e o ungüento da caridade com os outros»(ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc.).

47. O homem não pode merecer o perdão dos pecados porque, sendo Deus o ofendido, a sua gravidade torna-se’ infinita. É necessário o sacramento da Penitência, com que ‘ Deus nos perdoa pelos méritos infinitos de Jesus Cristo; só há uma condição indispensável para alcançar o perdão de Deus: o nosso amor, o nosso arrependimento. Perdoa-se-nos na medida em que amamos; e quando o nosso coração está cheio de amor já não há nele lugar para o pecado, porque então demos lugar a Jesus, que nos diz como a esta mulher: Ficam perdoados os teus pecados. O arrependimento é mostra de que amamos a Deus. Mas Deus é que nos amou primeiro (cfr 1Ioh 4,10). Quando Deus nos perdoa mani­festa o Seu amor por nós. O nosso amor a Deus, pois, é sempre de correspondência, depois do Seu. O perdão divino faz crescer o nosso agradecimento e o nosso amor por Ele. «Ama pouco — comenta Santo Agostinho — aquele que é perdoado em pouco. Tu, que dizes não ter cometido muitos pecados, por que não os fizeste? (…). É por te ter Deus levado pela mão (…). Nenhum pecado, com efeito, comete um homem que não possa fazê-lo também outra pessoa se Deus, que fez o homem, não o segura pela Sua mão»(Sermo99,6). Por conseguinte, devemos amar, enamorar-nos cada dia mais do Senhor, não só porque nos perdoa os nossos peca­dos, mas também porque nos preserva, com a ajuda da Sua graça, de os cometer.

50. Jesus Cristo declara que a fé levou aquela mulher a prostrar-se aos Seus pés e a mostrar-Lhe o seu arrependi­mento; este arrependimento mereceu-lhe o perdão. Da mesma maneira nós, ao aproximar-nos do sacramento da Penitência, devemos reavivar a nossa fé em que «a confissão sacramental não é um diálogo humano; é um colóquio divino; é um tribunal de segura e divina justiça e, sobretudo, de misericórdia, com um juiz amoroso que não deseja a morte do pecador, mas que ele se converta e viva (Ez XXXIII, 11)» (Cristo que passa,n° 78).

18.09.2015 – Lc8, 1-3

O Em seguida, ia caminhando por cidades e aldeias, a pregar e a anunciar a Boa Nova do Reino de Deus. 2Andavam com Ele os doze e algumas mulheres, que tinham sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades: Maria, que era chamada de Magdala e de quem tinham saído sete Demônios, 3Joana, mulher de Cuzá, adminis­trador de Herodes, Susana e muitas outras, que os serviam com os seus haveres.

Comentário

1-3. Em várias ocasiões nos fala o Evangelho de mulheres que acompanhavam o Senhor. São Lucas recolhe aqui o nome de três: Maria, chamada Madalena, a quem Cristo ressuscitado aparece junto do sepulcro (Ioh 20,11-18: Mc 16,9); Joana, de posição remediada, que se encontra também entre as que acorrem ao sepulcro na manhã da Ressurreição (Lc 24,10) e Susana, da qual não temos ne­nhuma outra notícia no Evangelho. A missão destas mulheres consistia em ajudar com os seus bens e com o seu trabalho a Jesus e aos discípulos. Deste modo correspondiam com agradecimento aos benefícios que tinham recebido de Cristo, e cooperavam na tarefa apostólica.

Na Igreja a mulher e o homem gozam de igual dignidade. Dentro desta dignidade comum há na mulher, sem dúvida, características peculiares que se hão-dereflectir necessa­riamente no seu papel dentro da Igreja: «Todos os baptizados — homens e mulheres — participam igualmente da comum dignidade, liberdade e responsabilidade dos filhos de Deus (…). A mulher é chamada a levar à família, à sociedade civil, à Igreja, alguma coisa de característico, que lhe é próprio e que só ela pode dar: a sua delicada ternura, a sua generosidade incansável, o seu amor ao concreto, a sua agudeza de engenho, a sua capacidade de intuição, a sua piedade profunda e simples, a sua tenacidade… A femini­lidade não é autêntica se não reconhece a formosura dessa contribuição insubstituível e não a incorpora na própria vida»(Temas Actuais do Cristianismo, nos 14 e 87).

O Evangelho põe em realce a generosidade das santas mulheres. E formoso pensar que o Senhor quis apoiar-Se nesta caridade, e que elas souberam corresponder-Lhe com um desprendimento tão delicado e generoso, que provoca na mulher cristã «uma santa inveja, cheia de eficácia» (cfrCaminho, n°981).

