37Enquanto falava, convidou-O um fariseu para almoçar consigo. 38Ele entrou e pôs-Se à mesa. O fariseu viu e admirou-se de que não Se tivesse lavado primeiro, antes do almoço. 39Disse-lhe o Senhor: Vós então, os Fariseus!… Vós limpais o exterior do copo e do prato, mas o vosso interior está cheio de rapina e malvadez. 40Insensatos! Não fez o interior Aquele que fez o exterior? 4lDai antes de esmola o que está dentro, e tudo para vós ficará limpo.
Comentário
39-52. Neste passo — um dos mais duros do Evangelho — Jesus Cristo desmascara de modo veemente o vício com que o judaísmo oficial mais se opôs à aceitação da Sua doutrina: a hipocrisia revestida de legalismo. Há pessoas que, sob a capa de bem, cumprindo a mera letra dos preceitos, não cumprem o seu espírito; não se abrem ao amor de Deus e do próximo; endurecem-se no seu coração e com aparência de honorabilidade afastam os homens do caminho de entrega fervorosa a Deus, tornando intolerável a virtude. Jesus Cristo desmascara-os com tanta veemência porque são piores que os inimigos manifestos; destes qualquer se pode defender; daqueles é pouco menos que impossível. De facto, os escribas e os fariseus estavam a impedir a passagem ao povo que queria seguir Jesus, constituindo-se no obstáculo mais malicioso ao Evangelho. As invectivas contra os escribas e os fariseus que São Lucas recolhe aqui encontram-se também no capítulo vinte e três de São Mateus, inclusivamente com maior amplitude. Cfr a nota a Mt 23,1-39.
40-41. O sentido deste texto não é fácil de captar. Provavelmente Nosso Senhor aproveita o jogo de palavras «o de fora» e «o de dentro», por ocasião da limpeza de copos e pratos, para dar um ensinamento acerca da importância primordial do interior do homem sobre as meras aparências, contra o erro comum dos fariseus e a tendência frequente de tantas pessoas. Assim, com estas palavras Jesus admoesta-nos dizendo que em vez de andar tão preocupados pelas coisas «de fora» nos devem preocupar sobretudo as «de dentro». Aplicado ao caso da esmola, o que importa é dar generosamente dos bens que guardamos de forma egoísta: isto é, não basta dar umas moedas, que é algo que pode ficar apenas na exterioridade, mas há que dar aos outros o amor, a compreensão, o convívio delicado, o respeito pela sua liberdade, a preocupação profunda pelo seu bem espiritual e material…, que são irrealizáveis sem disposições interiores de amor ao próximo.
O Papa João Paulo II explicava assim, numa alocução aos jovens, o significado genuíno da esmola: «Esmola, palavra grega, significa etimologicamente compaixão e misericórdia. Circunstâncias diversas e influxos de uma mentalidade restritiva alteraram e profanaram de certo modo o seu significado primigênio, reduzindo-o talvez a um acto sem espírito e sem amor. Mas a esmola, em si mesma, entende-se essencialmente como atitude do homem que adverte a necessidade dos outros, que quer tornar participantes os outros do próprio bem. Quem diria que não haverá sempre outro que tenha necessidade de ajuda, antes de mais espiritual, de apoio, de consolação, de fraternidade, de amor? O mundo está sempre muito pobre de amor» (Alocução aos jovens, 28-111-1979).