 

19.09.2015 – Lc8, 4-15

4Como afluísse grande multidão e os de cada cidade a Ele acorressem, disse em parábola: 5Saiu o semeador para semear a sua semente. Ora, quando semeava, caiu parte da semente à beira do caminho; foi calcadae as aves do céu comeram-na. 6Outra caiu sobre a rocha e, depois de brotar, secou por não ter humildade. 7Outra caiu no meio de espinhos e os espinhos, brotando com ela, sufocaram-na. 8E outra caiu na boa terra e, depois de brotar, deu fruto centuplicado. Dizendo isto, bradava: Quem tem ouvidos para ouvir, que oiça!

9Perguntaram-Lhe os discípulos o que queria dizer esta parábola, 10e Ele respon­deu: A vós está concedido conhecer os mistérios do Reino de Deus, mas aos outros é só em parábolas, a fim de que vendo, não vejam e, ouvindo, não entendam.

11E isto a parábola: A semente é a Palavra de Deus. 12Os que estão à beira do caminho são aqueles que ouviram; em seguida, vem o Diabo e tira-lhes a Palavra do coração, para não se salvarem, acreditando. 13Os que estão sobre a rocha são aqueles que, ao ouvirem, recebem alegremente a Palavra; mas esses não têm raiz: acreditam por algum tempo e afastam-se na altura da provação. 14A se mente que caiu nos espinhos são aqueles que ouviram, mas, no seu caminho, são sufo­cados pelos cuidados, pela riqueza e pelos prazeres da vida e não chegam à maturidade. I5E a que está na boa terra são aqueles que, tendo ouvido a Palavra com um coração recto e bom, a conservam e dão fruto com a sua perseverança.

Comentário

4-8. O Senhor dará a explicação da parábola (vv. 11-15). A semente é o próprio Jesus Cristo e a Sua pregação; e as diferentes terras reflectem as diversas atitudes dos homens diante de Jesus e da Sua doutrina: o Senhor semeia nas almas a vida divina através da pregação da Igreja e de tantas graças actuais que concede.

10-12. A finalidade que Jesus persegue com as pará­bolas é ensinar aos homens os mistérios da vida sobrenatural para os encaminhar para a salvação, prevê, porém, que, pelas más disposições de alguns ouvintes, as parábolas serão ocasião de endurecimento e de rejeição da graça. Uma explicação mais ampla da finalidade das parábolas pode ver-se nas notas a Mt 13,10-13 e Mc 4,11-12.

12. Há homens que, metidos numa vida de pecado, são. como o caminho onde cai a semente «que sofre um duplo dano, é pisada pelos caminhantes e arrebatada pelas aves. O caminho é, portanto o coração que está espezinhado pela frequente passagem dos maus pensamentos, e seco de tal modo que não pode receber a semente nem esta germinar»(In LucaeEvangeliumexpositio, ad loc.). As almas endure­cidas pelos pecados podem chegar a ser terra boa e dar fruto pelo arrependimento sincero e pela penitência. É de notar o empenho do demônio por conseguir que a alma continue endurecida e não se converta.

13.«A muitos agrada o que escutam, e propõem-se agir bem; mas logo que começam a ser incomodados pelas adversidades abandonam as boas obras que tinham começado. A terra pedregosa não teve suficiente substância, pelo que, o germinado não chegou a dar fruto. Há muitos que quando ouvem falar contra a avareza a detestam, e exaltam o menosprezo das coisas deste mundo; mas mal a alma vê outra coisa para desejar, esquece-se do que exaltava. Há também muitos que quando ouvem falar contra a impureza não só não desejam manchar-se com as sujidades da carne, mas até se envergonham das manchas com que se mancharam; mas logo que se apresenta à sua vista a beleza corporal, é arras­tado o coração pelos desejos de tal maneira que é como se nada tivessem feito nem determinado contra esses desejos, e fazem o que é digno de condenação e eles próprios tinham condenado ao recordar que o tinham cometido. Muitas vezes nos compungimos pelas nossas culpas e, contudo solta­remos a cometê-las depois de as termos chorado»(In Evangeliahomiliae, 15).

14. Trata-se daqueles que depois de receberem a semente divina, a vocação cristã, e tendo caminhado com passo firme durante algum tempo, começam a ceder na luta. Estas almas estão expostas a perder o gosto pelas coisas de Deus e, paralelamente, a iniciar o fácil e desviado caminho das compensações que lhes sugerem a sua ambição desordenada de poder, o seu afã pelas riquezas e a vida cômoda sem sofrimento.

Nesta situação começa a aparecer a tibieza, e o homem quer servir ao mesmo tempo a dois senhores: «Não é lícito viver tentando manter acesas, como diz o povo, uma vela a São Miguel e outra ao Diabo. É preciso apagar a vela do Diabo. Temos de consumir a vida fazendo-a arder inteira­mente ao serviço do Senhor. Se o nosso empenho pela santidade é sincero, se temos a docilidade de nos abandonar nas mãos de Deus, tudo correrá bem. Porque Ele está sempre disposto a dar-nos a Sua graça»(Cristo que passa, n° 59).

15. Três são as características que Jesus Cristo assinala na terra boa: ouvir com as boas disposições de um coração generoso os requerimentos divinos; esforçar-se para que essas exigências não se atenuem com o decurso do tempo; e, por fim, começar e recomeçar sem desanimar se o fruto tarda. «Não podes ‘subir’. — Não é de estranhar: aquela queda!…

«Persevera e ‘subirás’. — Recorda o que diz um autor espiritual: a tua pobre alma é um pássaro que ainda tem as asas empastadas de lama.

«É preciso muito calor do céu e esforços pessoais, pequenos e constantes, para arrancar essas inclinações, essas imaginações, esse abatimento, essa lama pegajosa das tuas asas.

«E ver-te-ás livre. — Se perseverares, ‘subirás’»(Cami­nho, n° 991).

20.09.2015 – Mc 9, 30-37

30Partindo dali, iam a atravessar a Galileia, e Ele não queria que ninguém o soubesse, 31porque entretanto ia instruindo os discí­pulos e dizia-lhes: O Filho do homem vai ser entregue nas mãos dos homens que O hão-de matar, mas três dias depois de morto res­suscitará. 32Eles, porém, não compreendiam estas palavras e tinham medo de O interrogar.

33Chegaram a Cafarnaum . Quando estava já em casa, perguntou-lhes: Que é que discutíeis no caminho? 34Mas eles calaram-se, porque tinham discutido uns com os outros sobre qual deles era o maior. 35Então, assentando-Se, chamou os doze e disse-lhes: Se alguém quer ser o primeiro há-de ser o último de todos e o servo de todos. 36E, tomando um menino, pô-lo em frente deles e, estreitando-o nos braços disse-lhes: 37Quem receber um destes meninos em Meu nome, é a Mim que recebe; e quem Me receber, não Me recebe a Mim, mas sim Aquele que Me enviou.

Comentário

30-32. Jesus Cristo, que Se comove ao ver as multidões como ovelhas sem pastor (Mt 9,36), deixa-as, porém, para Se dedicar a uma instrução esmerada dos Apóstolos. Retira-Se com eles para lugares afastados e ali, pacientemente, expli­ca-lhes aqueles pontos que não tinham compreendido na pregação ao povo (Mt 13,36). Concretamente aqui, pela segunda vez, anuncia-lhes o acontecimento próximo da Sua Morte redentora na Cruz, seguida da Sua Ressurreição. Na Sua convivência com as almas Jesus actua da mesma forma: chama o homem ao retiro da oração e, ali, instrui-o sobre os Seus desígnios mais íntimos e sobre os aspectos mais exigentes da vida cristã. Depois, como os Apóstolos, os cristãos terão de semear esta doutrina até aos confins da terra.

34-35. Partindo de uma discussão mantida atrás de Si, Jesus Cristo doutrina os discípulos sobre o modo de exercer a autoridade na Igreja não como quem domina, mas como quem serve. Ele, no desempenho da Sua missão de fundar a Igreja de que é Cabeça e Legislador supremo, veio servir e não ser servido (Mt 20,28).

Quem não busca esta atitude de serviço abnegado, além de carecer de uma das melhores disposições para o recto exercício da autoridade, expõe-se a ser arrastado pela ambição do poder, pela soberba e pela tirania. «Estar à frente de uma obra de apostolado é o mesmo que estar disposto a sofrer tudo de todos, com infinita caridade». (Caminho, n° 951).

36-37. Jesus, para ensinar graficamente aos Seus Após­tolos a abnegação e a humildade de que necessitam no exercício do seu ministério, toma uma criança, abraça-a e explica-lhes o significado deste gesto: acolher em nome e por amor de Cristo os que, como essa criança, não têm relevo aos olhos do mundo, é acolher o próprio Cristo e o Pai que O enviou. Nessa criança que Jesus abraça estão representadas todas as crianças do mundo, e também todos os homens necessitados, desprotegidos, pobres, doentes, nos quais nada há de brilhante e destacado para admirar.

21.09.2015 – Mt 9, 9-13

9Seguindo Jesus dali, viu sentado ao telónio um homem chamado Mateus e disse-lhe: Segue-Me. E ele levantou-se e seguiu-O. 10Ora, sucedeu que, estando à mesa em sua casa, vieram muitos publicanos e pecadores pôr-se à mesa com Jesus e Seus discípulos.11Ao verem isto os Fariseus, diziam aos discípulos: Porque é que o vosso Mestre come com os publicanos e pecadores? 12Mas Ele, que os ouviu, disse: Não precisam de médico os que têm boa saúde, mas os doen­tes. 13lde, pois, aprender o que significa: quero misericórdia e não sacrifício, porque não vim Eu chamar os justos, mas os peca­dores.

Comentário

9.«Telónio»: Posto público para o pagamento de tribu­tos. Acerca do «seguir Jesus» veja-se a nota a Mt 8,18-22.

Este Mateus, a quem Jesus chama, é o apóstolo do mesmo nome e autor humano do primeiro Evangelho. É o mesmo que em Mc 2,14 e em Lc 5,27 é chamado Levi o de Alfeu, ou simplesmente Levi.

Deus é quem chama. Para seguir Jesus de modo perma­nente não basta a própria determinação do homem, mas requer-se, absolutamente, o chamamento individual por parte do Senhor; isto é, a graça da vocação (cfrMt 4, 19-21; Mc 1, 17-20; Ioh 1, 39; etc.). Esse chamamento implica a prévia escolha divina. Por outras palavras, não é o homem quem toma a iniciativa; pelo contrário, é Jesus quem chama primeiro e o homem corresponde a esse chamamento com a 0tlá livre decisão pessoal: «Não fostes vós que Me escolhestes, filas fui Eu que vos escolhi a vós» (Ioh 15,16). Deve pôr-se em relevo a prontidão com que Mateus «segue» o chamamento de Jesus. Diante da voz de Deus pode entrar na alma a tentação de responder: «Amanhã, ainda não estou preparado». No fundo esta e outras razões não são mais que egoísmo e medo, além de que o medo pode ser um sintoma a mais do chamamento (cfrIoh1). Amanhã corre-se o risco de ser demasiado tarde.

Como o dos outros apóstolos, o chamamento de São Mateus dá-se no meio das circunstâncias normais da sua vida: «— Deus foi-te procurar no exercício da tua profissão?,,, « Foi assim que procurou os primeiros: Pedro, André, João e Tiago, junto das redes; Mateus, sentado à mesa dos Impostos…

«E — assombra-te! — Paulo, no seu afã de acabar com a semente dos cristãos»(Caminho, n° 799).

10-11. A mentalidade desses fariseus, tão inclinada a julgar os outros e classificar facilmente como justos e pecadores, não concorda com a atitude e ensinamentos de Jesus. Já tinha dito: «Não julgueis e não sereis julgados» (Mt 7, 1), e acrescentou ainda: «Quem de vós estiver sem pecado seja o primeiro a lançar-lhe uma pedra» (Ioh 8,7).

A realidade é que todos os homens são pecadores e o Senhor veio para remir a todos. Não há, pois, razão para que se dê entre os cristãos o escandalizar-se pelos pecados de outros, visto que qualquer de nós é capaz de cometer as maiores vilezas se não for assistido pela graça de Deus.

12. Ninguém deve desanimar ao ver-se cheio de misérias: reconhecer-se pecador é a única atitude justa diante de Deus. Ele veio buscar a todos, mas o que se considera justo, por esse mesmo facto, está a fechar as portas a Deus, porque na realidade todos somos pecadores.

13. A frase de Jesus, tomada de Os 6, 6, conserva a expressão hiperbólica do estilo semítico. Uma tradução mais fiel ao sentido seria: «quero mais misericórdia que sacrifí­cio» . Não é que o Senhor não queira os sacrifícios que Lhe são oferecidos, mas insiste em que estes háo-de ir sempre acompanhados pela bondade do coração, visto que a caridade há-de informar toda a actividade do cristão e com maior razão o culto a Deus (vid. 1Cor 13,1-13; Mt 5,23-24).

22.09.2015 – Lc8, 19-21

19Vieram então ter com Ele Sua mãe e Seus irmãos, mas não podiam abeirar-se d’Ele por causa da multidão. 20Foi-Lhe anun­ciado: Tua mãe e Teus irmãos estão lá fora e querem ver-Te. 2lDisse-lhes Ele, em resposta: Minha mãe e Meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática.

Comentário

19-21. Estas palavras do Senhor ensinam-nos que o cumprimento da Vontade de Deus está por cima dos laços do sangue e que, portanto, Nossa Senhora está mais unida ao seu Filho pelo perfeito cumprimento do que Deus lhe pediu, que por o Espírito Santo ter formado d’Ela o corpo de Cristo (cfr as notas a Mt 12,48-50 e a Mc 3,31-35).

23.09.2015 -Lc 9, 1-6

Depois de convocar os doze, deu-lhes poder e autoridade sobre todos os Demônios e para curarem doenças. 2Depois, enviou-os a proclamar o Reino de Deus e a curar os enfermos. 3E disse-lhes: Nada leveis para o caminho, nem cajado, nem saco, nem pão, nem dinheiro, e não tenha cada um duas túnicas. 4Em qualquer casa onde entrardes. ficai lá e de lá é que haveis de partir. 5E quanto aos que vos não receberem, ao sair da respectiva cidade, sacudi o pó dos vossos pés, para servir de testemunho contra eles. 6Partindo então, percorriam todas as povoações, a anunciar a Boa Nova e a operar curas por toda a parte.

Comentário

1.4. Trata-se da primeira missão dos Apóstolos. Ao enviá-los quer que se preparem de maneira prática para a sua futura missão depois que Ele suba aos Céus. Encarre­ga-os de que façam o mesmo que Ele fez: pregar o Reino de Deus e curar doentes. Esta cena está mais amplamente comentada nas notas a Mt 10,7-8; 10,9-10; e a Mc 6,8-9.

24.09.2015 – Lc9, 7-9

7Ouviu o tetrarca Herodes tudo o que se passava, e andava perplexo, porque alguns diziam: João ressuscitou dentre os mortos. 8Outros: Foi Elias que apareceu. E outros ainda: Foi um dos antigos profetas que ressuscitou. 9Disse Herodes: A João man­dei-o eu decapitar, mas quem é Este de quem oiço tais coisas? E procurava vê-Lo.

Comentário

7-9. Todos os judeus, se exceptuarmos os saduceus, criam na ressurreição dos mortos, ensinada por Deus nas Sagradas Escrituras (cfrEz 37,10; Dan 12,2 e 2 Mach 7,9). Por outro lado, era opinião comum entre os judeus contemporâneos de Cristo que Elias ou algum profeta havia de vir de novo (cfrDt 19,15). Esta poderia ser a razão pela qual Herodes chegou a pensar na possibilidade de que João tivesse ressuscitado (cfr Mt 14, 1-2 e Mc 6,14-16): a esta opinião era induzido ao ouvir que Jesus fazia milagres, pois supunha que os ressuscitados eram os que tinham poderes para os fazer. Não obstante, por outro lado, constava-lhe que Cristo fazia milagres já antes de morrer João (cfrIoh 2,23) e, por isso, num primeiro momento, não sabia a que ater-se. Depois, ao crescer a fama dos milagres de Cristo, e para encontrar alguma explicação que o convencesse, decide considerar verdade que João ressuscitou, tal como no-lo contam os outros Evangelhos.

25.09.2015 – Lc9, 18-22

18Uma vez que rezava em particular, estando os discípulos com Ele, interrogou-os, nestes termos: Quem dizem as mul­tidões que Eu sou? 19Disseram eles, em resposta: João Baptista; outros, Elias, e outros que ressuscitou um dos antigos pro­fetas. 20Disse-lhes Ele: E vós quem dizeis que Eu sou? Pedro tomou então a palavra e respondeu: O Messias de Deus. 21Mas Ele, em tom severo, ordenou-lhes que a ninguém o dissessem, 22e acrescentou: O Filho do homem tem de sofrer muito, ser rejeitado por parte dos Anciãos, dos Sumos Sacer­dotes e dos Escribas, ser morto e, ao terceiro dia, ressuscitar.

Comentário

20. «Cristo» significa ungido e é nome de honra e de ofício. Na Antiga Lei ungiam-se os sacerdotes (Ex 29,7 e 40,13) e os reis (1Sam 9,16), a quem Deus tinha mandado que se ungisse pela dignidade do seu cargo; também houve o costume de ungir os profetas (1Sam 16,13) enquanto eram intérpretes e intermediários de Deus. «Mas ao vir ao mundo Jesus Cristo, nosso Salvador, recebeu o estado e as obrigações dos três ofícios de sacerdote, rei e profeta, e por esta causa foi chamado Cristo» (Catecismo Romano, 1,3,7).

22. O Senhor profetizou a Sua Paixão e Morte para facilitar a fé dos discípulos. Ao mesmo tempo manifesta a voluntariedade com que aceita os sofrimentos. «Cristo não quis glorificar-Se, mas desejou vir sem glória para padecer o sofrimento; e tu, que nasceste sem glória, queres glorificar-te? Pelo caminho que Cristo percorreu é por onde tu deves caminhar. Isto é reconhecê-Lo, isto é imitá-Lo tanto na ignomínia como na boa fama, para que te glories na Cruz, como Ele próprio Se glorificou. Tal foi o comportamento de Paulo e por isso se gloria ao dizer: ‘Longe de mim gloriar-me a não ser na Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo’ (Gal 6,14)» (ExpositioEvangelii sec. Lucam, ad loc).

26.09.2015 – Lc9, 44b-45

O Filho do homem vai, de facto, ser entregue nas mãos dos homens. 45Eles, porém, não entendiam aquela linguagem; estava-lhes velada, de sorte que a não atingiam e tinham receio de O interrogar sobre tais palavras.

Comentário

44. Cristo insiste em anunciar a Sua Paixão e Morte. Primeiro veladamente (Ioh 2,19; Lc 5,35) à multidão, e depois com mais clareza aos discípulos (Lc 9,22). Estes, contudo, não entendem as Suas palavras, não porque não sejam claras, mas pela falta das disposições adequadas. Comenta São João Crisóstomo: «Ninguém se escandalize ao contemplar uns Apóstolos tão imperfeitos, porque ainda não tinha chegado a Cruz nem tinha sido dado o Espírito Santo» (Hom. sobre S. Mateus, 65).

 

27.09.2015 – Mc 9, 38-43.45.47-48

38Disse-Lhe João: Mestre, vimos um homem que não anda connosco a expulsar os Demô­nios em Teu nome e proibimos-lho, porque não andava connosco. 39Nãolho proibais — respondeu Jesus . — Porque não há ninguém que possa fazer um milagre em Meu nome e vá logo falar mal de Mim. 40Pois quem não é contra nós é por nós. 41E quem vos der um copo de água a beber, a título de que sois de Cristo, digo-vos em verdade que náo perderá a sua recompensa.

42E quem escandalizar um destes peque­ninos que crêem em Mim, a esse é melhor que lhe ponham ao pescoço a mo de uma atafona e o lancem ao mar.

43E, se a tua mão é para ti ocasião de escândalo, corta-a, porque é melhor entrares na vida mutilado, do que ires com ambas as mãos para a Geena, para o fogo inextinguível.

45E, se o teu pé é para ti ocasião de escândalo, corta-o, porque melhor é entrares na vida coxo, do que com ambos os pés seres lançado na Geena.

47E, se algum dos teus olhos é para ti ocasião de escândalo, deita-o fora, porque melhor é entrares no Reino de Deus com uma só vista, do que com ambos os olhos seres lançado na Geena, 48onde o seu verme não morre e o fogo não se extingue.

Comentário

38-40. O Senhor previne os Apóstolos, e depois deles todos os cristãos, contra o exclusivismo e o espírito de partido único na tarefa apostólica, que se exprime no falso refrão: «O bem, se não o faço eu, já não é bem». Pelo contrário, devemos assimilar este ensinamento de Cristo, porque o bem é bem, mesmo que o não faça eu. Cfr a nota a Lc 9,49-50.

41.O valor e o mérito das obras boas está princi­palmente no amor a Deus com que se realizam: «Um pequeno acto, feito por Amor, quanto não vale!» (Caminho, n° 814). Deus recompensa, sobretudo, as acções de serviço aos outros, por pequenas que pareçam: «Vês esse copo de água ou esse pedaço de pão que uma mão caritativa dá a um pobre por amor de Deus?Pouca coisa é na realidade e quase não estimável para o juízo humano; mas Deus recom­pensa-o e concede imediatamente por isso aumento de caridade»(Tratado do amor de Deus, livro 3, cap. 2).

42. «Escândalo é qualquer dito, facto ou omissão que dá ocasião a outro de cometer pecados» (Catecismo Maior, n° 417). Chama-se diabólico, e é-o, quando o fim intentado por quem produz o escândalo é o pecado do próximo, enquanto ofensa a Deus. Por ser o pecado o maior de todos os males, compreende-se a gravidade do escândalo e, portanto, a decidida condenação de Cristo. Reveste-se de particular gravidade escandalizar as crianças, porque estão mais indefesas contra o mal. A advertência de Cristo vale para todos, mas de modo especial para os pais e educadores, que são responsáveis diante do tribunal de Deus pela alma dos pequenos.

43. «Geena» ou Ge-hinnom, era um pequeno vale ao sul de Jerusalém, fora das muralhas e mais baixo do que a cidade. Durante séculos este lugar foi utilizado para depo­sitar o lixo da povoação. Habitualmente esse lixo era quei­mado para evitar o foco de infecção que constituía e a acumulação do mesmo. Era proverbial como lugar imundo e doentio. Nosso Senhor serve-Se deste facto conhecido para explicar, de modo gráfico, o fogo inextinguível do inferno.

43-48. Jesus, depois de ter ensinado a obrigação de evitar o escândalo aos outros, assenta agora as bases da doutrina moral cristã sobre a ocasião de pecado; a doutrina do Senhor é imperiosa: o homem está obrigado a afastar e evitar a ocasião próxima de pecado, como o próprio pecado, segundo o que já tinha dito Deus no AT: «O que ama o perigo cairá nele» (Eccli 3, 26-27). O bem eterno da nossa alma é superior a qualquer estima de bens temporais. Portanto, tudo aquilo que nos põe em perigo próximo de pecado deve ser cortado e arrancado de nós. Esta forma de falar — tão gráfica — do Senhor deixa bem assente a gravidade desta obrigação.

Os Santos Padres, sob a imagem dos membros corporais, veem aquelas pessoas que obstinadas no mal nos induzem irremediavelmente às más obras ou à má doutrina. É a estes que devemos afastar de nós para que cheguemos à vida, antes que ir com eles para o inferno (De consensuEvangelistarum, IV, 16; Hom. sobre S. Mateus, 60).

 

28.09.2015 – Lc9, 46-50

46Veio-lhes então este pensamento: qual deles seria o maior? 47Mas Jesus, que conhe­cia o íntimo pensar deles, tomou um menino, colocou-o junto de Si 48e disse-lhes: Quem acolher em Meu nome este menino é a Mim que acolhe; e quem Me acolher acolhe Aquele que Me enviou, pois quem for o mais pequeno entre vós todos, esse é que é grande!

49João tomou a palavra e disse: Mestre, nós vimos alguém a expulsar Demônios em Teu nome e impedimo-lo, porque não anda connosco. 50Respondeu-lhe Jesus: Não impeçais, pois quem não é contra vós é a vosso favor.

Comentário

46-48. Jesus toma uma criança nos Seus braços para a oferecer como exemplo aos Apóstolos e corrigir as ambições demasiado humanas que tinham então no seu coração. Nos Apóstolos ensinou-nos a todos nós, corrigindo a nossa inclinação para buscar o que nos torna importantes, adultos. «Não queiras ser grande. — Criança, criança sempre, ainda que morras de velho. — Quando um menino tropeça e cai, ninguém estranha…; seu pai apressa-se a levantá-lo.

«Quando quem tropeça e cai é adulto, o primeiro movi­mento é de riso. — Às vezes, passado esse primeiro ímpeto, o ridículo cede o lugar à piedade. — Mas os adultos têm de se levantar sozinhos.

«A tua triste experiência quotidiana está cheia de tro­peços e quedas. Que seria de ti se não fosses cada vez mais pequeno?

«Não queiras ser grande, mas menino.Para que, quando tropeçares, te levante a mão de teu Pai-Deus»(Caminho, n° 870).

49-50. O Senhor corrige a atitude exclusivista e intole­rante dos Apóstolos. São Paulo tinha aprendido esta lição e por isso pode exclamar quando está na sua prisão romana: «É verdade que há alguns que pregam Cristo por espírito de inveja e de rivalidade, enquanto outros o fazem com boa intenção. (…) Mas, que importa? Desde que, de qualquer modo, Cristo seja anunciado, quer seja por algum pretexto quer por um verdadeiro zelo, alegro-me e alegrar-me-ei sempre» (Phil 1,15.18). «Alegra-te quando vires que outros trabalham em bons campos de apostolado. — E pede, para eles, graça de Deus abundante e correspondência a essa graça.

«Depois, tu — segue o teu caminho; persuade-te de que não tens outro» (Caminho, n° 965).

29.09.2015 – Jo1, 47-51

47Jesus, vendo Natanael, que vinha ao Seu encontro, diz acerca dele: Aí está um autên­tico israelita, em quem não há fingimento! 48Diz-Lhe Natanael: Donde me conheces? Respondeu-lhe Jesus, dizendo: Antes de Fi­lipe te haver chamado, quando estavas de­baixo da figueira, Eu vi-te! 49Volveu-Lhe Natanael: Rabi, Tu és o Filho de Deus, Tu és o Rei de Israel. 50Retorquiu-lhe Jesus, nestes termos: Porque te disse: «Eu vi-te debaixo da figueira», acreditas? Verás coisas maiores do que estas. 51E acrescentou: Em verdade, em verdade vos digo: Heis-de ver o Céu aberto e os Anjos de Deus subir e descer por sobre o Filho do homem.

Comentário

45-51. O apóstolo Filipe não pode deixar de transmitir ao seu amigo Natanael (Bartolomeu) a alegria da sua desco­berta, cheio de emoção (v. 45). «Natanael (…) tinha ouvido pelas Escrituras que o Cristo devia vir de Belém, da aldeia de David. Assim o criam os judeus e o tinha anunciado, tempo atrás, o profeta: ‘E tu, Belém, não és certamente a menor entre as principais cidades de Judá; pois de ti sairá um chefe, que apascentará o Meu povo, Israel’ (Mich 5,2). Portanto, ao escutar que provinha de Nazaré turvou-se e duvidou por não ver como compaginar as palavras de Filipe com a predição profética»(Hom. sobre S. João, 20,1).

Pense o cristão que ao transmitir a sua fé a outros, estes podem apresentar-lhe dificuldades. Que deve fazer? O que fez Filipe: não confiar nas suas próprias explicações, mas convidá-los a vir pessoalmente até Jesus: «Vem ver» (v. 46). O cristão, pois, deve pôr os seus irmãos os homens diante do Senhor através dos meios da graça que Ele próprio deu e a Igreja administra: frequência de Sacramentos e prática da piedade cristã.

Natanael, homem sincero (v. 47), acompanha Filipe até Jesus. Estabelece-se o contacto pessoal com o Senhor (v. 48). E o resultado é a fé do novo discípulo, fruto do seu bom acolhimento da graça, que lhe chega através da Humani­dade de Cristo (v. 49).

Segundo podemos deduzir dos Evangelhos, Natanael é o primeiro Apóstolo que faz uma confissão explícita de fé em Jesus como Messias e como Filho de Deus. Mais tarde São Pedro, de modo mais solene, reconhecerá a divindade do Senhor (cfrMt 16,16). Aqui (v. 51) Jesus evoca um texto de Daniel (7,13) para confirmar e dar profundidade às palavras que pronunciou o novo discípulo.

 

30.09.2015 – Lc9, 57-62

57Indo eles no caminho, disse-Lhe alguém: Seguir-Te-ei para onde quer que fores. 58Retorquiu-lhe Jesus: As raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos, mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça. 59Disse a outro: Segue-Me. Este respondeu: Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai. 60Mas Ele replicou-lhe: Deixa os mortos sepultar os seus mortos, e tu vai anunciar ó Reino de Deus. 61Disse outro ainda: Seguir-Te-ei, Senhor, mas antes deixa que vá despedir-me dos meus. 62Mas Jesus respon­deu-lhe: Quem, depois de deitar a mão ao arado, olha para trás, não é apto para o Reino de Deus.

Comentário

57-62. Nosso Senhor exprime claramente as exigências que comporta o segui-Lo. Ser cristão não é tarefa fácil nem cômoda; é necessária a abnegação e pôr o amor a Deus antes de tudo. (Vejam-se as notas a Mt 8,18-22 e Mt 8,22).

Aparece aqui o caso daquele homem que quis seguir Cristo mas com uma condição: despedir-se dos de sua casa. O Senhor vê nele pouca decisão, e dá-lhe uma resposta que nos alcança a todos, visto que todos recebemos a chamada a segui-Lo e devemos procurar não receber essa graça de Deus em vão: «Nós recebemos a graça de Deus em vão quando a recebemos à porta do coração sem lhe permitir a entrada.

Recebemo-la sem a recebermos; recebemo-la sem fruto, pois de nada serve sentir a inspiração se não se consente nela (…). Sucede por vezes que inspirados a fazer muito não acei­tamos toda a inspiração, mas apenas algo, como aqueles personagens do Evangelho que, aconselhados pelo Senhor a que O seguissem, um pediu-Lhe autorização para enterrar o pai, e o outro para se despedir dos parentes»(Tratado do amor de Deus, liv. 2, cap. 11).

A nossa lealdade e fidelidade à tarefa que Deus nos confia deve superar todo o obstáculo: «Nunca existe razão sufi­ciente para voltarmos atrás (cfr. Lc 9.62): o Senhor está ao nosso lado.Temos de ser fiéis, leais, encarar as nossas obrigações, encontrando em Jesus o amor e o estímulo para compreender os erros dos outros e superar os nossos próprios erros»(Cristo que passa, n° 160).

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